Por Ana Pires da Silva, Advogada da AMMC LEGAL
São os Mercados de Carbono a ferramenta para combater às alterações climáticas? Tem o carbono o propósito de combate às alterações climáticas?
A luta, que se quer global e coordenada, de redução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) e de promoção de uma economia mais sustentável, vê no mercado voluntário de carbono (MVC) uma ferramenta adicional e complementar de mitigação e redução de GEE e, em simultâneo, de compensação de emissões.
Em Portugal, o MVC, instituído pelo Decreto-Lei n.º 4/2024, de 05 de janeiro que promove projetos de redução e sequestro de emissões de GEE, tem uma importância crescente nas políticas de descarbonização e está diretamente relacionado com diversos compromissos nacionais e internacionais de combate às alterações climáticas. É um instrumento complementar de outras medidas reguladas e tem potencial de mobilizar esforços adicionais das empresas, indivíduos e setores para a descarbonização. Proporciona um mecanismo de compensação voluntária das emissões que não podem ser totalmente eliminadas, especialmente nos setores difíceis de descarbonizar (ex: setor dos transportes); fomenta o desenvolvimento de soluções inovadoras, tais como projetos de captura e armazenamento de carbono e novas tecnologias para redução de emissões; e, incentiva a participação do setor privado na mitigação climática.
É uma escolha para a neutralidade carbónica, que oferece a oportunidade às empresas para uma transição para uma economia de baixo carbono e de demonstração do seu compromisso com os objetivos climáticos globais, maxime, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): ação climática (ODS 13), energia limpa e acessível (ODS 7) e vida terrestre (ODS 15). O MVC permite à empresas e aos indivíduos colaborarem de forma ativa no combate às alterações climáticas.
O MVC apresenta, contudo, desafios a superar. Um dos principais desafios, a par da falta de conhecimento e consciencialização por parte de empresas e cidadãos sobre o funcionamento e os benefícios do MVC, é o da capacidade de Portugal atrair investimentos e desenvolver projetos de alta qualidade que possam competir no mercado global de créditos de carbono. Nesse campo apresenta-se, desafiante garantir a transparência, integridade e segurança do mercado.
Com a publicação no passado dia 02 de Outubro de 2024 das Portaria n.º 239/2024/1 (estabelece os montantes das taxas a cobrar no âmbito do mercado voluntário de carbono pelas entidades supervisora e gestora da plataforma de registo), Portaria n.º240/2024/1 (Define os critérios de qualificação para o exercício da atividade de verificador independente de projetos de mitigação de emissões de gases com efeito de estufa e identifica a entidade gestora do sistema de qualificação no âmbito do MVC) e a Portaria n.º 241/2024/1 (estabelece os requisitos gerais da plataforma eletrónica de registo do MVC) é conferida clareza sobre o funcionamento e segurança das operações do MVC, incluindo taxas, registo de projetos e gestão de créditos de carbono.
O MVC, de participação voluntária, permite às empresas a aquisição de créditos de carbono de forma a compensar emissões que não são possíveis de reduzir diretamente, a mitigação da pegada de carbono e a adesão aos, cada vez mais exigidos (por investidores e consumidores), compromissos de neutralidade carbónica.
Sem olvidar, a utilidade dos créditos de carbono para as estratégias de sustentabilidade por via da inclusão nos relatórios de responsabilidade corporativa.
Os créditos de carbono são criados através de projetos de redução e sequestro de carbono, entre outros, de projetos de reflorestação, gestão sustentável de florestas, agricultura regenerativa, eficiência energética e geração de energias renováveis.
Destacam-se, no MVC, os projetos de sequestro florestal de carbono em territórios vulneráveis, áreas integradas de gestão de paisagem, zonas de intervenção florestal e baldios, rede natura e rede nacional de áreas protegidas e áreas florestais ardidas.
A legitimidade dos créditos de carbono é garantida por certificação, validação inicial e verificação periódica por auditores independentes (qualificação será realizada em função das categorias associadas aos setores de atividade: energia, processos industriais, agricultura, uso do solo, zonas húmidas e marinhas e resíduos).
A transação dos créditos é efetuada através de plataforma eletrónica de registo. A plataforma eletrónica de registo (gerida pela ADENE- Agência para a Energia com a supervisão da APA – Agência Portuguesa do Ambiente, I.P.) permitirá o registo dos agentes de mercado, de projetos e programas de carbono (registo obrigatório), facilita a emissão, transferência e a integridade dos dados registados, minimizando os riscos de dupla contagem.
Um passo crucial para a operacionalização e confiança no MVC que dá propósito ao carbono.
Fica a faltar a criação e operacionalização da plataforma eletrónica, a entrada em vigor da Portaria n.º 240/2024/1 em 02.01.2025 que estabelece os critérios de qualificação de verificadores independentes do MVC e a aprovação pela APA das metodologias de carbono da qual depende a admissibilidade das tipologias dos projetos de carbono no MVC.