A Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente (AEPSA) convidou o secretário de Estado do Ambiente, Emídio Sousa, para uma reunião com empresas do setor dos resíduos, na sede da Ambigroup Reciclagem, no âmbito de um diálogo sobre a visão do Governo para este setor. Esta iniciativa teve como objetivo transmitir à tutela as principais preocupações da AEPSA sobre o setor dos resíduos, tendo em conta as inúmeras áreas que estão a ser alvo de alterações legislativas e regulatórias, que irão redefinir papéis, objetivos e metas ambientais, em todos os fluxos da cadeia de resíduos.
No final da iniciativa, em conferência de imprensa, o secretário de estado do Ambiente, Emídio Sousa, considerou que o setor dos resíduos em Portugal enfrenta hoje grandes desafios e que esta realidade só será ultrapassada com outra lógica de abordagem. Para o responsável, a reciclagem de materiais é aquilo que o país quer, muito mais que enviar resíduos para aterro, muito mais do que o conceito de economia vertical em que se extrai a matéria-prima, se processa, resultando no produto que é utilizado e mandado para o lixo. “Há um novo desafio que todos temos, que é o produto não ir para o lixo, ter uma segunda vida, através da economia circular, há muitos materiais que podem ser utilizados em diferentes momentos ou então recuperar todos os materiais que lá estão incorporados, dando-lhes uma segunda vida”, refere o interlocutor.
Justificando o encontro com a AEPSA e vários operadores que atuam sobre a reciclagem em território nacional, o governante contextualizou que é uma mais-valia tendo em conta o grupo de trabalho que criou, no âmbito do Governo, para olhar para o destino final dos resíduos. As propostas de trabalho deste grupo deverão ser apresentadas nos próximos dois meses – “como meta temos ter conclusões até 31 de janeiro, depois haverá uma avaliação pelos membros do Governo” -, para de seguida se avançar para a execução. Recorda Emídio Sousa que a Europa fixou metas muito ambiciosas, inclusive no âmbito do Pacto Ecológico Europeu, mas “atingir essas metas é que é necessário fazê-lo”. Esperando o responsável que o grupo de trabalho tire conclusões rápidas, observando que já tem uma parte significativa feita. Acrescenta ainda que a reunião com a AEPSA se enquadra na audição aos privados do setor e servirá para incorporar informação ao trabalho que está a ser feito.
“Mas, essencialmente muito antes de mandarmos alguma coisa para aterro, temos de fazer a separação dos materiais, a sua reciclagem, extrair todas as componentes que pudermos dos materiais. O aterro será sempre a última das hipóteses. Uma coisa nova a meter na equação e que não tem sido devidamente aproveitada é a valorização energética dos resíduos.” Para Emídio Sousa esta é uma certeza na nova lógica de enquadramento da gestão dos resíduos em Portugal a prazo, adiantando que a energia pode ser produzida a partir de alguns destes resíduos que não têm uma recuperação possível: “É isso que iremos fazer nos próximos tempos, encarar a valorização energética como uma forma de valorizar os resíduos”. Por outro lado, indica que uma das missões do grupo de trabalho é aproveitar os atuais aterros, para lhes dar mais algum tempo de vida, até se ter outras soluções devidamente enquadradas, pois todos os investimentos a serem planeados e a serem feitos nos próximos anos levarão tempo – “desde uma central de valorização energética a uma central de valorização orgânica – é preciso mobilizar recursos, fazer projetos, procedimentos de contratação pública, teremos sempre um delay, por isso falamos em investimentos de médio prazo”. Sendo assim, “no curto prazo temos de otimizar” o existente.
Na nova lógica de gestão de resíduos em Portugal o cidadão terá que ter um papel mais central, também segundo a tutela, que considera que “muito do que falámos só é possível, com o esforço dos cidadãos, ser executado se tivermos a consciência de que é preciso separar os resíduos, diminuir essa produção e que a utilização dos materiais numa segunda fase é necessário. Muito mais do que falar de aterros, temos de falar cada vez mais em reciclagem e reutilização e desenvolver a tecnologia necessária para avançar com estes processos”.
O tempo urge, as metas e ambições no contexto europeu são conhecidas e para Emídio Sousa “estamos muito aquém daquilo que devíamos fazer em matéria de reciclagem, mas temos de ser pragmáticos, não basta a consciência cívica e ambiental, temos de incentivar o cidadão a fazer reciclagem”. Sendo assim o grupo de trabalho irá com certeza dar força a incentivar o cidadão a participar mais ativamente neste processo que terá duas variantes: que cada um pague o resíduo que produz e que receba em função da reciclagem que faz. “Tem que haver um balanço entre aquilo que nós entregamos como resíduo/lixo e a separação que fazemos. É preciso incentivos e um dos melhores é o financeiro, espero que evoluamos para um sistema em que a pessoa paga conforme produz e recebe conforme recicla”, acrescenta o responsável, concluindo que “tem de haver um trabalho prévio de consciencialização e informação às pessoas. Este é um Governo que tem de governar para as pessoas”.
Por outro lado o secretário de estado do Ambiente lembrou ainda neste trajeto o papel dos municípios, que é fundamental, pois todo o sistema em baixa dos resíduos é da sua responsabilidade. “Quando eu falo de um sistema em que cada um paga conforme o que produz e recebe um bónus conforme recicla, isto vai passar pelos municípios, sozinhos ou agregados, que é outra hipótese, porque muitas vezes um município por si não tem dimensão. Há investimentos que serão otimizados se entrarmos numa agregação de entidades, de uma forma voluntária”, acrescenta o orador, reforçando que “os incentivos financeiros serão interessantes, porque hoje o preço de mandar resíduos para aterro e o preço de pagar a gestão de resíduos têm impacto nas contas, penso que os próprios municípios terão interesse neste modelo, pois poderão libertar dinheiro para outros investimentos”.
Relativamente aos investimentos que terão de ser feitos no país nos próximos anos, considera o secretário de Estado que “fundos existem, é preciso é haver capacidade de pagar. Em termos de financiamento poderemos recorrer à banca, usar fundos próprios ou comunitários (que já sabemos qual o seu valor no nosso investimento), provavelmente teremos que ir também a financiamento do Banco Europeu de Investimento. Prevemos um investimento de 2 mil milhões, que entre outros, abranja cinco incineradoras, duas centrais de valorização, sendo esta uma estimativa muito preliminar”.
Por seu lado a Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente (AEPSA) recorda que Portugal regista uma preocupante divergência dos objetivos ambientais a que está obrigado, nomeadamente no cumprimento das metas da União Europeia, no quadro da economia circular. Neste âmbito, considera associação que a visita do Secretário de Estado do Ambiente a um dos maiores operadores ibéricos de gestão de resíduos (Ambigroup) assume uma particular relevância, porque cria um contexto para discutir as principais preocupações desta indústria, que aguarda com expectativa a estratégia do Governo para o setor.
Por Pedro Chenrim