Arrancou esta terça-feira o estudo “Biodiversidade 2030: contributos para a abordagem Portuguesa para o período pós-metas de Aichi” em Lisboa, numa cerimónia presidida pelo Ministério do Ambiente e da Ação Climática.
Aos jornalistas, o professor da Universidade de Évora e coordenador deste estudo, Miguel Araújo, revela que desde 1992, aquando da Conferência das Nações Unidas para o Ambiente em que se assinou a Convenção para a Biodiversidade Biológica, têm vindo a ser proclamadas metas sequenciais, onde de cada vez que passa o prazo, conclui-se que não foram cumpridas: “A biodiversidade foi um parâmetro pobre da política de ambiente”.
Este novo estudo tem um horizonte de dois anos: “Pretende auxiliar a formação de políticas nacionais na área da conservação da biodiversidade”, explica o responsável, dando conta dos cinco eixos em que o estudo se centra. O primeiro – Biodiversidade e Clima – tem com foco “proporcionar um conjunto de medidas que deviam ser aplicadas para facilitar a adaptação da biodiversidade às alterações climáticas”, refere, dando como exemplo “a definição de áreas de conectividade entre áreas protegidas e Rede Natura 2000”, facilitando a “dispersão de espécies, quando seja necessário”. O segundo e o terceiro eixos – Biodiversidade e Território e Biodiversidade e Áreas Interiores – pretendem fazer uma “análise crítica dos instrumentos do ordenamento do território com vista à adequação de medidas que existam hoje, no sentido de “dar mais dinamismo e flexibilidade aos instrumentos”, permitindo “um encaixe da adaptação climática da biodiversidade”, explica. O quarto – Biodiversidade e Oceanos – vai identificar “30% da zona económica exclusiva portuguesa do oceano que poderia ser classificada como área protegida marinha para preservar a biodiversidade marinha”. Segundo o docente, esta medida está em “linha com os objetivos europeus para a Biodiversidade: preservar 30% da Europa”. O quinto e último eixo – Biodiversidade e Pessoas – centra-se na ideia de que “não se pode pensar em biodiversidade descontextualizada das necessidades das pessoas”, isto é, “encontrar formas de incentivar a gestão do ecossistema para a biodiversidade”, propondo “um conjunto de mecanismos”, tanto a privados como a públicos, para “remunerar quem contribua para preservar a biodiversidade”. Neste último eixo, Miguel Araújo declara que “estragar a biodiversidade é muito barato” pelo que “propomos tornar mais caro estragar”, originando duas consequências possíveis: “Ao ser mais caro, as pessoas deixam de o fazer e, se o fizerem, terão de pagar” por tal ação. “Ao pagarem, esse dinheiro servirá para remunerar quem cria biodiversidade e quem está na linha da frente”, diz o responsável, dando como exemplo “os agentes que trabalham no território ou os agricultores”. Pretende-se assim que a “remuneração” seja de forma “consistente” e através de “mecanismos privados que não sejam dependentes do orçamento de Estado”, acrescenta.
Embora “não sejam ideias inovadoras”, o professor da Universidade de Évora considera que são “ações pioneiras” que têm de ser “reequacionadas e pensadas para o caso português e, eventualmente, europeu”.
“Olhar para o que se está a fazer e fazer melhor”
Em matérias de Biodiversidade, não restam dúvidas de que há muito para fazer. E, de acordo com o “Living Planet Report 2020”, aquelas que são as “ameaças primordiais para a biodiversidade” prendem-se com a “transformação do espaço natural em espaço rural (agrícola)” e a “sobreutilização de recursos pesqueiros”. Segundo Miguel Araújo, estas ameaças dizem respeito à “obtenção de alimentos”, sendo uma das “grandes fontes de ameaça para a biodiversidade”, pelo que é crucial “encontrar um equilíbrio” e “grande parte das ações em termos de remuneração dos serviços de ecossistemas estarão alinhadas para este tipo de intervenções” no setor primário.
Face ao cenário traçado, Miguel Araújo deposita toda a esperança neste estudo: “Que seja o ponta de lança para propor novas iniciativas e olhar para o que se está a fazer e fazer melhor”. Embora haja uma maior consciencialização sobre as “alterações climáticas” e mesmo da “biodiversidade”, o professor vinca que “não há nenhum país no mundo que tenha uma Política de Adaptação da Biodiversidade às Alterações Climáticas”, acreditando que, “se as ideias (do estudo) forem a bom porto”, Portugal pode ser um dos primeiros países a avançar com medidas concretas” nesta área. Para Miguel Araújo, este é o “momento de viragem” mas também “há a consciência de que estamos a degradar o nosso património natural a um ritmo nunca antes visto” e com “consequências irreversíveis” para o planeta: “Este é um tema que não deve ser apenas uma nota de rodapé na política e que tem de ser levado a sério”.
Miguel Araújo é investigador da Universidade de Évora e coordenador deste projeto, que conta com quatro coordenadores: Maria do Rosário Oliveira, do Instituto de Ciências Sociais; Isabel Sousa Pinto, da Universidade do Porto, Emanuel Gonçalves, da Fundação Oceano Azul e do ISPA (Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida); e Cristina Marta Pedroso, do Instituto Superior Técnico.
O Plano Estratégico de Biodiversidade para o período de 2011 a 2020 foi aprovado em 2010 na 10ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-10), realizada na cidade de Nagoya, Província de Aichi, no Japão. Denominadas por “Metas de Aichi para a Biodiversidade”, todas estavam voltadas para para a redução da perda da biodiversidade a nível global.