#Opinião: Integração ESG e Finanças Sustentáveis – preparar o caminho para a descarbonização da economia 

As alterações climáticas representam um desafio global urgente, exigindo uma transição abrangente para a descarbonização em vários sectores da economia. Neste sentido, as finanças sustentáveis, que incorporam fatores ambientais, sociais e de governança (ESG) nas decisões de investimento, surgem como uma ferramenta poderosa para facilitar a mudança necessária. Este artigo analisa a forma como as finanças sustentáveis podem contribuir para a descarbonização da economia, destacando o seu potencial para impulsionar mudanças significativas.

Mobilizar capital para a energia limpa:

Um aspecto crucial do financiamento sustentável reside na sua capacidade de mobilizar capital para projetos de energia limpa. Um estudo realizado pela BloombergNEF revelou que, em 2020, o investimento global em energias renováveis atingiu um recorde de 303,5 mil milhões de dólares (1). Os mecanismos de financiamento sustentável, tais como obrigações verdes, fundos climáticos e empréstimos sustentáveis, desempenham um papel vital na canalização de fundos para estes projectos.

Por exemplo, um estudo da International Finance Corporation (IFC) destaca o crescimento significativo das obrigações verdes, que mobilizam capital para projectos de energias renováveis, com as emissões a atingirem 258 mil milhões de dólares em 2020, um aumento de 30% em relação ao ano anterior (2). Estes investimentos não só impulsionam a transição para longe dos combustíveis fósseis, como também promovem a criação de emprego e o crescimento económico (3).

Ao atrair investimentos dos sectores público e privado, o financiamento sustentável facilita a expansão das infra-estruturas e tecnologias de energia limpa. Fornece os recursos financeiros necessários para projetos de energias renováveis, tais como parques solares e eólicos, edifícios energeticamente eficientes e iniciativas de modernização da rede. Esta infusão de capital não só acelera a descarbonização do sector energético, como também contribui para mitigar os impactos das alterações climáticas.

Além disso, a mobilização de capital para projetos de energia limpa traz benefícios adicionais para além da sustentabilidade ambiental. Estimula o crescimento económico ao criar novas oportunidades de emprego em vários sectores, desde a indústria transformadora e a construção até à investigação e desenvolvimento. As comunidades locais beneficiam de maiores perspectivas de emprego e de melhores meios de subsistência, enquanto as economias se tornam mais resistentes e diversificadas.

O aumento do financiamento sustentável e a mobilização de capital para a energia limpa refletem uma mudança global para um futuro com baixas emissões de carbono.

Ao alinhar os objectivos financeiros com as prioridades ambientais, podemos acelerar a transição para um sistema energético sustentável e, ao mesmo tempo, promover um desenvolvimento económico inclusivo.

Melhorar a gestão e a divulgação dos riscos:

A gestão eficaz dos riscos é vital para promover o financiamento sustentável e a descarbonização. Ao integrar os fatores ESG nos processos de tomada de decisões de investimento, os quadros de financiamento sustentável melhoram as práticas de gestão do risco. Estudos efectuados pela Iniciativa Financeira do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP FI) indicam que as empresas com práticas ESG sólidas tendem a apresentar uma menor volatilidade e um melhor desempenho financeiro (4). Além disso, o aumento da transparência e da divulgação dos riscos relacionados com o clima permite que os investidores e as partes interessadas tomem decisões informadas e responsabilizem as empresas pelos seus impactes ambientais. Um inquérito realizado pela KPMG revela que 93% das maiores empresas do mundo fornecem atualmente informações sobre sustentabilidade, o que indica uma ênfase crescente nas considerações ESG (5).

Impulsionar a inovação e o avanço tecnológico:

A inovação e a adoção de novas tecnologias são cruciais para descarbonizar a economia real. O financiamento sustentável desempenha um papel fundamental na promoção da inovação, proporcionando incentivos financeiros para a investigação e o desenvolvimento de tecnologias limpas. De acordo com a Global Sustainable Investment Alliance (GSIA), o mercado global de investimento sustentável cresceu para 35,3 biliões de dólares, o que indica um fluxo substancial de capital para soluções sustentáveis e inovadoras (6). Através de investimentos de capital de risco e fundos de impacto, o financiamento sustentável acelera a implantação de soluções sustentáveis, conduzindo ao desenvolvimento e expansão de tecnologias limpas (7).

Envolver as partes interessadas e promover a colaboração:

A transição para uma economia sustentável exige a colaboração entre diversas partes interessadas. As finanças sustentáveis promovem o diálogo e o envolvimento entre investidores, empresas, governos e organizações da sociedade civil. Ao integrar considerações ESG, o financiamento sustentável incentiva as empresas a envolverem-se proativamente com as partes interessadas, promovendo a transparência, a responsabilidade e práticas empresariais sustentáveis. Um relatório do Fórum Económico Mundial destaca a força crescente dos empréstimos ligados à sustentabilidade, que associam as taxas de juro ao desempenho ESG, com emissões que atingiram 175 mil milhões de dólares em 2020, um aumento substancial em comparação com anos anteriores. Esta abordagem colaborativa permite o alinhamento de interesses e a partilha de boas práticas, acelerando assim o progresso no sentido da descarbonização.

Em junho de 2023 quarenta e cinco governos de todo o mundo subscreveram o objectivo de duplicar a taxa média global de melhoria da eficiência energética até ao final da década, a fim de promover o crescimento económico sustentável e ajudar a colocar o mundo numa via segura e acessível para emissões líquidas nulas. Este compromisso sublinha o papel fundamental da eficiência energética na melhoria dos padrões de vida, no reforço da segurança energética e na aceleração da transição para as energias limpas, com vista a atingir emissões líquidas nulas até 2050. Ao aumentar os progressos anuais em matéria de eficiência energética para mais de 4% até 2030, os governos pretendem criar emprego, alargar o acesso à energia, reduzir as facturas energéticas, diminuir a poluição atmosférica e reduzir a dependência das importações de combustíveis fósseis.

A Declaração de Versalhes sobre “a década crucial para a eficiência energética” sublinha a importância de aumentar a ambição e reforçar a aplicação das políticas de eficiência energética em conformidade com o Acordo de Paris. Apela a políticas eficazes que incentivem a mudança de comportamento dos consumidores e das empresas, com ações específicas para apoiar as famílias vulneráveis e com baixos rendimentos. Além disso, a digitalização, as soluções orientadas para a procura e os investimentos na modernização das redes elétricas são identificados como prioridades que integrarão a eficiência energética em todos os aspectos da transição para a energia limpa. A declaração sublinha a importância de combater a pobreza energética e abordar as questões de género relacionadas com a energia.

Em conclusão, o financiamento sustentável desempenha um papel vital na descarbonização da economia real. Ao mobilizar capital para projetos de energia limpa, melhorar a gestão do risco e a divulgação, impulsionar a inovação e promover a colaboração entre as partes interessadas, o financiamento sustentável acelera a transição para um futuro sustentável e com baixas emissões de carbono.

O compromisso dos governos de duplicar os progressos em matéria de eficiência energética reforça ainda mais a importância da eficiência energética para alcançar um crescimento económico sustentável e atenuar as alterações climáticas. Ao alinhar os objectivos financeiros com as prioridades ambientais, podemos preparar o caminho para um futuro próspero e sustentável.

Referências:

(1) BloombergNEF. (2021). Tendências de Investimento em Energia Sustentável 2021.

(2) Sociedade Financeira Internacional. (2021). Relatório de impacto das obrigações verdes.

(3) Agência Internacional das Energias Renováveis. (2023). Energia renovável e empregos – Revisão anual 2023.

(4) Iniciativa Financeira do Programa das Nações Unidas para o Ambiente. (2020). The Case for ESG Integration in Pension Fund Investments.

(5) KPMG. (2022). Inquérito global sobre relatórios de responsabilidade empresarial.

(6) Aliança Global para o Investimento Sustentável. (2020). Revisão do investimento sustentável global de 2020.

(7) Instituto Morgan Stanley para o Investimento Sustentável. (2021). Sustainable Signals: Growth and Opportunity in Asset Management.

 

Biografia do autor: João Maria Botelho é investigador no centro de conhecimento NOVA Business Human Rights and the Environment, NOVA OCEAN e é também membro do Conselho Consultivo do NOVA Green Lab da Universidade NOVA de Lisboa. É Advisor em ESG and Impact Investment na Syntegral e, agora, Climate Advocate na rede LACLIMA (Latin American Climate Lawyers Initiative for Mobilizing Action).