Nove dos 31 países com centrais nucleares produzem mais eletricidade com torres eólicas ou painéis solares do que com reatores nucleares, revela o Relatório da Situação da Indústria Nuclear Mundial, apresentado hoje em Londres. Este grupo de países inclui o Brasil, Alemanha, Espanha, Japão e China, este último o país que mais tem investido na construção de centrais nucleares nos últimos anos, responsável pelo início do funcionamento de 29 reatores (60%) num total de 48 que arrancaram entre 2011 e meados de 2018.
Enquanto a produção de eletricidade por centrais nucleares em 2017, estimada em 2.500 terawatts, aumentou apenas 1% devido ao impulso de 18% na China, a produção de energia eólica disparou 17% e a energia solar 35%, refere o relatório.
A indústria nuclear representa atualmente apenas 10,3% da energia produzida a nível mundial, contra 17,5% em 1996, refletindo uma tendência de declínio registada nas últimas duas décadas.
A redução do número de centrais em construção confirma não só o declínio do investimento na energia nuclear, mas também da rentabilidade deste tipo de tecnologia, afirma um dos autores do documento, Mycle Schneider.
“Tem sido intrigante ver, ao longo dos anos, que a energia nuclear se torna cada vez economicamente menos viável. E isso não é só para novas unidades, mas também para centrais que já existem”, disse à agência Lusa.
Referiu o exemplo dos EUA, onde, em 2015, o custo de operação e manutenção na energia nuclear era de 35 dólares (30 euros) por megawatt, ou seja, excluindo o investimento na construção e outros custos, mas onde também existem sistemas de energia renovável que oferecem a produção de energia por 30 dólares (26 euros) por megawatt.
“Começa-se a pensar, por que é que alguém quererá construir uma central nuclear, ou prolongar operação de uma unidade por mais 40 anos de idade? Porquê, se não é economicamente competitivo, nem faz sentido a partir de um ponto de política energética?”, questiona.
Esta interrogação levou os autores a introduzir um capítulo sobre as alegadas interdependências entre a indústria nuclear para fins civis e os interesses militares, nomeadamente em termos de conhecimento e desenvolvimento de armamento e equipamento nuclear.
“Ninguém está a dizer que os militares determinam o programa nuclear civil. Mas estamos a questionar, e existem muitos indícios, se as interdependências realmente contribuem para impulsionar a manutenção de instalações de outra forma financeiramente inviáveis ou o investimento em novas centrais, como o projeto de Hinkley Point C no Reino Unido”, referiu.
Produzido por um grupo de especialistas internacionais de várias áreas, o relatório refere que estão em funcionamento 413 reatores nucleares em 31 países e 50 em construção, dos quais 33 com atraso.
EUA, Jordânia, Malásia e Jordânia cancelaram alguns projetos, enquanto Argentina, Indonésia e Cazaquistão adiaram o início.
O relatório indica também que estão em processo de desativação 115 unidades, mas apenas 19 foram totalmente desmanteladas, das quais 13 nos EUA, cinco na Alemanha e uma no Japão e só 10 destas foram considerados em terrenos descontaminados.
Embora a indústria da energia nuclear esteja em declínio, Mycle Schneider acredita existirem grandes oportunidades económicas e profissionais no desmantelamento de instalações e gestão de resíduos radioativos num mercado que poderá valer um bilião de dólares (860 mil milhões de euros) até 2050.
“Parece que a futura energia nuclear não é o futuro, mas tem futuro”, garantiu.