A economia circular é a “melhor forma de encontrar uma solução para o problema das alterações climáticas, de uma forma holística e integrada”, assegura Ana Isabel Trigo, diretora da Sociedade Ponto Verde (SPV). A propósito da Conferência “Economia Circular – Pensar o Futuro de Forma Circular”, que a SPV promoveu em fevereiro, a Ambiente Magazine esteve à conversa com a responsável que defendeu que devem ser “promovidas práticas colaborativas ao longo das cadeias de valor”. Ana Isabel Trigo acredita que o atual “modelo de produção e consumo”, quando associado à “urgência climática”, exige uma “nova abordagem”. Para as empresas, governos e cidadãos, a resposta só pode ser uma: “reciclar e reutilizar, prolongando a vida útil dos materiais, aumentando a eficiência energética e reduzindo as emissões de CO2. Esta é a proposta da economia circular”, assegura. No entanto, é vista como um “enorme desafio não só de mentalidades, mas também de inovação”. Envolvidos nesta “proposta” estão diversos setores e atividades desde “energia, indústria, transporte, alimentação, design, engenharia dos materiais e tecnologias digitais”. Produtos, serviços e ideias “devem circular livremente”, para “disseminar ainda mais esta semente de mudança”, considera.
A economia circular pressupõe “mais inovação, criação de emprego e sinergias”. A SPV considera assim que os decisores políticos, académicos, criativos e técnicos “devem partilhar experiências, a nível nacional e internacional”. A cooperação “não pode nem deve ter fronteiras”, acrescenta Ana Isabel Trigo. Através da conferência, “tivemos a oportunidade de perceber o que está a ser feito em Portugal”, por nacionais e estrangeiros que “escolheram o nosso país para apostar em modelos de circularidade”. A destacar ainda o “estreitamento de laços” e o “potenciar de colaborações futuras”, algo que é “essencial nesta área”.
Para Ana Isabel Trigo, o cidadão espera uma “maior conveniência ambiental” e a oferta de consumo que lhe chega já “deve cumprir com os requisitos ambientais”. Neste sentido, as organizações mostram uma preocupação em “corresponder às expectativas dos seus consumidores e clientes com maior entrega de valor nos seus produtos”, nomeadamente ao nível da sua performance ambiental. Debates como estes permitem à SPV “incentivar e informar o cidadão para que o comportamento e hábitos estejam alinhados com as necessidades ambientais”. Junto das organizações e de clientes “pretendemos trazer as melhores ferramentas e o conhecimento para que incorporem práticas que cumpram com a economia circular, nas suas áreas de negócio”.
Europa na Vanguarda da Economia Circular
O Plano de Ação para a Economia Circular (PAEC) 2017 – 2020 procura “responder aos desafios que temos em mãos”, explica a diretora da SPV. “É um modelo estratégico de crescimento e de investimento que surge à luz dos compromissos internacionais de Portugal”, exemplificando o Acordo de Paris, os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas e as metas da União Europeia. A responsável considera que Portugal “deve orientar a sua ação na promoção de circularidade a partir deste eixo tripartido”. No entanto, Ana Isabel Trigo sublinha a importância para que a legislação existente ou a que vier a ser produzida de âmbito nacional e europeu, “favoreça o aparecimento de soluções eficientes com capacidade de mitigar os impactos ambientais”.
“Em Portugal já existem exemplos de economia circular”, afirma a diretora. Por exemplo, através da reciclagem de embalagens de plástico é “possível produzir bancos e mesas de jardim e variado mobiliário urbano”, as garrafas de água já têm muitas vezes a “incorporação de plástico reciclado – através de RPET”, permitindo “poupanças de 84% de energia”; as embalagens de vidro por exemplo têm na sua reciclagem um “potencial de poupança de 40% de energia”. Outros exemplos de compostagem comunitária ou projetos de reparação de utensílios e brinquedos ou eletrodomésticos “pontuam já várias iniciativas enquadradas nos princípios de circularidade dos materiais”, aponta Ana.
Quando questionada sobre a preocupação das empresas portuguesas neste setor, a responsável considera que “estão mais alinhadas e disponíveis para encontrar soluções”. No entanto, para acompanhar esta tendência, “é preciso maior investimento em Investigação & Desenvolvimento”. Há ainda um “caminho a percorrer” e é necessário “agir na forma como são desenhadas e produzidas as embalagens” privilegiando-se a “utilização de um só material”, exemplifica.
O Ponto Verde LAB, promovido pela SPV, incentiva o design for recycling, ou seja, “a conceção de um produto” com o intuito da “maximização da reciclagem do mesmo”, no seu final de vida útil. O objetivo desta plataforma digital passa por “divulgar informação e conhecimento”, para posteriormente os “nossos parceiros conseguirem aceder a formas de desenvolvimento de embalagens mais sustentáveis e com processos de fabrico mais inovadores”. A responsável sublinha que estes “meios” são importantes, lembrando que “há metas definidas”, como a Estratégia da União Europeia (UE) para os Plásticos numa Economia Circular. Até 2030, todas as embalagens de plástico colocadas no mercado da UE, entre outros produtos, “deverão ser reutilizáveis ou recicláveis”.
As Pequenas e Médias Empresa (PME) são vistas como o “motor económico de muitos países e Portugal não é exceção”, refere Ana Trigo. No caso da Economia Circular, a responsável considera que “será importante apostar num enquadramento que favoreça parcerias entre diversos atores”. Dando como exemplos, o “apoio financeiro nas compras públicas” ou a “redução do IVA para reparações e bens e/ou serviços circulares”. Avaliando o caso de Portugal, “ainda existe uma procura residual por estes bens e serviços” que promovem a circularidade. No entanto, a nível europeu “há trabalho realizado” e com um “potencial de crescimento bastante interessante”. Segundo a diretora da SPV, “em cinco anos” o Banco Europeu de Investimento “cofinanciou projetos de Economia Circular” no valor de “2,1 milhões de euros”. As áreas são diversas, mas apresentam uma prevalência em “ambiente, inovação e, precisamente, pequenas e médias empresas”.
Portugal: Rumo à Economia Circular
Ana Isabel Trigo é perentória ao considerar essencial “promover uma visão partilhada” e, paralelamente, “terá de haver um maior esforço para chegar a todos os públicos”, através de conhecimento e educação.
Avaliando a situação em Portugal, a faixa etária que está nos 40 anos é das que mais recicla e tem comportamentos sustentáveis. Contudo, o último estudo que a SPV fez junto dos cidadãos, “os resultados ficam muito aquém” dos acima referidos. As práticas “rumo a uma maior circularidade têm de ser parte dos currículos educativos”, considera.
Sobre o futuro da Economia Circular e como perspetiva o futuro do planeta, a diretora da SPV sublinha que face à pressão que, hoje, “exercemos nos recursos naturais”, terá de ser “necessariamente circular”. Para isto são vários os desafios: “redesenhar processos e investimentos, repensando estratégias e produtos e, sobretudo, promover o cruzamento de várias áreas do saber”. É fundamental “chamar todas as áreas para atuar. O potencial é enorme, para o ambiente e para a economia”, conclui.