Por: Márcio Couto, consultor na INOVA+
O mercado de trabalho global tem vindo a sofrer uma profunda transformação impulsionada pelas crescentes preocupações relacionadas com as alterações climáticas e a sustentabilidade ambiental. Esta mudança de paradigma levou as empresas a não se concentrarem apenas no impacto ambiental das suas atividades, mas também a valorizarem um conjunto de competências comportamentais dos seus empregados, conhecidas como competências transversais verdes. Estas competências, que englobam capacidades como o pensamento crítico e sistémico, a colaboração, a comunicação eficaz e a consciência ambiental, são essenciais para enfrentar os desafios colocados pelo atual objetivo global de transição para uma economia mais sustentável.
Além disso, as competências transversais são importantes para qualquer empresa, independentemente do seu objetivo específico em matéria de iniciativas ecológicas. A comunicação eficaz, o trabalho em equipa e a capacidade de resolução de problemas são universalmente benéficos, ajudando as organizações a prosperar em qualquer contexto. No entanto, as competências transversais verdes são especialmente cruciais para os profissionais de setores como a hotelaria, a construção, a indústria transformadora, os transportes, a energia e a agricultura, onde os impactos ambientais são mais significativos.
É importante lembrar que qualquer organização, empresa ou organização similar deve incorporar estas competências para garantir práticas sustentáveis. Ao promoverem as competências transversais verdes nas suas operações diárias, as empresas podem contribuir efetivamente para a transição ecológica, fomentando uma cultura de sustentabilidade que beneficia tanto as organizações como a comunidade em geral.
Este artigo explora a importância destas competências no mercado de trabalho, as tendências atuais e os benefícios de possuir competências transversais verdes tanto para as empresas como para os trabalhadores.
O que são competências transversais verdes?
As competências transversais verdes são definidas como um subconjunto de competências interpessoais e comportamentais especialmente centradas em práticas e comportamentos que promovem a sustentabilidade e a proteção do ambiente. Este tipo de competências inclui:
- Consciência ambiental: A capacidade de compreender o impacto das atividades pessoais e sociais no ambiente e agir em conformidade para minimizar esses impactos.
- Pensamento sistémico: A capacidade de ver o quadro geral e compreender como as diferentes partes de um sistema se relacionam umas com as outras, sendo essencial para lidar com questões complexas como as alterações climáticas.
- Colaboração: A capacidade de cooperar entre indivíduos e organizações para reduzir o impacto ambiental negativo e ser mais amigo do ambiente.
- Resolução criativa de problemas: A capacidade de inovar e usar a criatividade para encontrar soluções inovadoras para uma miríade de problemas que afetam o ambiente natural.
- Liderança sustentável: A capacidade de inspirar e mobilizar equipas e organizações para práticas mais ecológicas e sustentáveis.
A demanda por competências transversais verdes no mercado de trabalho
Desde a sua adoção pelos membros da ONU em 2015, a Agenda 2030, com os seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), está a aumentar significativamente a procura de competências transversais verdes no mercado de trabalho, à medida que os governos, as indústrias e as organizações se alinham com os objetivos de sustentabilidade a nível mundial. À medida que a sociedade trabalha para cumprir os objetivos globais, há uma necessidade crescente de empregados e empregadores que possuam não só conhecimentos técnicos, mas também as competências comportamentais necessárias para impulsionar e apoiar estas mudanças. As competências transversais verdes, tal como definidas anteriormente, são essenciais para desenvolver soluções inovadoras, facilitar o trabalho em equipa e liderar iniciativas de sustentabilidade.
Um relatório de 2018 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sugere que os investimentos em políticas de economia verde poderiam criar cerca de 18 milhões de empregos em toda a economia global até 2030. No entanto, para garantir que essas posições sejam preenchidas de forma eficaz, as competências transversais verdes tornar-se-ão inestimáveis. Em setores como as energias renováveis, a gestão de resíduos, a agricultura sustentável e a construção ecológica, os profissionais com capacidade para inovar e colaborar de forma sustentável são já considerados muito valiosos. Além disso, a grande maioria dos sectores industriais tradicionais está a sofrer as adaptações necessárias para acompanhar os novos enquadramentos, modelos económicos e legislação (como o GreenComp, o European GreenDeal, a Lei Europeia do Clima, entre outros).
Os resultados económicos e o desenvolvimento sustentável são, por vezes, vistos como noções antagónicas. No entanto, vários estudos concluíram que as inovações em matéria de sustentabilidade têm um efeito positivo na competitividade das empresas e que a mudança para a sustentabilidade traz consigo um conjunto de oportunidades de negócio tão grandes e tão numerosas que ultrapassam os custos potenciais.
Neste contexto, a falta de competências comportamentais relacionadas com a sustentabilidade constitui um obstáculo significativo para os potenciais empregados e para a competitividade e o crescimento de muitas empresas.
Por exemplo, no domínio CTEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), considere-se uma empresa tecnológica que esteja a desenvolver novas tecnologias eficientes do ponto de vista energético. Se os engenheiros não tiverem competências de colaboração e pensamento sistémico, poderão ter dificuldade em trabalhar em conjunto de forma efetiva ou em interagir com as partes interessadas. Isto pode levar a atrasos na conclusão do projeto e a uma incapacidade de alinhar a tecnologia com as necessidades dos utilizadores, acabando por prejudicar a capacidade da empresa para inovar e competir num mercado cada vez mais orientado para a sustentabilidade.
Benefícios para empresas e indivíduos
Desenvolver e valorizar as competências transversais verdes traz benefícios para o ambiente, bem como para as empresas e para os indivíduos.
Para as empresas, os colaboradores com estas competências têm uma maior capacidade de inovar e propor soluções para os desafios ambientais e outras questões complexas, tornando-as mais competitivas num mercado global que valoriza cada vez mais a sustentabilidade. Além disso, as empresas com uma forte cultura de sustentabilidade tendem a atrair talentos qualificados que se alinham com os seus valores. Adicionalmente, as empresas com trabalhadores conscientes das questões ambientais têm mais facilidade em navegar nos procedimentos de gestão ambiental, tornando-as mais eficientes e amigas do ambiente.
Para os trabalhadores, possuir competências transversais verdes oferece uma vantagem competitiva num mercado de trabalho em constante evolução. No seu Global Green Skills Report 2023, o LinkedIn estudou as tendências relacionadas com o “talento ecológico” – a percentagem de trabalhadores que têm um emprego ecológico ou que indicam pelo menos uma competência ecológica no seu perfil do LinkedIn. Os dados recolhidos revelaram que o “talento verde” está a aumentar de forma constante nos 48 países estudados, sendo a procura de pessoas com estas competências quase duas vezes superior à oferta atual!
O estudo revela também que apenas um oitavo dos trabalhadores nessa rede social possui competências ecológicas, o que significa que ainda estamos longe da aquisição de competências ecológicas necessária para atingir o objetivo de transição para uma economia e uma força de trabalho ecológicas.
Os profissionais que demonstrem consciência ambiental, pensamento crítico e capacidade de colaboração serão mais procurados e valorizados pelas organizações que dão prioridade à sustentabilidade. Além disso, o desenvolvimento destas competências permite que os trabalhadores se adaptem mais facilmente às exigências de um mercado que caminha para uma economia verde.
A necessidade de formação e educação
Para que as competências transversais verdes sejam amplamente adotadas, é necessário um esforço conjunto entre as instituições de ensino superior, as empresas e decisores políticos no domínio da educação. É com isto em mente que o projeto SOFTEN (Embedding Soft Skills in STEM Academic Curricula for the Transition to Sustainable Green Economy) foi criado e está atualmente a ser implementado em seis países europeus, incluindo em Portugal. O seu objetivo é integrar este tipo de aptidões no ensino CTEM em toda a Europa através de formação de educadores, promovendo metodologias de ensino inovadoras, colmatando as aptidões dos licenciados de áreas CTEM e alinhando as suas capacidades com as necessidades do mercado de trabalho ecológico.
O projeto SOFTEN aborda o desafio dos currículos CTEM desatualizados e monodisciplinares, promovendo o desenvolvimento de um ensino interdisciplinar e ecológico com a missão de preparar, formar e inspirar estudantes e educadores CTEM para desenvolverem as competências verdes necessárias para uma futura força de trabalho alinhada com práticas sustentáveis e amigas do ambiente.
Conclusão
A adoção de competências transversais verdes é crucial para o futuro da força de trabalho global e para o sucesso das empresas e dos trabalhadores num mundo cada vez mais orientado para a sustentabilidade. À medida que as indústrias evoluem para enfrentar os desafios ambientais e aderir a quadros e diretrizes internacionais, os trabalhadores com estas competências desempenharão um papel vital na condução da transição ecológica. As empresas que valorizam e cultivam as competências transversais verdes ganharão uma vantagem competitiva, liderando os esforços de inovação e atraindo os melhores talentos alinhados com as suas estratégias de sustentabilidade.
Para conhecer melhor o projeto SOFTEN aceda aqui.
(Este projeto é financiado pela União Europeia, porém os pontos de vista e opiniões expressos são exclusivamente da responsabilidade do(s) autor(es) e não refletem necessariamente os da UE ou da Agência Nacional. Projeto No.2022-1-PL01-KA220-HED-000085725).