“Vintage for a Cause” já desviou uma tonelada de desperdício têxtil através do upcycling
Qual é o verdadeiro impacto do que vestimos? E se as roupas esquecidas nos aterros pudessem dar a vida a outras roupas? Há um projeto nacional que alia a preocupação ambiental à responsabilidade social. Desde 2013, a Vintage for a Cause já “desviou” cerca de uma tonelada de desperdício têxtil e quer chegar às duas toneladas em 2020.
Edições limitadas e peças exclusivas, vegan e manufaturadas, de estética urbana e design intemporal. As coleções Vintage for a Cause querem adequar-se a qualquer estação, tendência e mesmo género. Mas a estética da marca representa uma preocupação maior.
Os números associados à indústria da moda são inquietantes. O consumo massivo e o pouco tempo de vida útil das peças geram escassez de recursos naturais e desperdício têxtil em grandes quantidades –quase 12 milhões de toneladas de resíduos têxteis vão para aterros todos os anos. Este setor é o segundo maior consumidor e poluente da água, com os processos de produção a emitir CO2 e outros gases de efeito de estufa. Mais de 99% da roupa que é deitada fora pode ser reciclada e reutilizada, mas mais de 85% acaba nas lixeiras.
Com o objetivo de reduzir o desperdício e o impacto ambiental, em 2012 — ainda antes da tendência da moda sustentável –, surge a Vintage for a Cause. O projeto nasce pela mão de Helena Antónia, licenciada em direito, advogada, e pós-graduada em empreendedorismo social. Foi esta última formação que a inspirou a utilizar a moda sustentável como meio de expressão pessoal e ferramenta de mudança.
Seguindo os princípios da economia circular, a Vintage for a Cause promove e estimula a devolução de peças de roupa em final de vida, para reutilização. Funciona, assim, como uma plataforma colaborativa para o upcycling, envolvendo designers, marcas de roupa e indústria portuguesa. Com o pressuposto de que cada peça pode ter uma nova vida, a marca cria designs exclusivos utilizando desperdício têxtil, através de processos sustentáveis e a preços que permitam ao consumidor fazer parte do processo de transição da fast fashion para a sustentabilidade.
Até ao momento, inclui no seu portefólio a colaboração com mais de 10 designers, entre as quais a estilista Katty Xiomara – ainda hoje parceira e embaixadora da Vintage for a Cause. Destacam-se ainda outras parcerias de sucesso, como com a marca internacional SKFK Ethical Fashion.
Para não perder noção da sua pegada ecológica, a marca regista ainda a poupança de CO2 e de água por cada peça que produz. Até ao momento, a iniciativa já conseguiu uma poupança de 3 milhões de litros de água e 7.000 kg de CO2, prevendo-se que, com o crescimento da marca, estes números possam anualmente vir a triplicar.
Responsabilidade Social: From Granny to Trendy
Para além da questão da sustentabilidade, o projeto demonstra preocupações sociais, promovendo a capacitação de mulheres acima dos 50 anos fora da vida ativa, através da criação de clubes de costura, da promoção do programa “From Granny to Trendy” (workshops que culminam num desfile – este ano, acontece já no próximo dia 15 de fevereiro, no Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões, Matosinhos, pelas 16h30 – e numa sessão fotográfica), e da criação de oportunidades de emprego. Também nestas iniciativas, que promovem o envelhecimento ativo, as participantes abordam técnicas de reaproveitamento e transformação de roupa. Até ao momento, a marca já integrou mais de duas centenas de mulheres.
A Vintage for a Cause promove ainda workshops para o público em geral, assim como tutoriais com técnicas de reaproveitamento e reparação de roupa, sensibilizando para a importância de adotar comportamentos que permitam poupar e reutilizar recursos.
“Sentimos que a única forma de conseguir ter impacto é envolvendo todas as partes que integram a cadeia de valor da indústria da moda – como as escolas, os profissionais da moda, os consumidores e os agentes decisores locais -, pelo que desenhamos um modelo de negócio colaborativo e de intervenção social que acreditamos que distribui a responsabilidade e os benefícios da forma mais equitativa possível. Pessoalmente, acredito que o único o caminho para a sustentabilidade é este: criar modelos, estilos de liderança e inovações que tragam mais humanidade à sociedade em geral, preservando o ambiente de forma realista e ajustada aos dias de hoje”, sublinha Helena Antónia.
A marca conta com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, da Câmara Municipal do Porto, de diversas empresas que doam desperdício têxtil, e de diferentes organizações e parceiros para replicação dos programas de inclusão social. As preocupações ambientais aliadas à responsabilidade social já lhe valeram vários reconhecimentos, entre os quais um prémio da Fundação EDP (através da EDP Solidária, em 2013), e uma menção honrosa pelos Green Project Awards, em 2017.
A marca tem marcado presença na maior plataforma e feira de moda ética e sustentável do mundo, em Berlim — antes Ethical Fashion Show e agora Neonyt — e, em 2018, iniciou a organização da Fashion Revolution Week no Porto, em parceria com a Fashion Revolution Portugal. As peças Vintage for a Cause podem ser adquiridas através do website oficial e em lojas parceiras. Parte das receitas é utilizada para investimento em programas de inclusão social, educação e sensibilização para a sustentabilidade e consumo consciente.