Realizou-se esta terça-feira, no âmbito da iniciativa Lisboa Capital Verde 2020, a conferência “Lisboa mais verde e mais saudável: os desafios da poluição atmosférica”. Esta sessão teve como foco efetuar um diagnóstico da cidade ao nível das políticas ambientais, dando ênfase à ligação que têm com a qualidade do ar / poluição atmosférica.
Foi precisamente para falar sobre “A qualidade do ar que respiramos: Políticas Nacionais” que Dília Jardim, chefe de unidade da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) lançou a questão inicial: “Porquê que a qualidade do ar importa?”
A verdade é que, declara a responsável, o ser humano consegue passar vários dias sem comida, algumas horas sem água mas poucos minutos sem ar: “Respira-se o equivalente, em média, 14 kg de ar por dia”. Posto isto, e recorrendo a vários estudos e análises, a engenheira alerta que a “poluição do ar” tem um “forte impacto na saúde”, “danifica os ecossistemas” e é “um forçador nas alterações climáticas”. No entanto, é já notório que, desde a década de 80, muita coisa se tem feito: “Temos políticas do ar que têm sido eficazes em alguns poluentes”, reconhece, dando como exemplo, o “dióxido de enxofre” e o “chumbo”. Mesmo assim, constata a responsável, continuam a “persistir problemas de qualidade do ar” com efeitos na saúde e, principalmente, em meios urbanos: “Nem sempre as medidas de redução na fonte conseguiram traduzir-se na melhoria da qualidade no ar”. Tais preocupações, diz Dília Jardim, originaram uma “abordagem nova” em que, numa “forma holística se tentou enquadrar o problema com outras políticas” e, assim, “avaliar num contexto de circularidade e de inovação” como se deveriam “desenhar as políticas do ar”. Foi então que, em 2018, surgiu a primeira Estratégia Nacional para o Ar (ENAR): “Tem como visão melhorar a qualidade do ar com vista a proteção da saúde humana, da qualidade de vida dos cidadãos e preservação dos ecossistemas”, refere.
[blockquote style=”2″]Políticas de clima têm co-benefícios para a qualidade de ar[/blockquote]
Com o aproximar do final do ano, o cumprimento dos objetivos da ENAR relativos à “emissão e qualidade do ar” é algo que é desejado. No entanto, a responsável frisa que “todas as conclusões terão que ter um grau de incerteza associada”, devido à crise pandémica provocada pela Covid-19. Outro dos objetivos integrados na ENAR passa por delinear o caminho para serem atingidos a longo-prazo os valores recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS): “Este continua a ser um objetivo que teremos que lutar”, sustenta. Algo que, segundo a engenheira, continua a ser válido é também “alinhar medidas com a política climática” que incidam, simultaneamente, nos “poluentes atmosféricos e nos gases com efeitos de estufa”. Efetivamente, reforça Dília Jardim, as “políticas de clima têm co-benefícios para a qualidade de ar”, sendo essencial, “alinhar as políticas, reforçá-las e assumi-las que a longo prazo têm efeito no clima” mas, também, “no curto-prazo têm efeito no nosso dia-a-dia e na saúde”.
A responsável quis destacar que a ENAR 2020 foi, assim, o primeiro “instrumento enquadrador” numa abordagem que “não pode e não deve descurar” os diferentes âmbitos de atuação: “Não se consegue fazer uma política se não se conseguir encontrar os diferentes eixos de atuação com medidas específicas para as diferentes situações que ocorrem no país”. Ainda dentro das políticas nacionais, Dília Jardim recordou os planos integrados no quadro político e que estão em curso, como o “Roteiro para a Neutralidade Carbónica” ou o “Plano Nacioanl de Energia e Clima”. Também vincou a importância da “monitorização” e da “revisão” da ENAR 2020, os “tetos de emissão nacionais” que foram revistos e que, atualmente, têm valores para cumprir muito mais exigentes até 2030, abrangendo mais poluentes e, ainda, o “cumprimento dos valores de qualidade do ar legislados pela OMS a longo-prazo”.
Já sobre o novo Plano Nacional de Controlo da Poluição Atmosférica 2030, a responsável prevê que, em breve, será colocado em consulta pública: “Deve ser o enquadrador para os planos de melhoria de qualidade do ar e que fazem a triagem das medidas globais para aquelas que se adequam melhor à sua realidade”. Além disso, acrescenta a engenheira, deve “ interligar-se com outras políticas públicas em curso” dando como exemplo, “a estratégia de longo-prazo para renovação dos edifícios” ou o “plano para a agricultura”.
[blockquote style=”2″]Refletir e repensar os nossos comportamento e ação[/blockquote]
Relativamente ao atual sistema que licencia as “indústrias”, a responsável espera que, no futuro, seja um “repositório de informação das emissões”, à semelhança do que já existe para a qualidade do ar: “QualAr”. Trata-se de uma aplicação que, segundo Dília Jardim, permite “conhecer a qualidade do ar que respiramos”, sendo uma “poderosa ferramenta de informação” e de “auxílio” para muitos investigadores e sociedade no geral. Outra valia desta ferramenta é, que, diariamente é fornecida “informação ao público sobre o índice da qualidade do ar”, com a “intenção” de que “as pessoas se habituem a planear as suas atividades ao ar livre” e as “suas deslocações” em função do que vai ser no “dia seguinte a qualidade do ar”, acrescenta.
Em notas finais, Dília Jardim quis chamar a atenção para ligação entre o tráfego e a qualidade do ar, dando conta que, o estado de emergência, originado pela pandemia da Covid-19, teve um “impacto significativo” na percentagem de redução de emissões: “Lisboa reduziu em 79% as emissões; Coimbra reduziu em 66%; o Porto em 62% e Setúbal em 37%”. Com estes números, a responsável sublinha que a “situação excecional” mostrou aquilo que a sociedade já sabia na teoria, como a “possibilidade de equacionar outras formas de estar: o teletrabalho” ou o “incremento dos serviços online que vieram para ficar: compras online e take-away”. Em suma: “No meio desta situação temos motivos para refletir e repensar os nossos comportamento e ação”, remata.