A Universidade de Évora (UÉ) descobre nova espécie de planta: a Helosciadium milfontinum. “Trata-se de uma planta endémica, rara e fortemente ameaçada”, diz em comunicado Carla Pinto Cruz, investigadora do MED (Instituto Mediterrâneo para Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento) da UÉ. A planta cresce nos charcos temporários e encontra-se restringida a nível mundial a pequenas áreas da Costa Vicentina.
A investigadora sublinha a importância da descoberta desta planta, cujo conjunto de flores “faz lembrar um pequeno guarda-chuva, semelhante às flores do agrião que floresce entre julho e agosto e frutifica no início de setembro”. Esta apresenta caules rastejantes, “que enraízam em nós e as folhas são lobadas e têm as margens dentadas” acrescenta.
Graças a este estudo conjunto entre a UÉ e botânicos da Universidade de Oviedo, “é possível mostrar claramente que esta nova espécie difere da previamente identificada”, referindo-se à Apium repens, cuja área de distribuição é mais abrangente no território europeu. Através do estudo das características morfológicas e genética levado a cabo pela equipa de investigadores, “foi possível mostrar que tratava-se de uma espécie distinta da previamente classificada” onde a ocorrência desta nova espécie “encontra-se restringida mundialmente a pequenas áreas da Costa Vicentina”, refere a responsável.
Carla Pinto Cruz explica que, através do estudo taxonómico, (a ciência que explora, descreve, nomeia e classifica todos os organismos e tem como objetivo a organização da diversidade biológica de exemplares preservados) e recorrendo a amostras existentes em herbários mas também recolhidas na natureza “foi possível clarificar a identidade desta planta”. A possibilidade da identificação futura desta espécie de forma objetiva é uma vantagem apresentada pela investigadora, “agora possível independentemente da época do ano e apenas com recurso a pequenos fragmentos de uma planta” explica, contribuindo esta ainda para a base de dados de DNA Barcoding” (Enciclopédia da Vida).
Desde o inicio do século que os cientistas passaram a recorrer a dados moleculares para melhorar a classificação das plantas e identificação das espécies, Carla Pinto Cruz, esclarece que, “tendo por base a premissa de que uma curta sequência padronizada de DNA pode permitir a distinção de indivíduos de espécies diferentes”, tais avanços neste tipo de tecnologia “pode inferir melhor as relações evolutivas e de “parentesco” entre as diferentes espécies”, como é o caso deste estudo. De mencionar que, “foi através da identificação de pequenas sequências de DNA, próprias de cada espécie possível a descoberta da Helosciadium milfontinum”, refere.
Associado à identificação genética integram as seleções evolutivas e de parentesco das espécies, “essas relações são estudadas por métodos de inferência filogenética que avaliam as características herdáveis observadas (ex: sequências de DNA ou características morfológicas), cujo resultado é depois expresso num diagrama a que chamamos árvore filogenética”, explica a investigadora, referindo que existem regras internacionais para atribuir o nome a cada planta (nomenclatura), inscritos no Código Internacional de Nomenclatura Botânica (ICBN), “criado por Lineu, e usado até aos nossos dias”, o sistema binomial é um sistema universal padronizado.
Assim, cada espécie de planta é designada por uma combinação exclusiva de duas palavras em latim: primeiro o “género” e depois o epíteto específico, atribuindo-se um nome único para cada espécie -reconhecido mundialmente por todos os cientistas – tal como se verifica com esta descoberta e cujo epíteto específico atribuído milfontinum” por ser alusivo à sua área de ocorrência, ou seja, Vila Nova de Milfontes.
“A identificação precisa de cada espécie é essencial, mas também para melhor podermos planear adequadamente os esforços de conservação”, afirma a investigadora, uma vez que, na sua opinião, “ao percebermos que esta pequena planta está mais isolada geneticamente do que pensávamos passamos a estar mais conscientes do seu verdadeiro estatuto, da sua importância e do elevado grau de ameaça”.
Carla Pinto Cruz fez saber que esta planta já foi alvo de alguns esforços de conservação, quer nos charcos temporários da região onde pode ser encontrada, mas sobretudo direcionados à própria planta, através do projeto «Recuperação de Valores Naturais – Habitats e Espécies de Zonas Húmidas Temporárias», coordenado pela Universidade de Évora, uma iniciativa lançada pelo ICNF, em parceria com o Fundo Ambiental, a qual contribuiu para a conservação de valores e recursos naturais, a promoção e manutenção da biodiversidade, assim como o restauro de habitats ou a valorização do território, com base nos sistemas e espécies autóctones.
Ainda que estes charcos temporários da região alentejana estejam “muito ameaçados do ponto de vista da sua conservação” os mesmos apresentam “um habitat único que alberga uma grande diversidade de organismos e onde a diversidade biológica vai sendo perdida à medida que cada espécie se extingue”, alerta a investigadora.
A realização de ações de conservação e o seu planeamento adequado “é essencial” recorda, referindo que, “são observadas diariamente as consequências das nossas ações no planeta e o ritmo acelerado a que se produzem alterações”, motivo para afirmar “que só tendo um bom conhecimento das espécies, como neste estudo viemos demonstrar, podemos perspetivar e priorizar adequadamente os esforços de conservação”.