Portugal registou um dos episódios mais graves de poluição do ar de 6 a 17 de outubro, conjugando meteorologia, partículas do norte de África e incêndios, com ultrapassagens dos limites em várias regiões, segundo o especialista Francisco Ferreira. “Este, ao nível de Portugal, é capaz de ter sido um dos episódios mais graves em termos de poluição, envolvendo diferentes poluentes e diferentes causas”, disse à agência Lusa Francisco Ferreira, do Centro de Investigação em Ambiente e Sustentabilidade (CENSE) da FCT-NOVA (Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova).
No verão, é normal assistir-se a ultrapassagens do limiar de informação do ozono e ter concentrações elevadas de partículas vindas do norte de África. Mas “haver ultrapassagens do dióxido de azoto, algumas ultrapassagens do limiar de informação do ozono e concentrações de partículas elevadíssimas, por razões naturais e por razões que legalmente não são consideradas naturais – os incêndios -, foi um caso, não direi único, mas extremamente improvável e grave para a saúde pública e para o ambiente”, resumiu o especialista em qualidade do ar e também líder da associação ambientalista Zero.
Francisco Ferreira falou de uma semana “muito complicada do ponto de vista meteorológico”, com vento fraco, influência de partículas vindas do norte de África, temperaturas muito elevadas e “a altura da camada de mistura” relativamente reduzida em algumas zonas, impedindo a mistura de poluentes.
Por isso, o investigador do CENSE salienta que os problemas já eram graves antes dos incêndios, principalmente na zona de Lisboa, e em poucos dias foi ultrapassado o limite de horas permitido pela legislação no que respeita ao dióxido de azoto.
Foram também registadas em algumas zonas do país, devido à elevada temperatura, ultrapassagens do ozono, algumas delas em horas “muito pouco prováveis, como foi o caso da zona de Sintra”, Mem Martins, que aconteceu durante a noite.
Entretanto, surgem os incêndios, principalmente a 15 de outubro, que provocaram mais de 40 mortos e destruíram vastas áreas de floresta, casas e unidades industriais, levando a que, em determinadas zonas do país, fossem atingidas “médias praticamente recorde” de poluentes ao longo do dia.
Francisco Ferreira exemplifica com as concentrações de mais de 200 microgramas por metro cúbico de média diária quando o valor limite é 50, situação que se “nota muito bem de domingo para segunda” (de 15 para 16 de outubro).
No dia 16 de outubro, a região centro atingiu o nível ‘mau’, o pior do índice de qualidade do ar, devido aos incêndios, e registou-se uma ultrapassagem ao limite diário de partículas em todo o país.
O ar cheio de fumo acabou por ser transportado para o norte de Espanha e até Inglaterra, devido ao furacão Ophelia.
Antes, dia 10 de outubro, foram sete as ultrapassagens verificadas – de ozono, de dióxido de azoto, enquanto as partículas estavam elevadas em todo o país, mesmo em áreas mais distantes, como Fundão.
Francisco Ferreira insistiu que, no caso dos incêndios, com zonas “fortemente afetadas com concentrações absolutamente brutais, com consequências para as pessoas mais debilitadas, crianças, idosos”, e das partículas do norte de África, não é possível tomar medidas preventivas. Mas, acrescentou, quando se trata do dióxido de azoto, “temos a obrigação de tomar medidas” e Bruxelas, Paris, Madrid ou Londres têm planos ativados e medidas implementadas para impedir essas ultrapassagens.
Em Lisboa isso não acontece, e nos vários dias com a mesma situação meteorológica de ultrapassagens ao final da tarde, em zonas de maior tráfego, “limitamo-nos a um aviso da Direção-Geral de Saúde e não a tomar medidas de forte redução de tráfego e permitir uma utilização mais facilitada dos transportes públicos”, defendeu.