*Por Filipa Esperança, Sócia da AMMC Legal
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2024, de 22 de abril, aprova os Planos de Gestão dos Riscos de Inundações (PGRI) referentes ao 2.º ciclo de planeamento, que corresponde ao período temporal compreendido entre 2022 e 2027, das regiões hidrográficas do Minho e Lima, do Cávado, Ave e Leça, do Douro, do Vouga, Mondego e Lis, do Tejo e Ribeiras do Oeste, do Sado e Mira, do Guadiana e das Ribeiras do Algarve, tendo como objetivo a redução das consequências prejudiciais das inundações, a atingir através da identificação de áreas de risco potencial significativo de inundações e da elaboração da respetiva cartografia de áreas inundáveis e de risco de inundações, às quais se aplicam os programas de medidas que os PGRI especificam.
A entrada em vigor dos PGRI implica que os planos territoriais preexistentes tenham de incorporar de forma coerente e integrada as suas orientações e diretrizes, devendo a atualização dos planos territoriais preexistentes ser efetuada com recurso aos procedimentos de alteração ou revisão dos planos, nos termos dos artigos 118.º, 119.º e 124.º do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, na redação atual (RJIGT), os quais devem ser concluídos no prazo máximo de cinco anos, contados a partir da entrada em vigor da mencionada resolução, ou seja, a partir de 23 de abril de 2024.
Porém, a necessidade de atualização dos planos territoriais preexistentes não fica por aqui, pois, uma vez que, ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 51.º do RJIGT, foram também identificadas como objetivamente incompatíveis com os PGRI, enquanto programa setorial de recursos hídricos, as disposições dos planos territoriais preexistentes que o contrariam em matéria de edificabilidade e de alteração de uso, neste caso, estas disposições devem ser objeto de alteração por adaptação, conforme previsto no artigo 121.º do RJIGT, no prazo de 60 dias úteis, contados também a partir de 23 de abril de 2024.
Aliás, sublinhando a obrigatoriedade desta alteração por adaptação dos planos territoriais aos PGRI, refere a mencionada resolução que, caso este procedimento não tenha sido concluído no prazo de 60 dias úteis, as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, I. P declaram a suspensão, na área de intervenção dos PGRI, das disposições que deveriam ter sido alteradas, de acordo com o disposto no artigo 29.º do RJIGT.
Assim, os PGRI determinam ainda que os planos territoriais devam proceder à delimitação das zonas inundáveis, das zonas ameaçadas pelas cheias e das zonas ameaçadas pelo mar, ou à atualização desta delimitação, atendendo ao disposto no artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 115/2010, de 22 de outubro, o que implica igualmente alteração de plantas, enquanto elementos que constituem e/ou acompanham o Plano Diretor Municipal, nos termos do artigo 97.º do RJIGT.
Como, de acordo com a Portaria n.º 336/2019, de 26 de setembro, relativa a Orientações Estratégicas Nacionais e Regionais previstas no Regime Jurídico da Reserva Ecológica Nacional (REN), deve haver articulação entre os PGRI, enquanto fonte de informação de base das zonas ameaçadas pelas cheias, com a delimitação das tipologias da REN, coloca-se a questão de saber até que ponto os PGRI vão ou não implicar alteração na planta de condicionantes dos Planos Diretores Municipais em revisão, derivada de alguma modificação na delimitação da REN, o que pode inclusivamente afetar opções estruturais da proposta tal como concebida no âmbito destes procedimentos de revisão.
Considerando que muitos Planos Diretores Municipais se encontram já em avançado estado de revisão para cumprir as regras de classificação do solo estabelecidas na Lei de Bases da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, (LBPPSOTU) e densificadas no RJIGT, até 31 de dezembro de 2024, esta obrigatoriedade de alteração por adaptação dos planos territoriais aos PGRI no prazo de 60 dias úteis vem necessariamente criar entropias nestes procedimentos que se encontravam já praticamente fechados, depois de percorridas várias fases demoradas e complexas, deixando em aberto para quando será efetiva a conclusão destes procedimentos. O sentido da evolução destes processos é, com efeito, uma incógnita, considerando a anunciada alteração da Lei dos Solos no âmbito da “Nova Estratégia para a Habitação”. Num ano, marcado pelos grandes desafios da implementação do Simplex Urbanístico, afigura-se interminável o procedimento de revisão dos planos diretores municipais.