A Lista Vermelha das Aves de Portugal Continental e o III Atlas das Aves Nidificantes de Portugal dão conta de que uma em cada três populações de aves portuguesas está ameaçada de extinção, sendo a situação particularmente preocupante nos casos das aves de zonas agrícolas, das migradoras de longa distância e das aves marinhas: diminuiu a sua abundância e a sua área de distribuição e aumentou o seu risco de extinção no nosso país.
Aves como o sisão, a abetarda, a águia-caçadeira (ou tartaranhão-caçador) e o rolieiro, que há 20 anos eram mais abundantes nos campos alentejanos, sofreram reduções drásticas em toda a sua área de distribuição, incluindo dentro das áreas protegidas. Os declínios destas aves estepárias são representativos das aves de zonas agrícolas em geral, que têm sofrido com a intensificação da agricultura e com a alteração drástica dos usos do solo: “as monoculturas agrícolas, a simplificação da paisagem, o aumento do regadio e do uso de agroquímicos está a arrastar para a extinção um grupo de aves único em toda a Europa, que são as aves das planícies de sequeiro do sul e centro de Portugal”, diz Domingos Leitão, Diretor Executivo da SPEA, “é urgente reverter a intensificação agrícola e criar áreas de habitat agrícola com qualidade, se queremos salvar estas espécies da extinção”.
No caso das aves migradoras de longa distância, estas têm visto as condições de nidificação no ártico dificultadas pelas alterações climáticas, ao mesmo tempo que as condições nas suas rotas de migração se têm deteriorado devido à pressão humana na orla costeira e nas zonas húmidas de que dependem: estuários, rias e lagoas costeiras. A drenagem de zonas húmidas para a agricultura, desenvolvimento urbano e turístico, a conversão de sapais e salinas em pisciculturas e outras alterações drásticas dos locais de paragem e descanso destas aves está a provocar uma redução acentuada das suas populações: “aves como os pilritos e os maçaricos enfrentam já situações extremamente difíceis nos seus locais de nidificação – se lhes destruirmos os refúgios em Portugal, dificilmente sobreviverão”, frisa ainda o responsável.
Também as aves marinhas, que passam o inverno no nosso país, como a gaivota-tridáctila, a torda-mergulheira e o papagaio-do-mar, registaram um agravamento do seu estatuto de conservação em Portugal Continental. No grupo das aves marinhas, as nidificantes, como a cagarra (que tem nas Berlengas a maior colónia de reprodução da Europa) e a galheta não escapam às tendências negativas – reflexo de ameaças como a sobrepesca, as alterações climáticas, a captura acidental na pesca e a poluição dos mares.
“Temos resultados que demonstram que as ações de conservação funcionam, e que as espécies respondem bem às melhorias e restauro do habitat e à redução das ameaças de origem humana”, diz Domingos Leitão.
Exemplo do sucesso de projetos e ações de conservação a longo-prazo são as aves de rapina, como os abutres e as grandes águias, que beneficiaram de ações de conservação que reduziram ameaças sérias como a perseguição direta, o uso ilegal de venenos e a mortalidade em linhas elétricas. Como resultado, espécies como o abutre-preto, o grifo, a águia-perdigueira (ou águia-de-bonelli), a águia-calçada, o bútio-vespeiro e a águia-sapeira têm agora menor risco de extinção do que na Lista Vermelha anterior (que data de 2005).
Por outro lado, espécies como os patos terão beneficiado da redução da pressão da caça, pela diminuição de caçadores e gestão mais equilibrada daquela atividade. Já espécies de garças, colhereiros e ibis viram a sua situação melhorar graças à maior abundância de alimento nos arrozais e outras zonas alagadas, bem como a uma maior proteção dos seus locais de reprodução.
Relativamente à Lista Vermelha anterior, o número de populações classificadas como ameaçadas de extinção aumentou de 88 para 95 populações, ou seja, hoje existem mais populações e espécies de aves ameaçadas do que em 2005.
Liderados pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e desenvolvidos em parceria com a Universidade de Évora, ICNF, IFCN (Madeira) e CIBIO/BIOPOLIS, com a participação de mais de 400 ornitólogos voluntários e profissionais, estes dois projetos complementares permitem obter um panorama do estado das aves em Portugal e, esperam os especialistas, direcionar esforços de conservação para aquelas que mais necessitam.