Pedrógão Grande: Confederação da Agricultura acusa ex-ministro Capoulas Santos de “má vontade política”
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) afirmou esta quinta-feira, no parlamento, que as ajudas aos agricultores afetados pelos incêndios em 2017 foram “desadequadas e insuficientes”, acusando o ex-ministro Capoulas Santos de “má vontade política”.
João Dinis, membro da direção da CNA, disse que “não houve só falta de vontade política da parte do ex-ministro Capoulas, houve má vontade política nesta situação, ao contrário de toda a propaganda que fez a pretexto”, referindo-se aos apoios aos agricultores afetados pelos incêndios em 2017, em que as regras das candidaturas foram alteradas a meio do processo, excluindo “milhares” de candidatos.
Numa audição na comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à atuação do Estado na atribuição de apoios na sequência dos incêndios de 2017 na zona do Pinhal Interior, o dirigente da CNA criticou a atuação do Governo por, “sucessivamente em catadupa”, ter anunciado programas com “apoios de centenas de milhões de euros públicos para investir”, designadamente dos Programas de Desenvolvimento Rural PRODER e PDR 2020, na estabilização dos solos, na reflorestação e na reposição do potencial produtivo. “Mas nasceram muito poucas árvores de todos esses programas, à exceção do eucalipto que continua a ser – e de longe – a espécie mais plantada”, avançou João Dinis.
Entre as medidas adotadas na sequência dos incêndios de 2017, o representante do setor agrícola destacou a “municipalização das políticas florestais”, com a reforma da floresta, liderada pelo ex-ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural Capoulas Santos, que a promoveu como “a maior reforma florestal desde D. Dinis”. “Será a maior das pequenas reformas já feitas na nossa floresta”, perspetivou João Dinis, considerando que o setor já tem “resmas” de legislação.
Em relação ao cadastro simplificado, o dirigente da CNA sublinhou que não é possível fazer um cadastro efetivo sem ir ao terreno, contestando que este possa ser um processo de “atentado ao direito de propriedade”.
Sobre o processo de reflorestação, “dos 400 e tal mil hectares ardidos, 200 e tal mil povoamentos ardidos em 2017, nem 10% foi reflorestado, as áreas afetadas por incêndios continuam sem árvores”, apontou o dirigente da CNA, alertando que as áreas ardidas estão a transformar-se em matos e silvados que podem “arder como pólvora”.
Relativamente aos apoios, João Dinis criticou a burocracia que eliminou a possibilidade de acesso a “milhares de agricultores”, classificando as ajudas como “desadequadas e insuficientes”.
Questionado se houve desigualdade de tratamento na atribuição dos apoios, o dirigente da CNA disse que “houve questões iminentemente práticas”, explicando que nos incêndios de junho em Pedrógão Grande a atribuição do apoio foi simplificada, mas em outubro de 2017 as regras foram alteradas e “criaram-se diferenças na desgraça”, contabilizando 15 mil agricultores excluídos do apoio.
Quanto aos 20 parques para receção de madeira queimada, o representante do setor agrícola classificou de “fiasco”, lembrando que o Governo foi alertado para o falhanço da medida, inclusive que o preço da madeira na produção e o preço da cortiça na produção estão mais baixos do que há 30 anos. “Não há coragem política para se tocar em cinco das empresas dos grupos empresariais mais cotados na bolsa. Nas 15 mais cotadas no PSI20, cinco são derivados da floresta. Não há coragem política para se lhes tocar nos imensos privilégios, porque o preço da madeira na produção devia estar, por exemplo, indexado ao preço dos derivados no mercado”, expôs João Dinis.
Neste âmbito, a CNA defendeu como essencial na prevenção de incêndios o ordenamento florestal, o inventário florestal e o aumento dos preços da madeira na produção, frisando que a floresta perdeu interesse económico e não há pessoas nas aldeias.
O incêndio que deflagrou em 17 de junho de 2017 em Escalos Fundeiros, no concelho de Pedrógão Grande, e que alastrou depois a municípios vizinhos, nos distritos de Leiria, Coimbra e Castelo Branco, provocou 66 mortos e 253 feridos, sete deles com gravidade, e destruiu cerca de 500 casas, 261 das quais eram habitações permanentes, e 50 empresas. Já as centenas de incêndios que deflagraram no dia 15 de outubro, o pior dia de fogos de 2017 segundo as autoridades, provocaram 49 mortos e dezenas de feridos. Esta foi a segunda situação mais grave de incêndios com mortos em Portugal, depois de Pedrógão Grande.