Decorreu nos dias 10 e 11 de dezembro o X Encontro Nacional de Gestão de Resíduos da APEMETA (Associação Portuguesa de Empresas de Tecnologias Ambientais). Este ano, o evento decorreu em formato online e teve como tema central “Uma Década de Mudanças”.
Convidada para debater o painel “Perspetivas históricas”, Ana Trigo Morais, CEO da Sociedade Ponto Verde (SPV), começou por destacar aquela que é a grande preocupação e que tem que ver com o “equilíbrio económico-financeiro” de todo o sistema e, particularmente, do SIGRE (Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens). Antes disso, e olhando para a história da SPV, a responsável quis destacar que a missão continua a ser a mesma: “Garantir a organização e a gestão do circuito que assegura a retoma, a valorização e a reciclagem dos resíduos de embalagens não reutilizáveis, ao mesmo tempo que promove uma diminuição de deposição em aterro”. Na ótica da SPV, fazer parte de um sistema como este tem várias “implicações”, nomeadamente a “noção de articulação”, de “responsabilidade de todos” e de “todos os parceiros” no sentido de “sermos, de facto, aquele que é um ciclo virtuoso que promove a sustentabilidade ao seu infinito”.
[blockquote style=”2″]O setor entrou numa espécie de incapacidade para prosseguir em conjunto[/blockquote]
Ao longo dos anos, foram várias as mudanças sentidas no setor dos resíduos. Ana Trigo Morais destaca o “conjunto de evolução significativas” nos “padrões de modelo de consumo”, nos “atores e na reconfiguração dos próprios que interagem nestes mercados” e nas “novas formas de praticar reciclagem”, a “tecnologia” e “alguma evolução” que obrigou ao setor a estar mais atento. Ao mesmo tempo, “fomos sensibilizados para o crescente aumento da nossa responsabilidade” e um “crescente aumento das metas a que estamos comprometidos”, refere. Assim, nos últimos 25 anos assistiu-se, primeiramente, a um “acelerar do setor” e a SPV é um bom exemplo disso: “Vemos os números de reciclagem a aumentar e já foram investidos 50 milhões de euros em campanhas de sensibilização”. No entanto, a partir de uma certa altura, o setor entrou numa “espécie de incapacidade para, em conjunto, prosseguir”, refere, constatando que “faltou e falta uma visão colaborativa”, nestas matérias. E o tempo “perdido” é umas das principais causas apontadas como por exemplo, na “renovação de uma licença”, nas “oportunidades de investimento”, na “clareza do quadro jurídico” ou nos “desentendimentos entre os atores” da cadeia de valor. Neste último, a CEO da SPV lamenta o “nível de litigância” que existe entre os agentes deste setor: “Há muita conflitualidade. Estamos aquém de podermos fazer muito mais daquilo que é uma aproximação e uma articulação do funcionamento da cadeia de valor e dos nossos agentes”. Nestas matérias, “temos que perceber que conseguimos discordar e concordar em conjunto”.
[blockquote style=”2″]Deixar de ser um setor em que todos têm imensas opiniões[/blockquote]
Relativamente à concorrência do setor, Ana Trigo Morais reconhece que essa foi causadora de ensinamentos importantes: “A SPV sabe que o sistema concorrencial, genericamente, cria valor ao consumidor e, no setor dos resíduos, trouxe a awareness e sensibilidade para olhar para um conjunto de temas, que são fulcrais e críticos, e atingirmos as nossas metas e melhorar o desempenho”. No entanto, o sistema concorrencial trouxe também uma realidade que dura desde 2017: “O SIGRE entrou numa turbulência que não é só de natureza económico-financeira, mas também de entendimento de quadro legislativo”. E, nesta altura “não é admissível que haja uma litigância constante entre as entidades gestoras e não interessa quem tem razão”. Para combater a problemática, a responsável considera que é fundamental trabalhar na “inovação”, na “sensibilização e Comunicação” e na “estabilidade da legislação e na transparência”.
Embora o painel se centre nas “perspetivas históricas”, Ana Trigo Morais aproveitou para chamar a atenção para a necessidade de o futuro não ficar esquecido: “Temos que nos preparar hoje”. O setor dos resíduos em Portugal tem que “deixar de ser um setor em que todos têm imensas opiniões” para passar a ser um setor em que “temos imensas evidências das nossas opiniões e dos factos que são críticos para o nosso funcionamento”. E o futuro traz também a necessidade de se trabalhar em parceria numa “cultura de percebermos todos que viveremos quanto melhor ou pior nos consigamos relacionar”. E, além da “responsabilidade dos acionistas”, é fundamental que haja uma “responsabilidade” que corresponde a uma “escolha de fundo”, nomeadamente da política pública que é desenhada em Portugal para o setor: “Temos de trabalhar a montante e perceber quais os desígnios estratégicos e os objetivos do país”.
Em suma, é crucial perceber como é que o sistema se capacita para que se garanta o “equilíbrio económico-financeiro: “O SIGRE continua com prejuízos. É insustentável e não podemos permitir que, na falta da clareza da definição do quadro da responsabilidade de todos, haja fatores que bloqueiam a evolução para um sistema melhor”, remata.