Em 2013 a Estratégia Nacional para o Mar 2006-2016 foi revista e apresentada sob a forma de uma nova estratégia – a Estratégia Nacional para o Mar para 2013-2020 (ENM2020). Agora, em 2020, está em consulta pública a Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030 (ENM2030). A ENM2030 é o instrumento de política pública que apresenta a visão de Portugal para o período 2021–2030, no que se refere ao modelo de desenvolvimento do Oceano para a próxima década. A ENM2030 inclui um Plano de Ação com 160 medidas e ações distribuídas por 10 objetivos estratégicos, bem como um conjunto de 30 metas organizadas por objetivos estratégicos.
Entre as recomendações que a ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável – faz à ENM2030, no âmbito da consulta pública ao documento que termina esta segunda-feira, destaca-se a necessidade de total concordância para a redução do impacte ambiental das pescas: “No caso das artes de pesca, exige-se que se vá muito mais longe e até 2030 só sejam permitidas artes de pesca biodegradáveis ou concebidas com materiais não prejudiciais para as espécies e para os ecossistemas”, lê-se no comunicado da ZERO.
Prevenção do lixo marinho
No que concerne ao Objetivo Estratégico (Combater as Alterações Climáticas e a Poluição e Restaurar os Ecossistemas), do ponto de vista da associação ambientalista é fundamental um “enfoque maior na prevenção dos problemas que estão a contribuir quotidianamente para a degradação dos ecossistemas marinhos”. Na área específica da prevenção da poluição, a ZERO destaca a a ação política no sentido de “promover iniciativas que conduzam a uma menor utilização de soluções descartáveis será chave para travar (ou pelo menos minimizar) o fluxo constante de resíduos para o mar”. Nesta área em concreto, apelam a que a estratégia e o respetivo plano de ação “integrem metas específicas para reutilização de embalagens”, quer no âmbito geral (universo das embalagens), quer no âmbito mais específico das embalagens de bebidas. Neste contexto, sugerem que sejam “integradas metas de reutilização ambiciosas de embalagens de bebidas”, acreditando que os “sistemas de depósito com retorno podem ser um forte aliado na prevenção do lixo marinho”.
Área de emissões reduzidas do Atlântico Nordeste
Para as áreas costeiras e cidades portuárias, os navios são uma importante fonte de poluição do ar. Segundo a ZERO, a atual versão da ENM2030 não faz infelizmente qualquer menção à poluição atmosférica causada pelos navios, algo que deveria estar claramente contemplado e explícito no Objetivo Estratégico (Combater as Alterações Climáticas e a Poluição e Restaurar os Ecossistemas).
O tráfego marítimo na costa continental de Portugal, de acordo com uma estimativa aproximada da ZERO no período pré-pandemia, totaliza aproximadamente uma “emissão de 3,5 mil toneladas de dióxido de enxofre por ano”, representando um “acréscimo de 8% às emissões deste poluente em Portugal Continental no ano de 2018”, e “85 mil toneladas de óxidos de azoto”, representando “um acréscimo de 55% das emissões deste poluente em relação ao total do país”.
A ZERO considera indispensável na ENM2039 a “inclusão da costa continental portuguesa”, incluindo a Zona Económica Exclusiva, numa nova Área de Controlo de Emissões no Atlântico Nordeste para o enxofre e para o azoto, que ligue a área já existente do Mar Báltico, Mar do Norte e Canal da Mancha ao Mediterrâneo. Para tal, implica-se uma “articulação do governo com os países a Nordeste (Espanha, França Irlanda e Reino Unido)”, para além do “seguimento das negociações já em curso entre vários países do Mediterrâneo, com uma participação ativa da União Europeia, para o estabelecimento nos próximos anos de uma área de controlo de emissões no Mar Mediterrâneo (a denominada “Med ECA”)”, diz a associação ambientalista.
Sensibilização
Para a ZERO, as campanhas devem ser dirigidas para a promoção de um consumo sustentável, enfatizando principalmente os impactes ambientais negativos dos produtos do mar. Abordar apenas os produtos de exploração sustentável ou de baixo valor comercial é uma forma de impedir o consumidor de refletir sobre o seu atual papel na exploração insustentável dos oceanos.
Fiscalização é essencial
As medidas – “Desenvolver um programa de construção de meios navais, tripulados e não tripulados, para vigilância, inspeção e controlo da zona oceânica (depois das 12 milhas)” e “Desenvolver um programa de construção de meios navais, tripulados e não tripulados, para vigilância, inspeção e controlo da zona costeira (até às 12 milhas)” – são “inequivocamente positivas, mas para além da intenção”, a ZERO declara que “não respondem em concreto às necessidades de reforço urgente dos meios de vigilância, inspeção e controlo da zona oceânica afetos à Marinha Portuguesa”. Com uma das maiores zonas económicas exclusivas do mundo que se estende por 1,7 milhões de km2, constituindo 48% da totalidade das águas marinhas sob jurisdição dos estados membros da União Europeia em espaços adjacentes ao continente Europeu, e com a mais que provável extensão da plataforma continental para além das 200 milhas náuticas, cujo processo de delimitação está a decorrer junto das Nações Unidas, e que poderá vir a resultar numa área de 4.100.000 km2, Portugal continua, de forma incompreensível, sem investir adequadamente nos seus meios de vigilância, inspeção e controlo da zona oceânica. Esta ENM2030 deveria ter sido o ponto de partida para uma “alteração da situação de fragilidade de meios que em nada condiz com os discursos ambiciosos e apaixonados do Portugal oceânico”, sublinha a associação.
Ausência de avaliação de estratégias passadas
No mesmo comunicado, a ZERO alerta que não existe qualquer avaliação crítica aos resultados obtidos com a implementação da ENM2020, sendo que o mesmo já havia ocorrido com a Estratégia de 2016: “Esta é uma situação lamentável que aparentemente parece não ter solução, uma vez que é em si mesma uma parte integrante da matriz cultural da Administração Pública portuguesa”. É, para a ZERO, “incompreensível que existam duas páginas e meia nas quais nos é transmitida a firme intenção de monitorizar e avaliar condignamente a implementação da ENM2030 e do respetivo Plano de Ação, quando estamos na presença das mesmas entidades que se desobrigaram de avaliar a execução da Estratégia anterior”.