Entre os anos 2046 e 2065, Portugal Continental vai sofrer uma diminuição da precipitação média anual de 10% na zona norte e em todo o litoral e de cerca de 30% nas zonas interiores e no sul. As previsões, realizadas na Universidade de Aveiro (UA) apontam para um cenário de “escassez de água no ecossistema e, naturalmente, para consumo humano”. Face ao cenário, os investigadores apelam à “implementação de medidas urgentes para, no futuro, melhor captar e gerir a água da chuva”.
A coordenadora do estudo e investigadora do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM), uma das unidades de investigação da UA, Paula Quinteiro, alerta em comunicado que “a diminuição severa de água da chuva disponível no solo pode resultar na diminuição de disponibilidade de água dos rios e dos aquíferos, o que numa situação limite pode condicionar a quantidade de água disponível para consumo humano e do ecossistema”.
Os resultados da investigação antecipam um cenário preocupante se não forem tomadas medidas que resultem na otimização da água disponível: “os valores médios de precipitação previstos para o período compreendido entre 2046 e 2065 apontam para uma diminuição média anual da precipitação em Portugal Continental de cerca de 10% na zona norte e em todo o litoral e de cerca de 30% nas zonas do interior e do sul do país”. Estas previsões da precipitação foram realizadas pelo Departamento de Física da UA no âmbito do projeto CLICURB-Urban atmospheric quality, climate change and resilience coordenado pelo Grupo de Emissões Modelação e Alterações Climáticas do Departamento de Ambiente e Ordenamento (DAO) da UA e financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
A redução da precipitação em território nacional está relacionada com o fenómeno das alterações climáticas. “O aumento da temperatura global do planeta potencia alterações no ciclo global da água, aumentando o contraste entre regiões secas e húmidas”, explica Paula Quinteiro. Isto significa que o planeta terá uma dualidade de cenários: áreas com um aumento de precipitação e com o consequente agravamento do risco de inundação e áreas com uma redução da precipitação e com o consequente aumento do risco de secas. No caso português, as projeções realizadas apontam para uma redução dos níveis de precipitação durante todo o ano, com exceção dos meses de inverno.
Implementação de medidas urgentes
Ao longo do território nacional, os investigadores da UA avaliaram as condições de disponibilidade e de escassez de água da chuva, considerando diferentes coberturas de solo – agrícola, florestal, urbano e solo predominantemente com vegetação natural.
“Na atualidade já se identifica alguma pressão nos recursos de água verde [água da chuva] sendo que esta pressão irá aumentar significativamente no futuro, dando a indicação de que em algumas situações, e dependendo dos requisitos de água necessários para garantir e maximizar o crescimento de vegetação, devem ser implementadas medidas de gestão/captação e eficiência de consumo dessa água”, explica Paula Quinteiro, a investigadora que assina o trabalho do CESAM juntamente com Sandra Rafael, Bruno Vicente, Martinho Marta-Almeida, Alfredo Rocha, Luís Arroja e Ana Cláudia Dias.
Entre as medidas podem, por exemplo, “ser implementados sistemas de recolha de água da chuva por forma a garantir a respetiva disponibilidade para irrigações agrícolas e florestais”. A investigadora aconselha ainda a realização de um planeamento integrado de uso de solo e disponibilidade de água da chuva, dos rios e dos aquíferos. Em situações mais prementes, Paula Quinteiro diz que “pode ser necessária uma realocação do cultivo para zonas com uma maior disponibilidade de água da chuva, atendendo também às condições do solo e características da vegetação em causa”.
A pressão nos recursos de água verde em Portugal foi calculada através da metodologia de Avaliação de Ciclo de Vida (ACV), no âmbito dos projetos SustainFor e SABIOS coordenados pelo grupo LiSAT- Life Cycle Based Sustainability Assessment Tools Team do DAO e financiados pela FCT. A quantidade de água verde evaporada e transpirada pela vegetação foi calculada tendo por base os dados climáticos presentes e futuros simulados, por forma a compreender o potencial impacte de consumo de água verde pelas plantas na escassez deste recurso.