A Zero efetuou um diagnóstico ao modelo económico e à gestão das empresas Lipor, que agrega oito municípios do Grande Porto, e Valorsul, que junta 19 municípios de Lisboa Norte, e verificou que os cidadãos das outras regiões, incluindo mais pobres do país, estão a pagar mais 20 milhões de euros por ano na sua eletricidade, para que o tratamento de resíduos nas regiões mais desenvolvidas fique mais barato.
Tendo por base uma mistificação que tarda em ser desconstruída, a produção de energia com recurso à incineração de resíduos sólidos urbanos (RSU) é financiada pelos consumidores de eletricidade residenciais como se fosse renovável, gerando perversidades que necessitam de ser corrigidas no futuro.
O negócio da energia “verde”
Considerando os dados dos relatórios de contas das duas empresas – as únicas que em Portugal continental eliminam RSU através da incineração – a Zero constatou que a subsidiação da energia representa uma parte muito importante das receitas, estimando-se que a Lipor tenham beneficiado, injustamente, do apoio involuntário dos consumidores portugueses de 8,5 milhões euros e a Valorsul de 19,4 milhões de euros.
De salientar que as duas centrais beneficiam, há muito, do favorecimento do Estado Português para que esta produção de energia seja considerada renovável, mas a verdade é que as mesmas queimam anualmente mais de um milhão de toneladas, ou seja, 22% do total dos RSU produzidos em Portugal – grande parte dos quais poderiam ser reciclados – poluindo a atmosfera com mais de 750 mil toneladas de dióxido de carbono em 2016.
No caso da Valorsul, para além da dependência financeira da produção de energia subsidiada com recurso à incineração ser muito significativa, rondando os 50%, a empresa beneficia ainda das insuficiências operacionais da Tratolixo. Esta empresa encaminha cerca de 159 mil toneladas – 38% dos resíduos produzidos nos municípios de Cascais, Mafra, Oeiras e Sintra – para incineração, sem que isso contribua para resolver um passivo acumulado de 167 milhões de euros. No que respeita à Lipor, a situação financeira a prazo também parece preocupante, apresentando um passivo de 149 milhões de euros.
O mito da sustentabilidade dos sistemas que recorrem à incineração
Acresce que estas empresas beneficiam ainda de uma redução anual da Taxa de Gestão de Resíduos (TGR) na ordem dos 4,6 milhões de euros, quando não existem razões objetivas para que a incineração pague apenas um quarto do que paga a deposição em aterro.
Um outro aspeto que prova que a queima de lixo não é “amiga” da reciclagem são os fracos desempenhos de ambas as empresas, atingindo-se apenas 28% de preparação para a reciclagem. Porém, a situação poderia ser ainda mais delicada se a Lipor não fosse ajudada e financiada pela colaboração exemplar dos 135.748 cidadãos do Município da Maia que, através de um eficaz sistema de recolha porta-a-porta, são responsáveis pelo encaminhamento de 24% dos recicláveis de todo o sistema.
De referir que o Governo estabeleceu metas de reciclagem para 2020 de apenas 42% para a Valorsul e de 35% para a Lipor, enquanto que para muitas regiões do interior fixou uma meta de 80%(5).