Por, Jaime Melo Baptista, presidente da LIS-Water – Lisbon International Centre for Water Investigador-Coordenador do LNEC
As crises como a atual pandemia impõem reflexão, redefinição de prioridades e readaptação dos modelos tradicionais, criando novas oportunidades. Vamos identificar algumas delas nos serviços de águas. Temos que aproveitar esta oportunidade para reafirmar a importância política dos serviços de águas, enquanto fator de proteção da saúde pública. Felizmente em Portugal estes serviços são parte da solução da pandemia, e não parte do problema. Talvez não estejam na linha da frente do combate, mas estão na linha de apoio a todos os da frente, como médicos e enfermeiros. É, pois, oportuno um renovado compromisso político, com redefinição de uma estratégia nacional afirmativa.
[blockquote style=”2″]Reafirmar a importância política dos serviços de águas, enquanto fator de proteção da saúde pública.[/blockquote]
Devemos continuar o investimento em infraestruturas, estando atentos à melhoria no acesso a estes serviços, à necessidade de melhoria da qualidade e, muito especialmente, ao aumento da sua resiliência.
Devemos ter uma visão mais alargada destes serviços. A atual pandemia dá um sinal claro da necessidade de boas instalações sanitárias, domiciliárias e em espaços públicos, facilitando a higiene individual.
Devemos perguntar-nos porque ainda tantas habitações não estão satisfatoriamente equipadas com instalações de água, retrete e banho ou duche, porque não temos instalações sanitárias modernas em praças centrais, porque não encontramos solução digna para grupos vulneráveis, populações sem residência fixa ou que vivem em áreas não infraestruturadas.
Devemos melhorar a gestão destes serviços em termos financeiros, administrativos, técnicos, comerciais, operacionais, de recursos humanos, de consumidores, ambientais e de segurança. O teletrabalho afirmou-se como forma alternativa ou complementar de funcionamento das organizações e como meio de reduzir elevados encargos. Traz também uma oportunidade para melhorar o funcionamento da administração pública.
Devemos promover a racionalização tarifária para uma recuperação tendencial de custos dos serviços, compatível com a capacidade económica da população. É essencial assegurar a geração de recursos financeiros, bem como alocá-los onde proporcionem maiores mais-valias. É necessário assegurar que a equidade e a solidariedade prevaleçam na distribuição dos custos pelos utilizadores, protegendo os mais frágeis.
Devemos incentivar o desenvolvimento empresarial nacional, aumentando a autossuficiência nas cadeias logísticas no setor, mais curtas e com melhor utilização de recursos locais. A pandemia mostra-nos quão arriscado é depender de países terceiros.
Devemos inovar mais nos serviços de águas, aproveitando a dinâmica em setores como medicina, saúde pública, biotecnologia, tecnologias da informação/comunicação e inteligência artificial.
Devemos aproveitar a transformação digital, com mudanças de tecnologia, cultura e operações e até de preocupações (ex. cibersegurança). Essa transformação representa uma oportunidade para as empresas se tornarem mais eficientes, mais capazes de recolher e analisar dados à distância e mais inteligentes na tomada de decisão.
Devemos valorizar os profissionais da água e incentivarmos a atração e a retenção dos melhores. É essencial a sua capacitação continuada. Serão necessários mais especialistas em áreas como gestão de contingências, implementação de novos modelos de trabalho, inteligência artificial, gestão de projetos transversais e sustentabilidade.
Devemos aumentar a cooperação internacional, reforçando a diplomacia portuguesa, pois a água é fator de conflito, enquanto recurso escasso. Sendo os serviços de águas um fator de desenvolvimento, a diplomacia deve ter um papel mais relevante na internacionalização do setor. É importante a atual abordagem bottom-up na sua internacionalização, de iniciativa empresarial, mas também uma nova abordagem top-down, de iniciativa política, com elevado potencial multiplicativo.
[blockquote style=”3″]Hoje, dia 1 de outubro, assinala-se o Dia Nacional da Água e a Ambiente Magazine convidou o Dr. Jaime Melo Batista para partilhar a sua visão sobre um setor que está cada vez mais condicionado e onde as alterações climáticas têm trazido mais desafios. [/blockquote]