Por: Gonçalo Morais Tristão, presidente do CEPAAL – Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo
O sector olivícola nacional registou uma evolução muito positiva nos últimos 20 anos. Muito devido ao acesso à água, proporcionado com o regadio do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva (EFMA), o olival português transformou-se, modernizou-se, conseguiu atrair investimentos, inovação e venceu as batalhas da quantidade e da qualidade. Portugal é hoje autossuficiente em azeite, o que já não acontecia desde a década de 60 do século passado. Além disso, tornou-se um país exportador. Nos últimos 20 anos, as exportações aumentaram 12 vezes em volume e 18 vezes em valor, tendo-se atingido em 2023 o valor recorde de 1.159 milhões de euros. Por outro lado, em termos de qualidade, o azeite português ombreia hoje com os melhores azeites do mundo e prova disso é o número crescente de prémios que os azeites portugueses conquistam em concursos internacionais.
Mas será que as alterações climáticas podem ameaçar o sucesso da olivicultura e do azeite nacional?
Convém desde logo referir que a oliveira está instalada na bacia mediterrânica há milhares de anos, o que por si só nos demonstra que a oliveira é muito resiliente às alterações climáticas. Ainda assim, os impactos na olivicultura são evidentes: o aumento das temperaturas, a diminuição da precipitação, a maior frequência de eventos climáticos extremos tem consequências na produção, na qualidade e, por vezes, na viabilidade. Por exemplo, se ocorrer um mês de maio com temperaturas excessivamente altas, isso afetará a floração do olival e, em consequência, a produção. Em termos macro, uma redução substancial da produção mundial pode ter reflexos nos preços, quando a procura é superior à oferta. Foi o que aconteceu nas duas últimas campanhas, com uma redução muito relevante da produção em Espanha, por causa da seca.
Para mitigar estes efeitos no olival e na produção de azeite, o acesso à água é crucial. A capacidade de fornecer água para a rega das plantas permite a regularidade da produção de azeitona e de azeite. É por essa razão que a área de olival tem crescido na zona do EFMA. A possibilidade de regar com uma dotação relativamente baixa, se comparada com a de outro tipo de culturas, crias as condições ideais para a expansão do olival.
Torna-se, assim, necessário, instalar noutras zonas do País infraestruturas de rega, associadas a uma origem de água, de modo que possamos aumentar a capacidade produtiva quer de azeite quer de outros produtos agroalimentares. A construção de novas barragens e as correspondentes infraestruturas hidráulicas deve ser feita tendo em conta a proteção de valores ambientais, mas não esquecendo também a vertente económica e social.
Também do lado da produção, os olivicultores devem estar conscientes dos desafios que enfrentam em consequência das alterações climáticas. As suas práticas no campo devem, pois, estar adaptadas aos fenómenos climáticos. Apesar dos progressos que tem havido na questão do uso eficiente da água, em determinadas situações onde o recurso água é escasso, deve o olivicultor procurar implementar estratégias de rega deficitária, controlada, diminuindo a quantidade de água a distribuir pela planta, sem diminuir a sua produção. Por outro lado, deve-se generalizar a prática do enrelvamento das entrelinhas em que a cobertura vegetal é constituída por espécies espontâneas ou semeadas. Os olivicultores têm ainda de estar atentos à evolução varietal, com os resultados obtidos pela academia e pelos viveiristas e, no momento de plantação do seu olival, escolherem as variedades que melhor se adaptam às condições climáticas da região.
Enfim, tem de haver uma estratégia de mitigação e de adaptação às alterações climáticas. Sem ela corremos o risco de perder relevância em termos de quantidade e qualidade do azeite.