Numa altura em que os partidos políticos e os movimentos de cidadãos independentes preparam as suas listas de candidatos e os programas eleitorais que submeterão a escrutínio nas próximas eleições autárquicas, a ZERO estabeleceu um conjunto de desafios, com propostas concretas, que visam promover a sustentabilidade e a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Em muitos casos, trata-se de medidas com impactos positivos nos orçamentos municipais e das freguesias.
Atendendo a que, muito provavelmente, as respostas às alterações climáticas vão obrigar a alterações nos estilos de vida – com impactes significativos na forma como nos movemos, nos alimentamos, nos vestimos, no que fazemos, nos empregos que temos e até na forma como ocupamos os tempos livres – a ZERO tem a convicção que muitas das decisões tenderão a ser tomadas no plano local e que as autarquias e as comunidades locais vão ser chamadas a desempenhar um papel cada vez mais importante na procura da sustentabilidade, refere em comunicado, publicado no site da associação.
Neste contexto, identificam-se sete áreas de atuação onde os autarcas eleitos terão um papel decisivo a desempenhar.
1. Promover a eficiência energética e a produção local de energia renovável
Propõe-se que haja uma forte aposta na reabilitação do parque edificado, integrando critérios exigentes de eficiência energética e promoção da produção local de energia renovável, através de incentivos fiscais e apoio técnico. Desta forma será possível termos edifícios menos consumidores de energia e com melhor conforto térmico, com impactos positivos no bem-estar e nas finanças das famílias.
Nos edifícios públicos, a aposta deve englobar a escolha de equipamentos, através da aplicação dos critérios europeus de compras públicas ecológicas, para além de dar prioridade à instalação de unidades de produção em autoconsumo nos edifícios das autarquias (fotovoltaico e eólico), ambas as medidas com reflexos na diminuição de custos no médio/longo prazo.
Também deverá ser dada atenção à melhoria da eficiência da iluminação pública, uma fatura pesada nos orçamentos camarários, com a progressiva substituição dos atuais dispositivos de iluminação por outros mais eficientes.
Nos municípios com áreas territoriais florestadas e onde o risco de incêndio seja significativo, deverão ser ponderados investimentos em novas centrais de valorização de resíduos de biomassa florestal residual, aproveitando o regime especial e extraordinário para a sua instalação e exploração, desde que estas estejam integradas em projetos que envolvam outras indústrias que possam aproveitar a energia térmica produzida.
2. Incentivar a mobilidade sustentável
Advoga-se uma aposta clara na criação de ciclovias por todo o território e na generalização de redes de bicicletas partilhadas e de locais de estacionamento para bicicletas. Deverão ser incrementadas as áreas pedonais urbanas, com aplicação de restrições à circulação de veículos.
A transição progressiva para uma eletrificação dos transportes públicos e viaturas municipais, incluindo a facilitação do carregamento dos veículos elétricos com a colocação de pontos de carregamento em lugares de estacionamento isentos de parquímetro, deverá ser facilitada pelos futuros autarcas.
Na promoção dos transportes públicos é fundamental uma articulação supra municipal, ou seja regional, para que a rede de transportes públicos vá ao encontro das necessidades das populações e seja eficaz.
Outra proposta vai no sentido de se reabilitarem ou criarem novos interfaces (nós do sistema de transportes que permitem conexões entre vários modos e/ou serviços de transporte que facilitam os transbordos), com o objetivo de reforçar a utilização do transporte público e, de igual modo, promover uma utilização conjunta deste com os modos suaves (andar a pé, bicicleta). Aliás, um trabalho conjunto com as diferentes operadoras de transporte para que sejam encontradas formas de facilitar o transporte de bicicletas nos transportes públicos, será fundamental para o alargamento da utilização destes modos suaves de mobilidade.
3. Promover a alimentação com base na produção agrícola de proximidade
A ZERO insta os candidatos a ponderarem a criação e/ou continuarem a dinamizar hortas comunitárias, com a distribuição de talhões para cultivo aos cidadãos interessados, de preferência em modo de produção biológico.
Também a criação de bolsas de terrenos agrícolas municipais para facilitar o acesso à terra, e assim estimular o aparecimento de novos produtores locais, será certamente mais uma forma de fomentar o emprego local, de evitar impactes ambientais desnecessários com transportes de alimentos perecíveis (hortícolas e frutos) e de contribuir para que uma parte dos rendimentos dos cidadãos não saia da comunidade.
Esta proposta não pode, nem deve, ser dissociada da existência de estímulos ao surgimento ou à consolidação de cadeias curtas agroalimentares. Este é um modelo em que o modo de comercialização dos produtos agroalimentares se efetua por venda direta do produtor ao consumidor ou por venda indireta através de um único intermediário. Desta forma, estamos perante um modelo mais sustentável (do ponto de vista ambiental, social e económico), devendo ser dada preferência a abordagens assentes na partilha entre produtores e consumidores, dos riscos, responsabilidades e recompensas inerentes à atividade agrícola, através de um compromisso de longo prazo.
4. Dinamizar um consumo responsável assente nos princípios da economia circular
Nesta área, uma ação-chave é a adoção de estratégias “zero resíduos”, assentes na definição de metas exigentes de redução da produção de resíduos e de fomento da economia circular, as quais serão alcançadas com:
– Um forte envolvimento por parte de toda a comunidade,
– O investimento estrutural na recolha seletiva porta-a-porta, incluindo a dos resíduos orgânicos (40% do total de resíduos),
– A distribuição de compostores domésticos, instalação de compostores comunitários e dotar os espaços de restauração coletiva das escolas, dos lares e de outros serviços, de equipamentos de biocompostagem;
– O investimento na instalação de pequenas centrais de compostagem, por forma a facilitar a devolução dos nutrientes ao solo e apoiar a agricultura de proximidade (hortas urbanas, produções agrícolas na região ou mesmo os jardins camarários);
– A sensibilização e apoio aos pequenos e grandes produtores de resíduos (ex. comércio, restauração, centros comerciais, unidades de saúde, grandes empresas), com vista à redução drástica da quantidade de RSU produzidos, com posterior aplicação de taxas de recolha sobre o que não se separa (sistema PAYT — Pay-As-You-Throw);
– A criação de espaços agregadores de serviços locais de pequenas reparações de equipamentos e de mobiliário, de promoção da reutilização (e.g. troca/venda de roupas em segunda mão, móveis, têxteis), bem como de formação dos cidadãos, através de workshops de fomento de atitudes colaborativas e de partilha.
5. Promover a eficiência e o uso sustentável da água
A qualidade da água da torneira de Portugal é em mais de 99% das situações de boa qualidade, mas nesta área é preciso trabalhar em outras frentes. A ZERO advoga que os eleitos efetuem auditorias ao sistema de abastecimento de água, ou a solicite às entidades gestoras locais, com especial enfoque na análise à água não faturada e na fiscalização de situações de não ligação à rede pública, quando esta está disponível, no sentido de obrigar os cidadãos a cumprirem a Lei.
Os serviços municipais deverão igualmente desenvolver campanhas para promover o consumo de água da torneira, em detrimento do uso de água engarrafada, e para divulgar boas práticas de prevenção do desperdício de água e de reutilização de águas pluviais (das quais deverão ser um exemplo).
No que respeita ao tratamento de águas residuais, deverão ser desenvolvidos esforços financeiros para melhorar a acessibilidade dos cidadãos às redes de drenagem e ao tratamento, dando especial atenção a investimentos em soluções de saneamento descentralizado (micro-ETAR, fito-ETAR), para melhorar a qualidade das águas superficiais. Também aqui soluções multimunicipais poderão ser uma mais-valia para servir populações mais isoladas nos limites dos municípios, com otimização de recursos financeiros.
6. Gestão do território integrando os processos naturais nas decisões
No que concerne à gestão do território é decisivo conceber e implementar estratégias de adaptação às alterações climáticas, ponderar a designação de áreas protegidas de âmbito regional ou local e também programar a reabilitação ecológica de espaços degradados, nomeadamente linhas de água e zonas húmidas.
Outra componente muito importante é promover a biodiversidade no interior das cidades e vilas, através nomeadamente:
– Do abandono do uso de pesticidas e dos fertilizantes artificiais;
– Da reciclagem dos resíduos da gestão dos espaços verdes, mantendo o solo vivo;
– Da utilização de espécies autóctones em detrimento de exóticas;
– Da promoção de iniciativas de cidadãos – como a criação de charcos, o reaproveitamento das águas pluviais, a plantação de sebes que favoreçam as aves e os polinizadores, a instalação de ‘hotéis’ para polinizadores, a colocação de caixas-ninho para aves e morcegos ou a criação de espirais de ervas aromáticas.
7. Instituir Orçamentos participativos
De acordo com dados disponibilizados pela Associação In Loco, entidade que gere o portal Portugal Participa e que dinamiza a Rede de Autarquias Participativas, existem em Portugal 118 Orçamentos Participativos, a grande maioria assente em modelos em que os cidadãos podem propor e decidir quais os projetos que serão votados.
Tendo em consideração estes dados, a ZERO apela a que os candidatos adotem os Orçamentos Participativos deliberativos como uma forma de melhorar a gestão autárquica, sem receio de envolverem os cidadãos e de aprofundar a democracia participativa a nível local.
Incentiva-se também a que os autarcas dos municípios que ainda não têm Orçamentos Participativos os comecem a implementar, chamando os seus munícipes para uma participação mais ativa nas decisões municipais.
Ainda neste contexto, incentiva-se os autarcas que venham a ser eleitos a estudarem a criação de novas formas de “dinheiro”, como as moedas locais, os bancos de tempo, e a incentivarem novas formas de economia cooperativa e colaborativa.