A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) alerta em comunicado para o “sofrimento” de várias aves, como águias, garças e outras, incluindo espécies ameaçadas, que passam “horas em sofrimento”, acabando por “morrer, presas em redes autorizadas pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF)”. Esta associação informa que as “redes são usadas para impedir que as aves se alimentem dos peixes das aquaculturas”. Embora, os “empresários do setor se mostrem dispostos a procurar soluções”, a SPEA afirma que o “ICNF tem ignorado o problema”.
Numa visita recente a aquaculturas no estuário do Mondego, a SEPA recolheu imagens que “ilustram de forma chocante a tragédia que continua a acontecer em vários pontos do país enquanto as autoridades nada fazem, num processo que se arrasta há meses”, refere o mesmo comunicado.
A 18 de fevereiro, representantes da SPEA, da associação Milvoz, da Associação Portuguesa de Aquacultores, da Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM) e da delegação do ICNF da região Centro reuniram em Coimbra para debater o problema e mostraram vontade de testar e implementar soluções que permitam salvaguardar as aquaculturas sem dizimar aves. No entanto, desde essa data nada mais aconteceu, e a sede do ICNF (em Lisboa), que emite as licenças, não respondeu a nenhum dos múltiplos pedidos de reunião por parte da SPEA.
Domingos Leitão, diretor executivo da SPEA, diz que “ignorar um problema não o faz desaparecer, mas parece ser essa a estratégia do ICNF no que diz respeito à mortalidade de aves nas aquaculturas”. Segundo o responsável, “enquanto entidade licenciadora e fiscalizadora, o ICNF tem um papel fundamental neste processo, já para não falar das obrigações legais que o Estado Português não está a cumprir.”
Segundo a SPEA, as redes em questão são feitas de fio de pesca: “fino e transparente”, ficando praticamente “invisível para as aves, que continuam a ver os tanques como fonte de alimento até ser tarde demais”.
Para poder colocar estas redes nos seus tanques, um aquacultor tem de pedir autorização ao ICNF. Ao emitir a licença, o ICNF abre uma exceção à Diretiva Aves da União Europeia, o que, segundo a lei comunitária, só pode ser feito em condições muito específicas: o Estado português teria de provar que o problema existe, monitorizar o impacto da medida nas aves, e provar que não existem soluções alternativas. Teria ainda a obrigação de fiscalizar o procedimento para garantir que não sejam afetadas espécies protegidas e assegurar uma avaliação das medidas e da necessidade de as manter. Quanto à necessidade das redes e ao impacto nas aves, as autoridades portuguesas não entregam relatórios à União Europeia desde 2014.
A SPEA tem visto acumularem-se os casos de aves presas nestas redes, através das denúncias que recebe, tanto de pessoas preocupadas como de outras associações de ambiente. No entanto, segundo a SPEA, todos os pedidos de informação às autoridades sobre este tema “continuam sem resposta, pelo que esta pode ser apenas a ponta do icebergue”.
“Há uns dias, no estuário do Mondego, em apenas 5 tanques encontrámos 17 aves mortas: pernilongo, garças-brancas-pequenas, corvo-marinho, gaivotas, entre outras”, afirma Domingos Leitão, realçando que “o problema existe, é urgente implementar soluções.”
De acordo com a SPEA, a solução do problema pode passar por “usar redes pretas”, para que as aves possam vê-las e desviar-se. Usando uma “malha mais apertada, estas redes evitariam também que as aves ficassem presas”, realça. Além disso, podem ser “usadas juntamente com medidas para afugentar as aves, como fitas coloridas ou réplicas de predadores”, acrescenta. Para esta associação: “Estas e outras soluções deveriam ser testadas, monitorizando de perto a sua eficácia, para que a salvaguarda das aquaculturas não seja uma ameaça às aves selvagens”.