O derrube da primeira barreira fluvial obsoleta por um movimento da sociedade civil está previsto para este verão, num gesto pioneiro em Portugal de reconexão do curso da ribeira de Odeleite, na bacia do rio Guadiana, em parceria com a Câmara Municipal de Alcoutim e com o apoio do programa europeu Open Rivers Programme.
A ANP|WWF, em parceria com a Câmara Municipal de Alcoutim, vai arrancar entre junho e julho deste ano com o projeto da primeira remoção impulsionada pela sociedade civil de uma barreira fluvial obsoleta em Portugal: o açude de Galaxes, na localidade de Galaxes, Freguesia de Vaqueiros. Este açude foi já identificado como obsoleto pelo ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas) em 2014 por nunca ter desempenhado o propósito pretendido com a sua construção, refere a Associação, num comunicado.
“Ao longo do último século, assistimos a um aumento exponencial da instalação de barreiras nos nossos rios, com um impacto muito negativo para a natureza como, por exemplo, o bloqueio das rotas migratórias e dos movimentos de muitas espécies de peixes e outras. Estas barreiras podem também ter consequências no bem-estar das pessoas, devido aos riscos que derivam da sua falta de manutenção, agravamento da erosão das praias e do aquecimento global. Esperamos que este projeto pioneiro sirva para impulsionar outras remoções de barreiras fluviais e que, finalmente, este tema deixe de existir apenas nas intenções e no papel”, declara Ângela Morgado, diretora executiva da ANP|WWF.
Através do European Open Rivers Programme (EORP) – uma organização que atribui fundos dedicados ao restauro de rios – a ANP|WWF identificou este açude para ser removido com o objetivo de melhorar as condições de habitat de diversas espécies de peixes ameaçadas de extinção, com destaque para o saramugo – a espécie de peixe não migratório mais ameaçada nas águas doces portuguesas, endémica à bacia do rio Guadiana – e para a enguia, que fazia parte da biodiversidade da ribeira e ainda é usada na gastronomia local. “Esta remoção será, assim, essencial para restaurar a conectividade fluvial de 7,7 km de rio que, por sua vez, vai impulsionar a conservação das populações de peixes e de várias espécies de aves ribeirinhas e mamíferos icónicos, como a lontra e o endémico e ameaçado lince ibérico”, pode ler-se no mesmo comunciado.
De acordo com a ANP|WWF, a remoção terá também “vantagens socioeconómicas”, incluindo a “dinamização das atividades de turismo rural”, bem como “benefícios para os pescadores, pois o restauro da continuidade fluvial permite condições ecológicas mais saudáveis para as populações de peixes com elevado valor económico”.
A remoção da barreira levará cerca de um mês, seguida da recuperação dos ecossistemas ribeirinhos naturais, incluindo as margens do rio e as galerias ripícolas. Este processo de recuperação natural será monitorizado uma vez a cada três meses, durante o período de um ano.
“Não fazia qualquer sentido manter no nosso município uma barreira fluvial que nunca serviu o seu propósito nem nunca trouxe benefícios para a população. Tivemos o cuidado de sensibilizar a população local para este projeto, de forma a perceberem os benefícios resultantes da remoção deste açude para a região”, declara Paulo Paulino, vice-presidente da Câmara Municipal de Alcoutim.
Já Jack Foxall, diretor executivo da EORP, afirma que “é com grande satisfação que o Open Rivers Programme apoia a primeira remoção de uma barreira fluvial por uma entidade da sociedade civil em Portugal. Esta remoção vai permitir não só libertar cerca de 8 quilómetros de habitat muito necessário para espécies locais de água doce ameaçadas, mas também vai inspirar e abrir caminho para outras remoções na bacia hidrográfica, impulsionando o movimento de remoção de barragens em Portugal”.
Portugal acolhe este ano o 7º Seminário Dam Removal Europe, onde estarão presentes vários especialistas europeus que vão apresentar casos de sucesso de remoção de barragens por toda a Europa, bem como boas práticas, os melhores métodos, custos e benefícios.
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