Parques de madeira queimada apenas com 6% da capacidade utilizada
Os parques de madeira queimada armazenaram, até ao final de setembro, apenas 6% da capacidade prevista e 19 dos 30 parques de madeira não registam qualquer armazenamento, refere a associação do setor, que aponta para problemas no processo. Instabilidade da plataforma criada pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) para o registo da madeira comprada, dificuldade na obtenção de documentação comprovativa da origem e preços da madeira queimada, qualidade da madeira dos privados muito inferior à esperada e o facto de a maior parte da madeira ter sido vendida para consumo corrente antes da entrada em funcionamento dos parques são algumas das razões que têm levado ao insucesso dos parques de madeira queimada, justifica à agência Lusa o presidente da Associação das Indústrias da Madeira e do Mobiliário de Portugal (AIMMP), Vitor Poças.
Outras das razões prendem-se com a venda insuficiente da madeira das matas públicas e com o preço fixado para o valor da madeira pago à entrada dos parques, sublinha o responsável, numa resposta escrita enviada à agência Lusa.
O consórcio de 17 empresas do setor propunha-se a criar ou ampliar 30 parques de madeira queimada, com uma capacidade de armazenamento de 512 mil toneladas para madeira de serração e 569 mil toneladas de madeira de trituração. De um objetivo global de armazenamento de 1,08 milhões de toneladas, os parques apenas receberam até agora – dos dois tipos de madeira – 69 mil toneladas, cerca de 6% do compromisso assumido.
Dos 30 parques de madeira constituídos ou ampliados, 19 ainda não registaram qualquer entrada de madeira queimada, sendo que parte deles ainda não entraram em funcionamento, explica a AIMMP. “Neste mês, esperamos que entrem em funcionamento novos parques e esperamos não ter novos problemas com a plataforma informática”, referiu Vítor Poças, pedindo ainda que o valor fixado para a compra da madeira à porta do parque baixe de 46 euros para 44,60, visto que o valor fixado partia do pressuposto que se estaria a pagar a 25 euros ao produtor, mas a média situa-se nos 23,60 por tonelada.
Segundo o responsável da AIMMP, “a madeira dos privados com qualidade para serração era muito inferior à que se estimou e a maior parte já estava vendida para consumo corrente”, sendo que, à data de entrada em funcionamento dos parques, a maioria da madeira oriunda de particulares já tinha sido consumida pelas empresas, que por ano consomem cerca de 1,2 milhões de toneladas de madeira. Esta circunstância, associada à venda insuficiente da madeira das matas públicas, “atrasou todo o processo de compra, corte e armazenamento de madeira para os parques”, explica.
De acordo com Vitor Poças, a venda da madeira das matas públicas não está a decorrer nos prazos e na cadência que estavam previstos, sublinhando que as empresas continuam a aguardar pela venda dessa madeira.
O setor espera agora que o Governo, que reservou cerca de 10milhões de euros para compensar proprietários e criar os parques de madeira, utilize o valor que não seja aproveitado para este processo para investir “diretamente na floresta”, nomeadamente na plantação de pinheiro bravo.
O responsável critica ainda os despachos que interditam o abate, corte e transformação de árvores em espaços florestais em distritos com risco de incêndio durante o verão, sem exceções territoriais para as zonas que arderam durante o ano de 2017, o que também contribui para um atraso nos processos de corte.
Para o futuro, Vítor Poças tece um cenário negro para o setor face à contínua redução de madeira no país para empresas de serração, um setor “que exporta 2,4 mil milhões de euros anuais”. Os incêndios de 2017 “vieram agravar esta situação e trazer uma ameaça à sobrevivência destas empresas nos próximos anos por falta de matéria-prima”, alertou.
Já do lado dos proprietários florestais, surgem críticas quanto à especulação que se continua a sentir no terreno, bem como a ausência de parques de madeira queimada em alguns dos concelhos afetados pelos incêndios de outubro de 2017. Luís Miguel de Brito, que perdeu 70 hectares de floresta, está neste momento a vender a madeira queimada de 40 hectares de pinheiro bravo e manso, sendo que o preço que os madeireiros praticam no terreno situa-se entre os 6,5 euros a tonelada de madeira para trituração e 16,5 euros a tonelada para madeira de serração, contou.
O Governo tinha estabelecido como preço de garantia da madeira queimada ao produtor de 25 euros para serração e de 10 euros para trituração.
“Os parques de madeira não existem na região”, nota o produtor florestal de Oliveira do Hospital, considerando que o valor oferecido pelos intermediários é menor porque estão também a receber menos pela madeira na venda às empresas do setor. “Não só a qualidade faz baixar o preço, mas a madeira agora pesa menos 40% do que pesava verde. Como há muita oferta de madeira, a indústria tem jogado com a lei da oferta e da procura”, constatou Luís Miguel de Brito.
Também Nuno Pereira, proprietário florestal na zona de Tábua, refere que optou por não vender qualquer madeira queimada, tendo criado um pequeno parque onde vai armazenando as árvores cortadas. “As fábricas pagam pouco e os madeireiros pagam pouco. Se mandar cortar, o madeireiro não dá mais do que quatro euros a tonelada. Se entregar na fábrica, dão 20 a 22 euros a tonelada. Ou se entrega muito próximo, ou andamos a cortar por cortar e não há lucro”, frisou.