Terminou no dia 18 de fevereiro a consulta pública relativa ao Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do Projeto GreenH2atlantic e projetos associados, promovidos em Sines pelo consórcio Hytlantic, que de fazem parte a Bondalti, EDP, ENGIE, Galp, Martifer e Vestas. A ZERO analisou os documentos disponibilizados e submeteu um parecer no qual levanta preocupações e faz recomendações.
O projeto tem como objetivo a instalação de 100 MW de eletrolisadores no perímetro da antiga central térmica a carvão para produção de hidrogénio verde, ou seja, a partir da eletrólise da água e de energia renovável, como solar e eólica. Uma parte deste hidrogénio, 33%, destina-se a ser usado na própria refinaria de Sines, substituindo menos de 10% do hidrogénio cinzento produzido a partir de gás fóssil hoje consumido nos seus processos, e a outra parte, 67%, a ser injetado na Rede Nacional de Transporte de Gás Natural (RNTG).
A ZERO entende que a substituição de hidrogénio cinzento deve ser a primeira prioridade em termos do uso final do hidrogénio verde a produzir pelo projeto, que deveria por isso ser mais ambicioso nesse aspeto. Só depois, à medida que o processo de descarbonização avança, o hidrogénio verde deve ser direcionado para outros usos, nomeadamente para a produção de combustíveis sintéticos para a aviação e transporte marítimo e para usos industriais em setores difíceis de eletrificar. “Só em último caso, o hidrogénio verde deve ser injetado na rede de gás”, defende a ONGA.
Falhas no planeamento podem conduzir a desperdícios de energia
Atrasos muito preocupantes na elaboração da Estratégia Industrial Verde, na Avaliação Ambiental Estratégica das Áreas de Aceleração de Renováveis e no investimento nas redes elétricas estão a limitar o desenvolvimento de projetos industriais consumidores de hidrogénio verde em Sines, levando, em parte, à injeção de grandes quantidades de hidrogénio verde na rede de gás e ao desperdício de grandes quantidades de energia renovável que poderia ser aproveitada para fins mais nobres, como indica a ZERO no comunicado enviado à imprensa.
A garantia de que a eletricidade de origem renovável utilizada na produção do hidrogénio verde cumpre os princípios definidos no Ato Delegado do Hidrogénio, em relação à adicionalidade, correlação temporal e correlação geográfica, é essencial.
“No entanto, e apesar das condições favoráveis de Portugal, deve ser feito um uso racional dessa eletricidade no sentido de reduzir ao máximo o impacto ambiental, económico e social das infraestruturas. Para isso, e para acelerar o progresso rumo a um sistema elétrico 100% renovável o mais tardar em 2032, o estabelecimento de Áreas de Aceleração de Renováveis é fundamental, mas a sua Avaliação Ambiental Estratégica está extremamente atrasada”, revela ainda a associação.
“Por outro lado, a ausência destas áreas de aceleração condiciona e torna mais lento o licenciamento necessário para a realização dos investimentos fundamentais no reforço das redes elétricas que permitem receber energia renovável a preços reduzidos e disponibilizá-la nas quantidades necessárias para atrair unidades industriais que permitam encurtar as cadeias de produção e consumo na Europa. Assim, torna-se fundamental atrair para junto da área de desenvolvimento do projeto GreenH2atlantic as indústrias destinatárias do hidrogénio verde por ele produzido, privilegiando, em particular, aquelas cuja eletrificação se afigura mais difícil”.
Entre estas, destaca-se o projeto de produção de aço verde, que já está previsto para Sines, e que pode servir de âncora para outros projetos industriais, como o da fileira eólica, ferrovia e outras indústrias associadas à descarbonização do setor dos transportes, essencial na descarbonização da economia.
“A inexistência de uma Estratégia Industrial Verde, tal como previsto na Lei de Bases do Clima mas enormemente atrasada, dificulta a atração de investimentos alinhados com os objetivos de descarbonização e da economia circular, e prejudica o desenvolvimento tempestivo de simbioses industriais e economias de escala. A criação de incentivos à constituição de condomínios industriais, enquadrados na Estratégia Industrial Verde e proporcionando unidades de gestão altamente qualificadas, será absolutamente fundamental para dar racionalidade aos investimentos, especialmente na área dos gases renováveis, em particular o hidrogénio verde, e reduzir a dependência de contextos geopolíticos instáveis”, lê-se ainda.
Combustíveis sintéticos para a aviação têm metas obrigatórias já em 2030, mas que são ignoradas
“É incompreensível que o projeto não preveja que um dos destinos finais do hidrogénio verde seja a produção de combustíveis sintéticos para a aviação e transporte marítimo. O regulamento Europeu ReFuel EU obriga a que em 2030 sejam incorporados 1,2% destes combustíveis (e-SAF) no jet fuel consumido pelas companhias aéreas europeias, antevendo-se que Sines venha a ser uma peça fundamental nesta matéria, já que possui todas as infraestruturas de produção e distribuição de combustíveis para os aeroportos portugueses. Portugal deverá, para não ficar dependente do exterior, produzir sensivelmente 25 kton de combustíveis sintéticos em 2030, e o conteúdo em hidrogénio verde para o efeito rondará as 4 kton. Uma vez que das cerca de 11 kton de hidrogénio verde que o projeto GreenH2atlantic prevê produzir cerca de 3,5 serão usadas na atual refinaria, uma parte substancial da restante produção poderá com vantagem ser utilizada para a produção destes combustíveis sintéticos, devendo ser identificados e removidos os obstáculos que dificultam esta opção”, completa a ZERO.