A Diretiva-Quadro da Água (DQA) da União Europeia dominou a atenção do primeiro dia (ontem) de trabalhos do X Congresso Ibérico de Gestão e Planeamento da Água, que se realiza estes dias na Universidade de Coimbra (Pólo II), organizado pela Fundação Nova Cultura da Água (FNCA).
O objetivo desta normativa comunitária é evitar a deterioração do estado das águas superficiais e subterrâneas, como explicou o responsável pelas políticas da Direção Geral do Meio Ambiente da Comissão Europeia, Joaquim Capitão: “Ainda estamos muito longe dos resultados esperados. A tendência para melhorar é segura mas ainda existe muito por fazer.”
Além disso, mais de metade dos rios da península ibérica não são saudáveis. Em Espanha, só 45 por cento das águas superficiais e subterrâneas estão em bom estado ecológico, enquanto em Portugal o número sobe para os 53%.
Júlia Martínez, diretora técnica da FNCA, e Paula Chainho, da Universidade de Lisboa, foram críticas na sua exposição sobre a aplicação real da DQA, quer em Espanha como em Portugal: “Existem dois setores que são os principais geradores de pressão nas bacias: o agrário e o hidroelétrico, quer seja pelas captações de água quer pela sua contaminação difusa.” Júlia Martínez sublinhou ainda que não existem medidas para reduzir as pressões agrárias nem para modificar as concessões de uso. Na mesma linha orientadora, Paula Chainho afirmou que o Plano Nacional de Barragens de Portugal é aquele que está mais contra o cumprimento da DQA.
“Os objetivos ambientais continuam subordinados às exigências”, resumiram as palestrantes na sua análise da DQA, que atualmente se encontra no seu segundo ciclo de planeamento (2015-2021). Entre as lacunas referiram também a aplicação escassa do princípio de que quem contamina paga, e a reduzida participação dos cidadãos na definição das políticas concretas. “No segundo ciclo de planeamento existe um agravamento da participação; Pelo contrário existem uma série de consumidores privilegiados, como os responsáveis pela rega, que têm um impacto de paralelo”, referiu Júlia Martínez. Pelo lado positivo, as investigadoras salientaram o progresso do conhecimento e da monitorização originados pelo funcionamento da Diretiva, assim como a obrigatoriedade de estabelecer caudais ecológicos para os rios europeus.
Perante este cenário, Júlia Martínez e Paula Chainho consideram que o terceiro ciclo de planeamento deveria ter em conta a adaptação à alteração climática, reduzindo por isso as necessidades setoriais, assim como a melhoria da cooperação e a coordenação entre Espanha e Portugal. “O terceiro ciclo deve ser mais ambicioso porque continua a existir potencial para melhorar o estado dos ecossistemas aquáticos e da gestão da água”, concluíram. E, tal como assinalou Teresa Ferreira, da Universidade de Lisboa, até agora, não existiram avanços concretos em nenhum lugar da Europa.
Participação social
O primeiro dia do congresso organizado pela Fundação Nova Cultura da Água (FNCA) iniciou-se com as palavras de Carlos Martins, secretário de Estado do Meio Ambiente, que apelou para a participação da sociedade civil como movimento de pressão para a melhoria da situação dos rios. Na sessão de inauguração também participaram João Pedroso de Lima, presidente da Comissão Organizadora do congresso; Luís Filipe Menezes, vice-reitor da Universidade de Coimbra e Joan Corominas, vice-presidente da FNCA.
Leandro del Moral, catedrático do Departamento de Geografia Humana da Universidade de Sevilha apresentou uma revisão pormenorizada dos congressos ibéricos que a FNCA organizou desde que nasceu, há 20 anos. Recordou os temas mais recorrentes ao longo dos dez congressos realizados, entre eles, a alteração climática, a gestão das bacias transfronteiriças, a degradação das águas subterrâneas, a importância da irrigação, a diminuição dos custos e a importância da participação pública. Entre os debates do momento, Leandro Del Moral insistiu no decréscimo da implicação social: “A saúde da participação depende da qualidade do contexto democrático.”
As conferências plenárias do dia contaram ainda com a participação de António José Guerreiro de Brito, da Universidade de Lisboa, que lembrou o facto de que habitualmente a população só se preocupa com a água quando surgem problemas. Entre as suas conclusões, destacou a importância para que Portugal tenha una agenda para a água, específica e forte, com um mandato claro.
Por outro lado, Eva Flo, do Instituto de Ciências do Mar, pertencente ao Conselho Superior de Investigações Científicas, falou sobre a qualidade água costeira; enquanto Virgilio Hermoso, do Centro Tecnológico Florestal da Catalunha, explicou como se poderia melhorar a conservação nos ecossistemas aquáticos continentais. O dia terminou com a apresentação de mais de meia centena de comunicações oriundas de diferentes zonas da península ibérica e de diferentes áreas de investigação e conhecimento.
O X Congresso Ibérico continua hoje, com ciclos de Conferências e Sessões de Comunicações, estando previstas para sábado, dia 8 de setembro, duas visitas. A Visita 1 inicia-se às 10h00, na Ponte do Açude, com o seguinte programa: Passagem para Peixes do Açude-Ponte de Coimbra, Desassoreamento da Albufeira do Açude-Ponte de Coimbra e Estabilização da margem direita do Rio Mondego entre a Ponte Santa Clara e o Açude-Ponte de Coimbra. A Visita 2 tem início às 9h00, no Largo da Portagem, com o seguinte programa: Aproveitamento Hidroagrícola do Baixo Mondego, incluindo observação dos sistemas de uso do solo, das obras de regularização fluvial, sistemas de rega e drenagem e infraestruturas hidráulicas no Rio Mondego.