A crescente importância da descarbonização da economia tem levantado uma série de questões sobre a origem da energia produzida para a satisfação de necessidades básicas, seja para eletricidade, aquecimento ou transportes.
Na COP26 ambicionava-se acabar com a queima de carvão para produzir eletricidade para uso doméstico, mas o acordo ficou limitado à redução progressiva.
Nos últimos 10 anos, Portugal tomou um rumo nesse sentido ao reduzir em 77% a produção de eletricidade com recurso ao carvão até 2020. Em novembro deste ano, esta fonte apenas representava 2% do total de energia produzida e tudo aponta para que deixe de ser sequer uma opção com o fecho das centrais de Sines e Pego em janeiro e novembro deste ano, respetivamente.
O gás natural satisfaz a maior parte das necessidades produtivas de eletricidade de Portugal que, embora sendo uma energia menos poluente que o carvão, também é fóssil. Esta energia conta com 32% do total de produção elétrica até novembro deste ano, que não está muito longe da sua média histórica.
A redução do carvão foi compensada ao longo dos últimos anos com uma maior produção a partir do gás natural, mas também com o crescimento das energias renováveis potenciado pela consolidação da capacidade instalada. A seguir ao gás natural, a energia hídrica e a energia eólica seguem-se como as mais relevantes na produção de eletricidade. Pelo que permanece a questão:
Será que Portugal é capaz de substituir as energias fósseis pelas energias verdes?
A combinação de energia hídrica, eólica e solar fotovoltaica pretende ser capaz de suprir as necessidades elétricas do país e ainda exportar a preços competitivos. As energias renováveis passaram de um peso de 48% em 2011 para um peso maioritário de 63%, segundo dados acumulados a novembro de 2021 divulgados pela REN.
Energia Solar
O maior destaque é da energia solar que teve um crescimento exponencial, produzindo hoje quase quatro vezes mais do que em 2011. Os enormes decréscimos no custo desta tecnologia, cerca de 85% na última década segundo a BloombergNEF, graças ao aumento da sua capacidade produtiva, assim como o acesso a financiamento com condições cada vez mais favoráveis permitiram atrair um crescente investimento privado no setor.
A energia solar soma atualmente apenas 4% do total de eletricidade produzida pelo que apresenta uma larga margem de crescimento enquanto fonte alternativa cuja aposta começa agora a dar frutos.
As soluções de autoconsumo tornaram-se ainda mais viáveis, não só pela redução dos custos de produção, mas também face ao aumento do preço da eletricidade.
Particularmente no caso dos consumidores não-domésticos (e.g. industriais ou serviços) que ficam mais expostos à variação dos preços no mercado global por terem contratos indexados a preços de mercado, por norma a 3 meses, ao passo que os consumidores domésticos têm tipicamente contratos indexados a 1 ano. Em condições normais, o break-even point do investimento em painéis fotovoltaicos na cobertura dos edifícios tem sido alcançado cada vez mais cedo, variando entre 3 a 6 anos.
Este rápido retorno financeiro permitirá a massificação desta tecnologia que deverá passar no imediato por unidades descentralizadas, já que a produção em larga escala está mais demorada face aos constrangimentos no licenciamento e no acesso às redes.
Existem ainda outras soluções de partilha de energia em comunidade ou venda direta a clientes empresariais que foram recentemente previstas na legislação, mas que ainda não se materializaram em Portugal.
O crescimento da energia solar contribuirá em larga medida para a descarbonização das necessidades elétricas.
Energia Eólica
A energia eólica foi a segunda que mais cresceu desde 2011 em termos de produção, com um aumento de 34% até 2020, e regista a terceira maior representatividade, de 26,1% segundo dados acumulados a novembro deste ano. Apresenta uma capacidade produtiva muito estável, naturalmente limitada a fatores climáticos externos, mas sem grandes variações que não possam ser compensadas por outras energias em regime de hibridização.
O custo da energia eólica em terra (onshore) é o mais baixo das energias renováveis. Ainda que necessite de maior investimento inicial, quando diluído pela sua elevada capacidade produtiva torna-se muito competitivo. Partindo de um custo de produção muito baixo em 2011, apresentou uma redução de 58% no custo segundo a BloombergNEF. Já a energia eólica flutuante (offshore) ainda se encontra num estágio muito preliminar de implementação em larga escala dado que o seu custo que é o dobro da eólica onshore, no entanto como partiu de um nível muito elevado conseguiu um maior decréscimo, de 62% em 10 anos.
Energia Hídrica
As barragens cumprem várias funções, tendo como prioridade o consumo humano e regadio. Também são importantes na regulação do caudal do rio, quando existe risco de cheias gere a quantidade de água que escoa e quando há secas retém a água no reservatório para otimizar o seu aproveitamento. Mediantes estes fatores, é ainda utilizada para a produção de energia elétrica sempre que possível.
Em Portugal existem mais de 260 barragens sendo que a maior aposta neste tipo de investimentos decorreu principalmente entre 1950 e 2000, pelo que a produção hidroelétrica nos últimos 10 anos apenas cresceu apenas 9%. Não obstante, é a segunda maior fonte de energia representando 25,6% da produção elétrica a novembro de 2021, logo a seguir ao gás natural.
Havendo uma quantidade suficiente de água no reservatório, ela é utilizada para produção de energia gerada pela força cinética da água exercida numa turbina ligada a
um gerador elétrico. Adicionalmente, este curso também pode ser reversível reaproveitando esta água para gerar mais energia através da bombagem para a parte superior da barragem. Apesar de ter uma baixa representatividade de 3%, mais do que triplicou a sua produção desde 2011. As suas maiores vantagens são a capacidade de armazenar energia de forma eficiente, quando comparada a baterias, e o aumento da rentabilidade, por bombear em horário de baixo custo da energia e potenciar a produção hidroelétrica em horário de custo mais elevado.
Portugal apresenta características ótimas para atingir a produção elétrica com base em energias verdes complementares, nomeadamente por possuir um elevado número de horas de sol e de recursos hídricos. Este regime de hibridização pretende conciliar a produção a partir das diversas fontes de energia limpas, baseando-se sempre em pelo menos duas intercaladas de acordo com as condições meteorológicas. Aproveitando a solar fotovoltaica em períodos diurnos com bom tempo, a eólica em períodos com maior intensidade de vento e a hidroelétrica sempre que seja necessário complementar as outras energias pela falta de condições atmosféricas ou para dar resposta a um pico de consumo em determinado período. Ao mesmo tempo é possível usar o processo de bombagem para armazenar a energia excedente.
Para alcançar as metas que preveem uma redução das emissões de gases com efeito de estufa em 55% até 2030, Portugal terá de reforçar a sua potência instalada das energias renováveis para 28,8 GW em 2030, segundo o PNEC 2030. Isto significa um acréscimo de 14,2 GW na capacidade instalada em 10 anos face a 2020, pelo que anualmente devia-se investir em 1,4 GW adicionais. Destas, a solar devia passar a possuir uma potência de cerca de 9,0 GW em 2030 (+7,9 GW em 10 anos), a eólica cerca de 9,3 GW (+3,8 GW) e a hídrica 8,5 GW (+1,3 GW).
O plano delineado prevê que entre 2016 e 2030 seja necessário um investimento total de €24 mil milhões no sistema elétrico para que Portugal atinja a neutralidade na emissão de gases com efeito de estufa até 2050. Segundo estimativas do PNEC 2030, este investimento decompõe-se em €22 mil milhões decorrente da dinâmica normal de modernização da economia sem neutralidade e aos quais são necessários €2 mil milhões adicionais para atingir a neutralidade.