A utilização de óleos alimentares para auxiliar na preparação de alimentos é um hábito muito enraizado entre os portugueses. No entanto, como o seu uso recorrente torna necessária a sua substituição, gera-se uma quantidade inevitável de resíduos que devem ser bem encaminhados e valorizados. refere a Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável, em comunicado.
Preocupada com o destino dos óleos alimentares usados (OAU) que são utilizados, a Zero solicitou à APA – Agência Portuguesa do Ambiente um conjunto de dados que ajudassem a efetuar um “retrato” da situação no ano de 2015, tendo constatado muitas incongruências nos dados disponibilizados, um desperdício de recursos que não são valorizados economicamente, e que se pode situar na ordem dos 28 milhões de euros/ano, e que cerca de 35 mil toneladas por ano serão despejadas nos coletores de esgotos domésticos, criando problemas nas estações de tratamento de águas residuais (ETAR) ou prejudicando os ecossistemas ribeirinhos.
Para tentar perceber a realidade dos óleos alimentares usados em Portugal Continental (as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira ficaram de fora desta análise), a Zero analisou os dados dos fluxos de OAU de acordo com a informação disponibilizada pela APA. Em 2015 foram colocadas no mercado cerca de 77 mil toneladas de óleo alimentar. Após a sua utilização, onde parte do óleo fica nos alimentos, este passa a ser considerado um resíduo denominado óleo alimentar usado (OAU) cujo destino correto é a valorização, nomeadamente como biodiesel. Tendo em conta que 6% da produção total deste tipo de resíduos está associada ao setor industrial (por exemplo, na indústria de produção de batatas fritas), 25% dos mesmos são originados pelo setor doméstico e o canal HORECA (formado pelo conjunto dos hotéis, restaurantes e cafés) gera os restantes 69% dos resíduos, e admitindo-se ainda diferentes taxas de perdas nos alimentos com base na consulta de bibliografia de referência, a quantidade de resíduos expectável para valorização seria de aproximadamente 58 mil toneladas. Todavia, a informação dada pela APA é que se recolhem apenas 23 mil toneladas, pelo que 35 mil toneladas acabam nos coletores de águas residuais (60% do total de óleos alimentares usados), estimando a Zero que 15 mil toneladas (44% do total) de OAU sejam rejeitadas pelos cidadãos nos esgotos domésticos e que 19 mil toneladas (56% do total) sejam desperdiçadas pelo setor HORECA.
Esta situação é reveladora de que o sistema de recolha implementado em Portugal não funciona, não só no que respeita ao setor doméstico, onde a taxa de recolha é de uns insignificantes 1,6% (253 toneladas recolhidas), enquanto a taxa do setor HORECA e do setor industrial será de 46%, um valor que pode parecer mais aceitável, mas não é mais do que a revelação que algumas atividades económicas não cumprem a lei, já que a sua entrega a empresas licenciadas para o efeito é obrigatória, afirma a associação, na mesma nota.
Acessibilidade por parte dos cidadãos aos pontos de recolha não é cumprida
Outra informação a registar é que 51% das autarquias que reportaram dados à APA não estão a cumprir a legislação que obriga a instalar um determinado número de pontos de recolha em função da população residente, havendo mesmo 23 municípios que não enviaram os dados anuais obrigatórios.
Assim, os resultados estão longe de ser animadores: apenas 253 toneladas foram recolhidas pelos Municípios e pelos Sistemas Multimunicipais (BRAVAL e VALNOR). Constata-se pois que, pelo menos, 17 milhões de litros de OAU poderão estar a ser despejados pelos cidadãos nos esgotos domésticos, aumentando os custos do tratamento das águas residuais nas ETAR em 25% e, em muitos casos, chegando mesmo aos cursos de água, afetando a vida aquática.
Um recurso valorizável: a produção de biodiesel na BRAVAL
Para provar que é possível não só prevenir os problemas causados nos sistemas de tratamento de águas residuais e nos ambientes aquáticos, mas também valorizar estes resíduos em biodiesel, a Zero gostaria de referir um dos exemplos positivos nesta área – a BRAVAL (sistema multimunicipal que abrange os Municípios de Braga, Póvoa de Lanhoso, Vieira do Minho, Amares, Vila Verde e Terras de Bouro).
Neste sistema, em 2016, foram recolhidos 73.630 litros provenientes de 16.200 domicílios (19% do total, incluindo cerca de 700 grandes produtores ativos), tendo-se produzido 58.850 litros de biodiesel, com um volume de negócios de aproximadamente 34 mil euros. De salientar que os OAU recebidos na BRAVAL correspondem a um terço do total recolhido declarado no sector doméstico a nível nacional, apesar dos 290 mil habitantes abrangidos pelo sistema multimunicipal representarem apenas 3% da população de Portugal Continental.
Recomendações Zero
Face a esta situação e considerando que é evidente a existência de um fraco desempenho na gestão deste fluxo específico de resíduos, a Zero preconiza:
– Um esforço adicional da Agência Portuguesa do Ambiente para melhorar a recolha e a sistematização da informação reportada pelos produtores e pelos Municípios, reforçando os meios humanos e financeiros no Departamento de Resíduos;
– Um reforço da fiscalização da atividade dos operadores de gestão de resíduos ligados à recolha de óleos alimentares usados e também aos estabelecimentos comerciais para verificação do cumprimento das obrigações legais no que respeita ao encaminhamento de OAU para valorização;
– Criar incentivos e adicionar novas medidas ao POSEUR para que os Municípios, por iniciativa própria ou de forma articulada com Sistemas de Gestão de Resíduos ou com entidades gestoras de tratamento de águas residuais, possam melhorar a recolha, facilitando novos negócios, de preferência cooperativos, que combinem a recolha porta-a-porta por solicitação com a criação de pequenas unidades de valorização de OAU;
– Reforçar a informação pública sobre esta temática, sensibilizando os cidadãos para que evitem a deposição nos coletores de águas residuais e para que exijam que seja efetuada a recolha porta-a-porta nos seus Municípios.