As profundas e frias correntes oceânicas do Atlântico Norte estão a neutralizar os efeitos do aquecimento global na Antártida e a retardar a subida do nível das águas, de acordo com um estudo hoje divulgado. Este isolamento gelado do continente de neve – coberto por uma camada de gelo de até quatro quilómetros de espessura – poderá durar séculos, sustenta o documento publicado na revista Nature Geoscience.
São boas notícias para centenas de milhões de pessoas que habitam em regiões baixas do globo, ameaçadas pelo aumento previsto de um metro do nível médio das águas dos mares até ao fim deste século, segundo o último relatório do Painel de especialistas em ciências do clima da ONU.
Estudos mais recentes sugerem que a linha oceânica pode subir ainda mais, empurrada pela água à superfície, que se expande à medida que aquece, juntamente com o escoamento do gelo derretido de glaciares e dois enormes lençóis freáticos gelados. Um deles cobre a Gronelândia e o outro situa-se na Antártida ocidental, um pedaço do continente que está a aquecer mais rapidamente que o resto.
Se a Antártida oriental estivesse a derreter à mesma velocidade, o impacto no povoamento humano ao longo das linhas de costa de todo o mundo seria verdadeiramente catastrófico.
Os cientistas sabem há muito que as alterações climáticas estão a afetar o oceano Antártico muito mais lentamente no último meio século que os oceanos do resto do mundo. E também sabem porquê: por causa da extensão da camada de gelo do continente e do gelo do mar que a rodeia, juntamente com os ventos e as correntes oceânicas que circundam o continente como uma zona tampão.
Mas o novo estudo atribui o papel fundamental a um veio de correntes oceânicas profundas que transporta água gelada – a cerca de um grau Celsius – da região do Ártico.
“A fonte principal do aquecimento retardado do oceano Antártico é a circulação profunda do oceano”, escreveram na Nature Geoscience o principal autor do estudo, Kyle Armour, investigador na Universidade de Washington, em Seattle, e os seus colegas.
Essas correntes profundas não se movem depressa – a água que hoje se encontra à volta da Antártida começou a sua viagem transatlântica norte-sul antes do início da Era Industrial -, mas o seu impacto é duradouro, sublinha-se no texto.
Só numa “escala temporal de vários séculos” poderão os gases com efeito de estufa que estão a provocar secas, tempestades violentas e condições meteorológicas erráticas no resto do planeta ter um impacto profundo no oceano Antártico, concluem os investigadores.
Estas “boas notícias”, contudo, são atenuadas pelo facto de mesmo um ligeiro aquecimento poder provocar danos – e não apenas na Antártida ocidental.
Um glaciar do tamanho de França no topo da Antártida oriental está rapidamente a desfazer-se em água e poderá fazer subir os oceanos cerca de dois metros em poucos séculos, apontou outro estudo divulgado na semana passada.
O Glaciar Totten – a maior parte do qual se encontra submersa – está a sofrer erosão por baixo, devido à água do mar que corre centenas de quilómetros para o interior, fazendo aumentar a porção em contacto com a água do mar e diminuir a que está assente em rocha.