Energia e recursos naturais sempre fizeram parte do xadrez da geopolítica mundial. Questões de soberania, mas também de hegemonia sempre tiveram por base o controlo de recursos naturais e o controlo de fontes de energia, nomeadamente de combustíveis fósseis, com o petróleo “à cabeça”.
Tal como o clima está a mudar, também a geopolítica mostra sinais de mudança. Vinte e quatro anos passaram desde o Protocolo de Quioto, vinte e quatro anos de avanços e recuos nas negociações globais de clima e 24 anos a mais no contexto de um desastre climático. Felizmente em 2015, no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, é aprovado um novo acordo sobre a limitação das emissões de gases com efeito de estufa para a atmosfera e com um conjunto de medidas e, principalmente, metas a que os Estados se vinham a comprometer na luta contra as alterações climáticas. Este novo acordo, o Acordo de Paris, é bastante mais ambicioso que os anteriores, sendo clara a necessidade e ,principalmente, o compromisso dos Estados em desenvolverem planos efetivos de mitigação e adaptação ao aquecimento global, e não menos importante quanto ao financiamento climático necessário com vista à transição energética.
Se até aqui as alterações climáticas eram uma questão política secundária, em alguns casos até mesmo uma “questão de fé” com lugar a negacionistas do problema. Hoje, atingir a neutralidade carbónica é o novo “combate”, não só para os cidadãos, uma vez que o interesse da opinião pública por este problema é bastante maior, mas também para os governos a nível mundial. Julgo que não erro se disser que atualmente é absolutamente consensual a urgência em promover ações concretas que visem reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e em limitar o aquecimento global de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Assim, descarbonizar a economia passou a ser uma preocupação internacional e o termo passou a fazer parte dos discursos dos líderes mundiais. De facto, não obstante das estratégias poderem ser diferentes, de uns defenderem uma determinada fonte de energia e outros outra, o consenso é que tem que ser limpo! Os vários governos terão necessariamente que estabelecer uma visão comum para que a economia global faça a transição para a neutralidade carbónica e que possa ser travada esta catástrofe com impactos desastrosos para a Humanidade.
Ambiente é, pois, a nova palavra de ordem. Mesmo com o combate à pandemia de Covid-19 como prioritário nas agendas políticas internacionais, as alterações climáticas e a descarbonização da economia, são o tema central da (nova) geopolítica global. O mundo precisa de se unir e, como referiu o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, “neste ano crucial para a humanidade, é agora o momento de agir de forma ousada para proteger o clima”. É hora de agir pelo clima, pelas pessoas e pelo planeta”.
Será este o tempo, e com vista à promoção do Desenvolvimento Sustentável, que o “xadrez” muda? Que as velhas rivalidades dão origem a novas parcerias? Que a sustentabilidade ambiental passa a fazer parte do conceito de soberania?
Julgo que (felizmente) nada será como antes! Ainda recentemente na 4.ª edição do Curso de Análise Estratégica, Geoeconomia e Prospetiva do Instituto de Defesa Nacional o tema central de estudo foi “Energias 2021-2040: Os Desafios da Descarbonização”, e na aula aberta realizada a 8 de abril foram vários os cenários apresentados “para os Desafios da Descarbonização e Transformação do Modelo Energético Mundial”, um fabuloso e rico contributo para a reflexão da importância da neutralidade carbónica na agenda da política internacional, quer no contexto económico, quer mesmo no contexto da defesa e da diplomacia.
O ambiente, a neutralidade carbónica e o travar do aquecimento global passaram a ser temas centrais de países tão distintos como a China e os EUA (com o regresso dos EUA ao Acordo de Paris) ou o Japão e a Rússia!
Como escreveu Bill Gates no seu mais recente livro “Como evitar um desastre climático”: “os países que criarem grandes empresas e uma indústria inteira de energia limpa serão aqueles que irão liderar a economia global nas próximas décadas”.
Portugal também é interveniente neste “tabuleiro”, para além de ter sido um dos primeiros Estados-membros da União Europeia a ratificar o Acordo de Paris em 2016, foi o primeiro país a assumir a neutralidade carbónica até 2050.
[blockquote style=”3″]Miguel Lemos Rodrigues junta-se todos os meses à Ambiente Magazine para dar o seu testemunho sobre assuntos ligados ao meio ambiente, resíduos, clima ou saneamento [/blockquote]
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