Terminou ontem o período de discussão pública do Relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (RECAPE) da expansão da Linha Vermelha do Metropolitano de Lisboa, entre São Sebastião e Alcântara, para o qual a ZERO contribuiu, e sem o qual o projeto não pode avançar. Preocupada com a insuficiência de medidas eficazes para reduzir a emissão de gases com efeito de estufa no setor dos transportes em 5% ao ano até 2030 como exigido no Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC), a organização ambiental considera que este plano de expansão, na sua forma atual, “não conseguirá atingir a redução de emissões que seria possível e necessária, nem promoverá um aumento significativo na utilização de transporte público na Área Metropolitana de Lisboa, nomeadamente nos seus concelhos mais ocidentais”.
A ZERO considera que este RECAPE ignorou o potencial de interfaces da linha vermelha com as linhas de comboio de Setúbal, atualmente operadas para Fertagus, de Cascais, na futura estação do Alvito, e da estação ferroviária de Campolide. “Este interface permitiria transportar de comboio mais 30 a 45 mil passageiros por dia, mesmo antes de qualquer melhoria nos sistemas de sinalização, promovendo uma importante transferência modal e podendo reduzir as emissões em cerca de 190 kt de CO2eq, o que corresponde a mais de 1% de todas as emissões do setor dos transportes em Portugal registadas no último ano”, explica a organização ambiental.
O atual projeto prevê, no seu melhor cenário, que deixem de circular apenas 3.500 veículos por dia, resultando numa redução estimada de emissões de 16 kt de CO2 eq – o que equivale a apenas 0,09% das emissões nacionais do setor dos transportes. “Apesar de representar uma redução importante, este valor não é proporcional ao enorme investimento de mais de 400 milhões de euros. Estes recursos poderiam ser mais eficazmente aplicados em alternativas que ofereçam uma maior redução de emissões de carbono, como a eletrificação da frota de autocarros e da logística urbana”.
A manter-se este rácio entre investimento e emissões reduzidas, a ZERO alerta que precisaríamos de investir em média 18.000 milhões de euros por ano, a preços atuais, para cumprir os objetivos de emissões no setor dos transportes até 2050, o que “sendo irrealizável demonstra a inviabilidade financeira deste investimento do ponto de vista da redução de emissões no setor dos transportes”.
Projeto limita opções do Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da região de Lisboa
Numa altura em que se encontra em curso a Avaliação Ambiental Estratégica do Plano Metropolitano de Mobilidade Sustentável da Área Metropolitana de Lisboa (PMMUS) e que deveria enquadrar os investimentos estruturantes no setor dos transportes a nível metropolitano, “seria incompreensível que se adotasse um plano de expansão da linha Vermelha, obsoleto, e que condiciona negativa e fortemente as opções do PMMUS, que é crucial para acelerar a redução urgente do uso do transporte individual e promover uma mudança do modelo de mobilidade consistente com o combate à crise climática. O prolongamento da Linha Vermelha tal como está atualmente concebido compromete as futuras opções de mobilidade urbana sustentável para Lisboa. A decisão de não construir um interface em Campolide enfraquece a intermodalidade, dificultando a integração eficiente entre o metro e a rede ferroviária nacional e criando obstáculos para futuras expansões da rede de transportes públicos. Isto contraria os objetivos do PMUS da Área Metropolitana de Lisboa de promover uma mobilidade sustentável, inclusiva e integrada”, critica a ZERO. “Acresce que o Plano Diretor Municipal (PDM) entrará também em fase de revisão e este traçado e estações, que à luz do atual PDM são ilegais, condicionam de forma definitiva as opções dos planeadores e dos vereadores e deputados eleitos”.
Além disso, o projeto falha na proteção de áreas sensíveis do ponto de vista ambiental e patrimonial, como Alcântara, a Tapada das Necessidades e o Jardim da Parada, “não existindo neste último caso, aparentemente, quaisquer medidas que permitam mitigar o elevado risco de degradação do solo a nível radicular no período de exploração que foi apontado na DIA como um impacto negativo, significativo e irreversível. As medidas de mitigação propostas são vagas e insuficientes, colocando em risco a integridade de áreas verdes e património histórico”.
Estranhamente, e na visão da ZERO contrariando a Declaração de Impacte Ambiental, o Metropolitano de Lisboa anunciou na sessão pública realizada em Campo de Ourique que iria realizar os estudos geológicos e hidrogeológicos necessários depois da emissão definitiva da licença ambiental, quando eles deveriam ser realizados para fundamentar o RECAPE.
A ZERO insta a que se proceda a uma revisão profunda do projeto, assegurando, ao contrário do atual projeto de traçado, o cumprimento das normas ambientais e urbanísticas e a promoção de uma mobilidade verdadeiramente inclusiva e sustentável, com base no Plano de Expansão da Rede de Metropolitano de Lisboa de 2009.
A organização ambiental apela ainda à reformulação da expansão da Linha Vermelha, retomando o Plano de 2009, incluindo a estação de Campolide como interface estratégico e integrando as linhas de Setúbal, Cascais, Sintra e uma
rede de elétricos para melhor servir o centro da cidade. “Os mais de 400 milhões de euros previstos para esta obra poderiam ser mais eficazmente utilizados, do ponto de vista da mitigação das alterações climáticas, na eletrificação da frota de autocarros e da logística urbana ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), com um impacto mais significativo na redução das emissões de gases com efeitos de estufa e na melhoria da mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa. A implementação de um plano integrado e ambicioso é essencial para que Lisboa alcance as suas metas de descarbonização e desenvolva uma rede de transportes moderna e eficiente. A reformulação do projeto deve focar-se em maximizar a intermodalidade, melhorar a conectividade e assegurar um uso mais eficaz dos recursos públicos, promovendo uma verdadeira transição para uma mobilidade mais verde e inclusiva”.