#Opinião: “A Lei de Bases do Clima precisa de mais ação”
Por: Ricardo Bandeira, advogado na AMMC LEGAL
A Lei de Bases do Clima (LBC) entrou em vigor a 1 de fevereiro de 2021. Portanto, há cerca de 2 anos. É, por isso, tempo de balanço. E este, não obstante a ambição que reconhecidamente está subjacente à LBC, não é (muito) positivo. Comecemos pelo princípio.
A LBC reconhece como seu ponto de partida que vivenciamos atualmente uma situação de emergência climática. Porém, a emergência climática aposta à LBC é ela mesma uma emergência própria de uma lei que apenas tem valor paramétrico. Isto é, de uma lei cuja materialização dos respetivos objetivos e metas estará sempre dependente da subsequente emanação de disposições normativas vinculativas perante terceiros, públicos e privados. Seja ao nível legislativo, seja ao nível regulamentar.
Nesse sentido, a emergência climática referenciada na LBC só por si será sempre uma emergência desprovida de urgência. Pelo contrário, esta tónica de urgência somente será dotada de urgência – no sentido de ser dotada de eficácia – por via das tais disposições normativas vinculativas. Como tal, esta conceção de emergência climática está muito distante de uma declaração do estado de emergência nos termos do artigo 19.º da CRP.
Ainda assim, apesar da emergência climática não corresponder a uma declaração do estado de emergência, não deixa de ser motivo de lamento que, volvidos 2 anos da entrada em vigor da LBC, se tenha ficado pelo meramente paramétrico. É o caso do incumprimento do prazo de 1 de fevereiro de 2024 – prazo esse inscrito na própria LBC – para serem desenvolvidos um conjunto de instrumentos de planeamento estratégico para a ação climática. Incumprimento esse plasmado na não apresentação da Estratégia Industrial Verde, na não aprovação do primeiro conjunto de planos setoriais de mitigação das alterações climáticas e na não elaboração (da totalidade) dos planos regionais e municipais para a ação climática.
Por outro lado, o atraso na criação do Conselho para a Ação Climática (CAC) cria uma situação de dislexia ao nível do planeamento para a mitigação. Isto porque, a denominada “Estratégia de longo prazo” que cabe ao governo criar com vista à consecução dos objetivos climáticos em matéria de mitigação depende de um parecer prévio desta mesma CAC. Portanto, depende de um parecer prévio de uma entidade que ainda não existe. E assim também se vai prolongando a necessidade da sua criação. Adicionalmente, a continuada não preparação dos chamados “Orçamentos de Carbono” leva a uma ausência de fixação de limites para as emissões de gases de efeito de estufa. Perante esta não fixação de limites – designadamente se a mesma continuar a prolongar-se no tempo – fica a dúvida de ser viável o compromisso assumido na LBC quanto ao alcance da neutralidade carbónica já em 2045.
Curiosamente, esta inércia – esta emergência que não é urgente – na materialização dos instrumentos de planeamento estratégico para a ação climática acaba por encontrar o devido respaldo no próprio regime sancionatório da LBC. Isto porque, o mesmo regime sancionatório – que também tem que ser concretizado em diploma próprio – foca-se tão-somente nas ações e omissões danosas que acelerem ou contribuam para as alterações climáticas, nada dizendo quanto à ausência de regulamentação da LBC.
Por conseguinte, volvidos cerca de 2 anos da sua entrada em vigor, é tempo de conferirmos urgência à emergência climática que a LBC reconhece e assume. Materializando-a de maneira aos seus objetivos e metas passarem a vincular terceiros. É tempo de agir.