ZERO alerta para a necessidade de repensar o futuro das infraestruturas aeroportuária em Lisboa
Os dados disponíveis presentes nos mapas de ruído de Lisboa e associados à própria infraestrutura aeroportuária, para além das medições efetuadas pela ZERO em julho de 2019 e em abril de 2020, mostram que “neste momento estamos longe de cumprir a legislação relativa ao ruído e, no futuro, com mais movimentos, os valores dos indicadores estarão ainda mais acima da lei”, pode ler-se no site da ZERO (Associação Sistema Terrestre Sustentável). De acordo com esta associação ambiental, “não há quaisquer medidas técnicas possíveis de aplicar que impeçam as ultrapassagens verificadas, dado que o ruído das aterragens e descolagens pode ser ligeiramente mitigado mas nunca se conseguirá a enorme redução necessária”.
Considerando que os níveis têm de ser cumpridos em zona habitacional em espaço exterior, as medidas para redução do incómodo que possam vir a ser aplicadas não resolvem a ilegalidade, alerta a ZERO. Assim, nunca um estudo de impacte ambiental relativo à expansão conseguirá ser “viabilizado”, e só o interesse público por agora de uma infraestrutura desta natureza, enquanto não se desenvolve alternativa, torna o seu “funcionamento suportável”, mas com “enormes consequências para a saúde pública”, considera.
Visão estratégica do Plano de Recuperação Económica não aponta aeroporto do Montijo como solução e CSOP considera que opção Portela+1 não é de longo prazo
No documento de Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030 atualmente em discussão pública, menciona-se “Construir o Aeroporto para a grande Área Metropolitana de Lisboa tendo em conta que as ligações aéreas são fundamentais na performance da economia portuguesa, e isso tem a ver não só com o turismo, que é um setor crucial da economia, mas também com muitas outras fileiras económicas”. De acordo com a ZERO, “não apenas de forma subtil, o documento não assume a opção Montijo como é por demais evidente que o aeroporto não tem esta capacidade de resposta, é um aeroporto assumidamente complementar, não pode ser expandido e não virá estar ligado à ferrovia”.
Ao mesmo tempo, o parecer do Conselho Superior de Obras Públicas (CSOP) sobre o Programa Nacional de Investimentos (PNI 2030) alerta para o facto das “obras no aeroporto de Lisboa e o novo aeroporto do Montijo não serem uma solução no longo prazo”, cita a ZERO.
Pandemia dá tempo para uma avaliação ambiental estratégica que poderia durar menos de um ano
A ZERO tem uma ação judicial em curso, iniciada em fevereiro de 2019, por considerar não ter sido realizada, antes da tomada de decisão, uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE). Desde o início de todo este processo que a associação ambiental tem vindo a “alertar para a absoluta necessidade da realização de uma AAE, não apenas por motivos legais, uma vez que a legislação europeia e nacional assim o obriga, mas acima de tudo, por questões estratégicas e de planeamento de longo prazo, naquela que será uma decisão com um enorme impacte no país, em termos económicos, sociais, ambientais e de ordenamento do território”. O Aeroporto do Montijo está intimamente ligado à expansão do Aeroporto Humberto Delgado no quadro do acordo com o Estado firmado entre o governo e a ANA Aeroportos em janeiro de 2019. Todas as consequências previsíveis requerem uma “avaliação aprofundada”, que tenha em consideração diferentes “cenários e alternativas”, e que possa colocar em perspetiva quais as “opções possíveis”, no sentido de uma “decisão informada sobre a melhor relação custo-benefício no longo prazo, avaliação essa que mais não é do que uma AAE”, lê-se no site da ZERO.
No contexto da pandemia, as expectativas de evolução do número de passageiros para os próximos anos na sequência da restruturação do setor da aviação, em particular da TAP, a estrutura de deslocações relacionadas com a atividade turística e ainda a provável penalização dos preços por razões ambientais, conduzirá inevitavelmente a uma redução do número de movimentos.
A ZERO lembra que os impactes climáticos da aviação, não contabilizados no estudo de impacte ambiental do aeroporto do Montijo, obrigam a uma “gestão muito mais conciliatória com o uso da ferrovia para destinos próximos”, para além de uma “fiscalidade apropriada que deverá reduzir a procura”.
A ZERO considera assim que é perfeitamente possível e desejável, um olhar detalhado sobre a eventual necessidade de construção de um novo aeroporto para a Área Metropolitana de Lisboa, utilizando a informação que já foi tratada relativamente à possibilidade Portela+Montijo, Campo de Tiro de Alcochete (com declaração de impacte ambiental ainda válida mas que é necessário rever e atualizar) e eventuais outras localizações possíveis. A avaliação ambiental estratégica não demoraria certamente mais de um ano a desenvolver e constituiria um elemento fundamental para encontrar uma solução equilibrada e convenientemente discutida e participada, alerta a ZERO.
Montijo é uma opção com impactes ambientais graves
O Aeroporto do Montijo tem uma localização incompatível em termos de conservação da natureza. Na sua fase de exploração, tem assumidamente impactos significativos numa área que se encontra protegida por legislação nacional e internacional (contíguo à Zona de Proteção Especial do Estuário do Tejo e Sítio de Interesse Comunitário “Estuário do Tejo”), ambos pertencentes à Rede Natura consignada em legislação nacional e europeia, afetação indireta da zona próxima correspondente à Reserva Natural do Estuário do Tejo. Segundo a ZERO, “a análise do risco de colisão com aeronaves foi inconclusiva e será uma ameaça para o tráfego aéreo”. No caso do ruído verifica-se um “incumprimento inadmissível das recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS)”. A ZERO considera também que o presente estudo de impacte ambiental relativo ao aeroporto do Montijo é “desconforme e não contém uma avaliação suficiente que permita compreender os reais impactes do projeto”.
ZERO mantém duas ações em tribunal
Após uma cuidada avaliação jurídica e estratégica, a ZERO mantém a ação judicial interposta em fevereiro de 2019 relativa à ausência de avaliação ambiental estratégica mas retirou a ação interposta no final de junho de 2020, mantendo-se na iniciativa conjunta das oito organizações portuguesas de defesa do ambiente que levaram o governo português a tribunal no início de junho de 2020, de modo a impedir o avanço do projeto de construção do Aeroporto do Montijo.
As organizações não-governamentais (ONG) de ambiente Almargem, ANP/WWF Portugal, A Rocha Portugal, FAPAS, GEOTA, LPN, SPEA e ZERO, com o apoio da ONG internacional de direito ambiental ClientEarth, apresentaram uma ação administrativa no Tribunal Administrativo do círculo de Lisboa para a anulação da Declaração de Impacte Ambiental favorável condicionada, emitida pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA).