Perigo elevado de fogo em Monchique deve-se aos eucaliptais existentes
A Quercus considera preocupante a falta de controlo do fogo na Serra de Monchique e áreas envolventes, manifestando-se solidária com os feridos e populações residentes nesta área. “A perigosidade elevada deste incêndio, em parte deve-se ao acumular de manta morta e ao comportamento do fogo nos povoamentos de eucalipto existentes”, com projeções de partículas incandescentes a vários quilómetros, provocando focos secundários que dispersam os meios de combate e reduzem a sua eficácia, lê-se no comunicado da associação ambiental.
Uma grande parte da área afetada pelo fogo na Serra de Monchique integra o Sítio de Importância Comunitária – Monchique, da Rede Natura 2000, pelo que deverá existir uma atenção especial na contenção do fogo, com vigilância no perímetro para evitar reacendimentos.
Destaca-se neste Sítio da Rede Natura 2000, a ocorrência do habitat prioritário de adelfeirais, no fundo dos vales, e também os medronhais e sobreirais nas encostas. Monchique é o único sítio em Portugal, onde ocorrem os carvalhais ibéricos de Quercus faginea e Quercus canariensis. O carvalho-de-monchique Quercus canariensis é uma árvore muito rara, pelo que é considerada uma relíquia da nossa floresta autóctone, existindo apenas alguns exemplares em Monchique.
Monchique também integra uma Zona de Proteção Especial da Rede Natura 2000 para as aves selvagens, sendo que as serras algarvias abrigam parte importante da população da águia-perdigueira, também conhecida por águia-de-Bonelli Aquila fasciata, a qual está classificada Em Perigo, de extinção.
O Plano Setorial da Rede Natura 2000, para o Sítio de Monchique destaca como fatores da ameaça “Florestação intensiva com espécies exóticas; incêndios florestais; destruição de vegetação autóctone (matos, bosques mediterrânicos e vegetação ribeirinha)”. As orientações de gestão são dirigidas prioritariamente para a reconversão de povoamentos florestais de espécies exóticas, de modo a restabelecer povoamentos de folhosas autóctones ou povoamentos mistos, mais favoráveis à conservação dos valores naturais.
Quercus exige reordenamento e gestão florestal
Com base nos dados do Inventário Florestal Nacional, em 2010, a área de eucalipto no Algarve estava próxima dos 30.000 hectares, a grande maioria na Serra de Monchique e envolventes, tendo esta monocultura aumentado nos últimos anos nesta região, à semelhança do restante território nacional. Em Monchique, o eucalipto é a árvore dominante, com 13.888 hectares (72,4%) da área florestal do concelho, seguido pelo medronheiro com 4.679 hectares e pelo do sobreiro com 2.210 hectares.
A proposta de revisão do Programa Regional de Ordenamento Florestal do Algarve, propunha a manutenção/redução de 1% da área de eucaliptal na região no ano de 2050, situação que a Quercus considera muito pouco ambiciosa, ao contrariar a legislação aprovada pela Assembleia da República. A Quercus entende que que esta redução deveria ser no mínimo de 10% ou superior, no sentido de promover o ordenamento florestal com descontinuidades e povoamentos mais resilientes ao fogo. O Programa Regional de Ordenamento Florestal do Algarve esteve recentemente em consulta pública, mas aguarda publicação, esperando-se que tenham existido alterações significativas com vista ao ordenamento da floresta e do território.
Considerando os cenários para as alterações climáticas, as simulações do projeto SIAMII indicam uma perda de produtividade potencial do eucalipto de cerca entre 25% – 50%, na área do PROF Algarve.
Os estudos referem que os grandes incêndios do verão de 2003 alteraram drasticamente a paisagem da serra de Monchique e envolventes e “se no futuro próximo não forem desenvolvidas ações de vulto, o padrão da paisagem permanecerá (as manchas de matos e os eucaliptais voltarão a cobrir totalmente os terrenos passados três ou quatro anos)”. As políticas públicas não têm apostado na floresta autóctone, mantendo o problema da falta de ordenamento e gestão florestal.
É importante recordar que o ciclo de incêndios é recorrente na serra de Monchique. Em agosto de 2003, arderam 41 mil hectares e atualmente já arderam mais de 20 mil hectares, sem que o incêndio tenha ainda sido extinto.
Atualmente, o paradigma faz recair no Estado, ou seja, em todos nós, a responsabilidade e a fatura a pagar com estas tragédias, para alguns poucos lucrarem com um negócio que é insustentável para a sociedade. De acordo com uma avaliação estritamente económica, realizada em 2012 por um grupo de 21 personalidades, entre os quais um ex-Presidente da República, ex-ministros e ex-secretários de Estado, bem como por economistas e agrónomos conceituados, o país assume um custo anual com os incêndios florestais avaliado em mil milhões de euros.
A Quercus considera que depois desta fase de combate e do necessário apoio às vítimas, o País e os responsáveis políticos têm que optar pelo melhor modelo de desenvolvimento para o Algarve — ou querem uma indústria extrativa e transformadora do território, ou apostam num turismo sustentável no interior do Algarve, com paisagens mediterrânicas dominadas pelo sobreiro, medronheiro e outras folhosas autóctones, mais resilientes ao fogo e promotoras de biodiversidade e da conservação do solo, da água e da paisagem.