Em Espanha, as empresas de tabaco passam a ser responsáveis pela recolha de betas no chão. Esta medida vigora desde a passada sexta-feira, 6 de janeiro. A Ambiente Magazine quis saber, junto da ALU – Associação Limpeza Urbana, a sua posição face a esta medida e como se encontra Portugal nesta matéria.
Tal como em Espanha, em Portugal, as tabaqueiras também vão ser responsabilizadas pelos custos da limpeza urbana, associados à recolha de resíduos do tabaco. “As autarquias continuarão a fazer a limpeza urbana. O que este decreto prevê é que as tabaqueiras assumam os custos dessas operações, o que em teoria faz todo o sentido”, defende Luís Capão, presidente da ALU, acrescentando que a legislação entrou em vigor no início de janeiro de 2023.
Defensor desta medida, o responsável considera que “os artigos que são postos à venda no mercado sejam desenhados sob o ponto de vista do ecodesign e da economia circular”, implicando “pensa, não apenas no ciclo de vida de uso” como também “no que acontece aos produtos depois de serem usados”. Ao serem responsabilizadas pelos custos de fim de vida, “é natural que as empresas tenham mais atenção à forma como os utilizadores dos seus produtos os descartam e, daí, venham medidas de inovação material, de prevenção e, posteriormente, de compensação da pegada ecológica e dos custos nas cidades com a limpeza”, acrescenta.
Relativamente ao impacto das beatas, Luís Capão refere o Programa de Monitorização do Lixo Marinho em praias, da responsabilidade da Agência Portuguesa do Ambiente, como sendo um bom indicador de medição de tal impacto: “Em 2021, as beatas e os filtros de cigarro representaram 10% do lixo encontrado”.
Ao nível da fração das betas no setor dos resíduos, o presidente da ALU refere que o estudo realizado em parceria com a Electrão, revela que na Limpeza Urbana das cidades monitorizadas, os resíduos definidos como Plásticos de Uso Único são 6% do total encontrado tanto em papeleiras como nas operações de varredura: “Estamos a falar de cotonetes, palhinhas, toalhetes, artes de pesca, balões, copos, e os subprodutos do tabaco. Se isolarmos estes, beatas e os filtros representam 0,7% do peso total apurado”. Este estudo é também interessante para perceber que “os materiais que já estavam contemplados no SIGRE, como embalagens de plástico, alumínio e vidro, têm mais do triplo do peso do que aquele recolhido em PPUU”. Contudo, “o custo da limpeza de beatas no chão não é necessariamente mais baixo do que de materiais com mais peso”, indica o responsável, destacando que, “enquanto todos estes valores não forem contemplados a Limpeza Urbana vai continuar a ser subfinanciada”.
“Sem uma mensagem unívoca, será difícil que a prevenção funcione”
Apesar de já ter entrado em vigor em Portugal e Espanha, Luís Capão refere que em nenhum dos dois países está para já estabelecida a forma como a transferência dos valores será feita: “O que sabemos do decreto de lei português é que será a APA a estabelecer esse valor”. A Associação Limpeza Urbana vê assim com bons olhos a “responsabilidade do produtor ser alargada a todos os fluxos que se possam identificar”, de forma que “toda a sociedade possa efetivamente contribuir para a redução dos resíduos que produz para a correta deposição e a sua valorização”, precisa.
Em matéria de custos associados à limpeza urbana, “a ALU está muito empenhada em ajudar a desenhar a metodologia, que pode passar pela análise fina e monitorização da evolução dos resíduos recolhidos em operações de Limpeza Urbana”, bem como pela “quota de mercado de cada produtor”. Por isso, integram um grupo de peritos em resíduos da Comissão Europeia para “definir o custo e a aplicação da lei, da forma mais justa e eficaz”, sucinta. Luís Capão defende que deve ser fixado um valor por habitante, um rácio por meios e trabalhadores alocados à Limpeza Urbana em cada concelho e uma componente relacionada com a forma como o espaço público é utilizado: “Uma escola ou uma zona de bares têm um impacto diferente nos custos da Limpeza Urbana do que uma zona residencial de baixa densidade”, exemplifica.
Para o presidente da ALU, o mais importante desta medida é que o potencial da sua aplicação na prevenção de resíduos é enorme: “Se a prevenção funcionar e deixarmos de ter beatas no chão, rapidamente as tabaqueiras deixam de ter esse custo extra associado”. Por isso, “é essencial disponibilizar métricas e ferramentas iguais para todo o território, de forma a compensar criteriosamente o trabalho que é feito pelas autarquias e não onerar quem consegue garantir que os resíduos dos seus produtos em fim de vida são bem encaminhados para a valorização”, reforça Luís Capão, dando nota que “sem uma mensagem unívoca, será difícil que a prevenção funcione, pelo que nos parece essencial a definição do papel da Entidade Gestora para este fluxo”.
Para que os resíduos das beatas deixem de ser um problema, Luís Capão acredita que a Responsabilidade Alargada do Produtor de produtos do tabaco vai permitir “avaliar, monitorizar e encontrar as melhores medidas para resolver progressivamente” tal questão.