“O contexto do risco de incêndios para este ano é preocupante”
O contexto do risco de incêndios para este ano é “preocupante”, com o impacto da pandemia de covid-19 a juntar-se às preocupações já anteriormente existentes, segundo uma nota ontem divulgada pelo Observatório Técnico Independente da Assembleia da República, citada pela Lusa.
“O contexto do risco para o ano corrente é preocupante”, lê-se no documento, que aponta para a “situação de crise pandémica devido à covid-19, com redução da mobilidade geral da população, e com confinamento especial de grupos de risco, com medidas de distanciamento físico – erradamente designado por ‘social’ – e com restrições à permanência de um número elevado de pessoas em espaços limitados”.
Este novo enquadramento vai influenciar a constituição de equipas, de guarnições, de tripulações de aeronaves, de equipas helitransportadas e postos de comando, “o que levará necessária e obrigatoriamente à elaboração de um plano de contingência”, sublinha a entidade, acrescentando que os trabalhos decorrem “numa altura em que é incerto o conhecimento sobre a evolução da pandemia nos próximos meses”.
De acordo com a análise ao dispositivo de combate aos incêndios rurais em 2020 feita pelos peritos do observatório, para além da questão da covid-19, “mantêm-se muitas das preocupações anteriores”, uma vez que “para além da influência das alterações climáticas, também a suscetibilidade do território à ocorrência de incêndios rurais não diminuiu”.
O observatório salienta que tem vindo a chamar “a atenção para as metas de ocupação por espécie estabelecidas pelos Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF) para 2030 e 2050 (OTI 2018)” e que “a revisão destas metas decorre da necessidade de adequar o coberto florestal à redução do risco de incêndio, através da redução da área das espécies mais inflamáveis como o eucalipto e o pinheiro bravo e a inversa expansão de espécies folhosas como os carvalhos”.
Os especialistas consideram que os PROF “continuam a ser o instrumento para a redefinição das florestas no sentido de aumentar a sua resiliência, impondo a definição de um coberto e modelos de gestão adequados e favorecendo a expansão de espécies menos inflamáveis”.
Por outro lado, “mantêm-se as fragilidades quanto a peças do planeamento, que assenta uma vez mais no mapa de perigosidade, distribuindo os recursos e meios com base nesta cartografia”, refere o observatório, vincando que “já chamou a atenção para o risco de que o planeamento operacional tenha por base esta cartografia”. Isto, porque “classifica como de alta perigosidade zonas recentemente percorridas por incêndio”, frisou, ou seja, “este processo resulta na sobrevalorização do risco de incêndio em áreas já ardidas em detrimento de outras zonas do país com maior risco potencial”.
Mais, segundo o observatório, também se regista que o presente Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR) “não reflete explicitamente as preocupações vertidas nos estudos que o Observatório tem realizado, tanto no posicionamento estratégico para a primeira intervenção, como para a importância da intervenção no combate noturno, que se revelou muito pouco eficaz nos incêndios de Monchique e de Vila de Rei analisados por este Observatório”. A entidade sugere que “o dispositivo poderia dispor de equipas especializadas com maior mobilidade e autoridade de intervenção nos teatros de operação mais complexos”.
O observatório regista igualmente “alguma falta de integração do dispositivo de combate com o restante dispositivo do Sistema Integrado de Gestão de Fogos Rurais, nomeadamente em relação às componentes de vigilância, deteção, defesa das populações ou investigação das causas”. E alerta que “a pouca integração destes aspetos resulta da falta de organização de um verdadeiro sistema integrado com coerência territorial e da inexistência de um Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, questão para a qual este Observatório tem sistematicamente alertado”.
Por fim, os especialistas registam que a análise feita incide apenas sobre a descrição do DECIR, e, em particular na quantidade de meios disponíveis para combater os incêndios. “Sabe-se, no entanto, que a eficiência e eficácia do combate, particularmente em situações mais complexas, depende fortemente da qualidade da intervenção”, realça o observatório, concluindo que isso “exige cada vez maior ênfase na formação e qualificação dos agentes”.