Zero alerta para descontrolo na instalação de explorações agrícolas de regadio junto ao Alqueva
Com o incremento e a expansão do sistema de rega do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva (EFMA) e áreas adjacentes, temos assistido à instalação de culturas intensivas fora dos blocos de rega, em áreas onde as mesmas são proibidas ou são condicionadas nos Planos Diretores Municipais (PDM), alerta a ZERO.
Num primeiro levantamento efetuado no âmbito do trabalho do Movimento Alentejo VIVO, que congrega cidadãos do Alentejo, pode-se já afirmar que só no concelho de Beja se encontra uma área superior a 2.500 ha onde foram instaladas culturas intensivas de regadio em incumprimento, atingindo este valor mais de 2.000 ha em Serpa e em menor expressão no concelho de Ferreira do Alentejo, estendendo-se esta situação um pouco por todos os outros concelhos envolventes.
As situações identificadas referem-se a áreas classificadas nas cartas de ordenamento como espaços agro-silvo-pastoris, mesmo como áreas florestais de produção e até de proteção, áreas com condicionantes em termos de Reserva Ecológica Nacional (REN) ou em faixas adjacentes a povoações.
Acresce a esta situação o facto de que em algumas das áreas projetadas dos novos blocos de rega da 2.ª fase do EFMA as culturas terem sido instaladas antes de ser aprovada a sua implementação (mais de 500 ha só no concelho de Beja), algo que se verifica neste momento em muitos locais que estão ainda em processo de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA). Ou seja, uma vez que a sua instalação foi feita de forma ilegal, antevê-se que a mesma venha agora a ser legitimada pela reclassificação destas áreas como áreas de regadio.
Impactes no território são variados e significativos
Por outro lado, sucedem-se os atropelos e ilegalidades:
– As linhas de água estão a ser vítimas de intervenções abusivas com a sua retificação e aprofundamento e, em vários casos, assiste-se a desvios dos seus cursos e à destruição das galerias ribeirinhas e mesmo à aplicação de herbicidas nas suas margens e leitos. Em algumas áreas de cabeceira, as linhas de escoamento são simplesmente obliteradas e terraplanadas;
– Várias povoações vêm agora estas culturas, onde são aplicadas doses consideráveis de pesticidas, a aproximarem-se dos perímetros urbanos sendo inúmeras as queixas por parte dos habitantes destes locais relativamente aos riscos para saúde. No caso do concelho de Beja, onde o regulamento do PDM prevê, e bem, mecanismos de prevenção nas áreas a ocupar com intensificação do uso do solo dentro da chamada faixa de proteção sanitária e paisagística, é ainda mais lamentável a não aplicação do princípio da precaução, verificando-se a violação sistemática deste preceito do regulamento em várias localidades;
– Gera também muita preocupação a destruição de várias manchas de montado com maior ou menor densidade, umas dentro e outras fora dos perímetros de rega e em áreas onde é proibida a reconversão, com ou sem autorização do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF);
No que respeita à biodiversidade, assiste-se à simplificação do sistema agrícola predominante na região, com destruição de bosquetes, montado, vegetação dos taludes, galerias ribeirinhas, charcos temporários mediterrânicos, sendo que estes espaços constituem refúgio para muitas espécies de flora e fauna.
– A este atentado ao património natural da região, acrescem outros ao património histórico-arqueológico;
– Este modelo agrícola em que o território rural é tratado como área industrial de produção tem também o seu impacto no campo social ao nível das condições de trabalho dos trabalhadores agrícolas imigrantes que agora afluem à região.
Modos de instalação cultural desadequados
No que respeita ao modo de instalação das culturas é manifesto o seu impacto no solo, nomeadamente quando se aplicam técnicas pouco apropriadas em declives acentuados, sem qualquer respeito pelas curvas de nível e atendendo apenas às vantagens que daí podem decorrer para os trabalhos agrícolas.
Os camalhões elevados e orientados no sentido dos declives, as ripagens exageradas ou até desnecessárias, o enrelvamento da entrelinha por vezes residual ou até inexistente, ou a ocupação das margens de linhas de água, são algumas das constatações no terreno.
Numa área onde o risco de desertificação constitui uma das principais preocupações para a sua sustentabilidade, não entendemos como à conta de ganhos a curto prazo podemos estar a colocar em causa a fertilidade destes solos a longo prazo.