O montado de sobro é um dos ecossistemas mais ricos do mundo e Portugal tem a maior área a nível mundial (concentra 34% da área mundial, num total de 736 mil hectares que correspondem a 23% da floresta nacional). Contudo, devido às alterações climáticas e às más práticas agrícolas que enfraquecem o sobreiro até o levar à morte, o montado está em declínio. Para dar resposta a esta realidade, nasce o projeto “Histórias à Sombra do Montado” que recorre à banda desenhada para homenagear o montado do sobro e sensibilizar a população de Odemira para o declínio das florestas de sobreiros. Em entrevista à Ambiente Magazine, Hugo Tornelo, diretor criativo independente e um dos criadores do projeto, explica-nos o que esteve na origem do “Histórias à Sombra do Montado”.
“Trata-se de um conjunto de bandas desenhadas que constituem uma homenagem ao montado do sobro: símbolo da paisagem alentejana”, começa por afirmar o criativo, acrescentando que, “o projeto contempla a publicação de quatro bandas desenhadas, criadas a partir de quatro histórias escritas por um conjunto de autores, e cujo elemento unificador é o sobreiro”. Estas bandas desenhadas serão distribuídas no concelho de Odemira, destinando-se à população residente com mais de 10 anos: “Queremos reforçar a relação entre esta população e o montado de sobro e partilhar conhecimento tanto com os trabalhadores e proprietários agrícolas, sobre boas práticas a adotar para reverter o declínio do montado de sobro, como com a população mais jovem, através das escolas e de atividades em contexto de sala de aula”.
Através destas histórias, o objetivo é “homenagear o montado alentejano”, devido à importância que tem a nível ambiental, social, e económico para a região: “Queremos realçar a importância do património natural do sobreiro e do montado de sobro, perpetuando a história da terra e do território enquanto identidade, cultura e economia social do Alentejo, em particular no concelho de Odemira”. Através das bandas desenhadas, pretende-se, igualmente, “gerar sentimentos de identidade e pertença” e, assim, contribuir para a “preservação de tradições e costumes”. Simultaneamente, o projeto visa sensibilizar para a importância da “preservação do montado de sobro” por se tratar de um “ecossistema exemplar no equilíbrio entre a conservação da natureza e o desenvolvimento económico e social”, sustenta.
A opção de ilustrar as histórias através da banda desenhada prende-se com o facto de ser um “recurso apelativo a miúdos e graúdos”, independentemente do seu grau de escolaridade: “Este estilo permite que as narrativas sejam simples e que a linguagem seja acessível”.
Na origem do “declínio” do sobro de Odemira, Hugo Tornelo confirma, segundo a investigação, que há um complexo de fatores, muitos deles originados pela “ação humana, como a má gestão realizada em algumas propriedades”, sendo as “condições ecológicas um fator determinante no desencadear da situação, como o stress hídrico provocado por períodos de seca ou pluviosidade anormal que pode favorecer a propagação de doenças”. Um destes principais problemas na gestão dos montados são as “más práticas agrícolas”, nomeadamente o “recurso à gradagem”, que consiste na “etapa de preparação do solo para cultivo agrícola posterior à passagem do arado: a utilização das grades de discos sobre o solo serve para aplanar a superfície ou para afofar a terra”. Assim, a gradagem que é feita “debaixo das copas dos sobreiros com grades de discos pesados corta as raízes superficiais”, podendo fazer “propagar doenças como os fungos patogénicos”, explica o responsável, acrescentando que “a técnica impede, ainda, que novos sobreiros nasçam sob coberto do montado, comprometendo a sua renovação e perenidade”. Já as podas excessivas provocam “feridas nos troncos que funcionam como portas de entrada para doenças e pragas”, sem que exista um particular interesse dessa atividade na gestão dos montados, que não seja a “obtenção de lenha”, atenta.
No que às soluções dizem respeito, o responsável indica que já estão identificadas muitas medidas para minimizar o declínio e recuperar a vitalidade do montado, nomeadamente, uma alteração de comportamentos na gestão dos mesmos: “No final das nossas bandas desenhadas deixamos também algumas boas práticas agrícolas que podem ser implementadas e que contribuem para travar a degradação do Montado, como por exemplo: construir barragens ou charcas (devidamente licenciadas) para armazenamento de água da chuva e evitar lavrar o solo para aumentar a absorção de a infiltração de água e permitindo a proteção do solo; criar pastagens permanentes biodiversas, para tornar o solo mais rico e fértil; ou aplicar o pastoreio rotativo para melhorar a produtividade do solo”.
Para além do objetivo de reforçar o “sentimento de identidade e pertença da população relativamente ao montado de sobro”, o projeto “Histórias à Sombra do Montado” quer afirmar-se como um “veículo informal de disseminação de boas práticas de gestão do montado”, conclui.
O projeto conta com o financiamento do programa Garantir Cultura e com o envolvimento da Câmara Municipal de Odemira e do projeto Life Montado-Adapt. 3.