“O PRR é parco no que respeita ao setor agrícola”, diz documento estratégico apresentado pela CAP
Na passada sexta-feira, 31 de março, a CAP (Confederação dos Agricultores em Portugal) promoveu uma conferência na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, para falar da gestão da água no setor agrícola. Neste encontro foi apresentado o documento estratégico “Água e Agricultura”, de Pedro Cunha Serra, que já ocupou a presidência do Instituto Regulador de Águas e Resíduos ou do Grupo Águas de Portugal e que ainda coordenou os trabalhos de elaboração do Plano Nacional da Água.
Num texto que contempla a importância da gestão da água na agricultura, há uma chamada da atenção para o facto do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ser “parco no que respeita ao setor agrícola”, à semelhança do Programa Nacional de Investimentos (PNI 2030).
Mesmo assim, o PRR “representa uma oportunidade para esta mudança de paradigma que se impõe, não apenas por força das já referidas alterações climáticas, mas também pela necessidade do reforço da nossa competitividade no mercado internacional, competitividade não apenas nos mercados do produtos agrícolas, mas também competitividade como País, graças a uma imagem de responsabilidade social e ambiental que teremos de construir ou reforçar envolvendo todos os agentes, o Governo, as autarquias locais, a administração pública, os agricultores, os empresários da agroindústria, as organizações representativas do sector e as organizações não governamentais que promovem estes valores”.
No documento, Pedro Cunha Serra dá o exemplo dos regadios públicos, que “carecem de reabilitação e modernização”. Na zona da bacia do Tejo, “a esmagadora maioria dos agricultores realiza do seu bolso todos os investimentos necessários e pratica uma agricultura de regadio que é modelar, eficiente, moderna e avançada tecnologicamente”. Todavia, nem todos irão dispor da capacidade de modernizar sozinhos, por isso o Estado e os seus planos, como o PRR, têm de tornar-se mais interventivos junto do setor agrícola.
Muitos outros podem ser referidos, entre eles “muitos pequenos aproveitamentos que requerem algum investimento público em obras de captação e adução de água, ou até mesmo da simples proteção contra inundações e drenagem dos terrenos”. .
O Recenseamento Agrícola 2019 (RA 2019) aponta no mesmo sentido: a área regada tem vindo a aumentar acompanhando a empresarialização na agricultura e a par de um inédito aumento da Superfície Agrícola Utilizada (SAU), de uma expansão e modernização de muitas culturas e de uma concentração fundiária em grandes unidades produtivas, contrariando o abandono da catividade agrícola que se vinha registando. O RA 2019 revela-nos que o número de sociedades agrícolas em catividade mais que duplicou nos últimos dez anos e que as empresas agrícolas, embora representem apenas 5% das explorações, têm uma importância crescente na estrutura produtiva, explorando 36% da SAU (+9 % do que em 2009), produzindo 56% dos efetivos pecuários e empregando cerca de 56 mil trabalhadores, o que corresponde a 77% da mão de obra agrícola assalariada com ocupação regular.
O PRR aponta projetos que terão como beneficiários os agentes económicos que asseguram a capacidade produtiva e a criação de riqueza, logo “os agricultores fazem parte deste lote de agentes económicos”. A CAP já deu o seu contributo para a discussão e a definição do quadro de prioridades que deve presidir à aplicação destes recursos financeiros numa ótica da promoção de valores, de solidariedade, de sustentabilidade, de desenvolvimento equilibrado do todo nacional, de valorização dos recursos naturais e de defesa contra as alterações climáticas.
*Este artigo teve como fonte o documento estratégico “Água e Agricultura” e foca-se no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).