No Alentejo “desde cedo se percebeu que esta província portuguesa tinha um grande potencial hidroagrícola”

Na passada sexta-feira, 31 de março, a CAP (Confederação dos Agricultores em Portugal) promoveu uma conferência na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, para falar da gestão da água no setor agrícola. Neste encontro foi apresentado o documento estratégico “Água e Agricultura”, de Pedro Cunha Serra, que já ocupou a presidência do Instituto Regulador de Águas e Resíduos ou do Grupo Águas de Portugal e que ainda coordenou os trabalhos de elaboração do Plano Nacional da Água.

Num texto que contempla a importância da gestão da água na atividade agrícola, há um foco principal no Plano Nacional de Regadios (PNR), que apresenta um roteiro por quatro regiões distintas (zonas homogéneas), cada uma “com características próprias no que toca aos solos, às culturas praticadas, à acessibilidade e abundância dos recursos hídricos e ao tipo de propriedade”.

A Zona Homogénea 2 corresponde ao Alentejo, sendo a “parcela do território nacional onde o regadio tem tido maior expansão”, devido ao Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva (EFMA) e à Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas de Alqueva (EDIA). 

No documento, Pedro Cunha Serra, dá conta que o regadio público em Portugal nos moldes em que é conhecido, iniciou-se no Alentejo, pois “desde cedo se percebeu que esta província portuguesa tinha um grande potencial hidroagrícola”, particularmente na bacia do rio Sado. Assim, afirma que foram “muito importantes os trabalhos levados a cabo pela Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola (JAOHA) nas décadas de 1940 e 1950, o Aproveitamento Hidroagrícola (AHA) do Vale do Sado, com origem na albufeira criada pela barragem do Pego do Altar, e o Plano de Rega do Alentejo, em 1957. Igualmente relevantes foram os trabalhos da construção da barragem de Alqueva, iniciados em 1976, com alguns entraves ao longo do tempo. Porém, “é hoje um dos ex libris da agricultura nacional”.

O PNR identificou nesta região “36 projetos suscetíveis de serem apoiados, entre estes o Xévora, Caia, Campilhas, Vidigueira, Monsaraz, Lucefecit, Minutos, Vale do Sado, Vigia”, lembrando que hoje em dia alguns beneficiam de águas represadas em Alqueva.

O EFMA ensina, diz ainda o autor do documento, a “trazer água das bacias onde ela está disponível para as bacias deficitárias sem grandes impactes ambientais e com custos contidos. A água do Alqueva é utilizada para a rega e outros usos na bacia do Sado e não são conhecidos prejuízos ou impactes ambientais negativos de algum alcance”. Além disso, perante as alterações climáticas, “este é um ensinamento que devemos reter, por exemplo para resolver com as águas da bacia do  rio Douro uma parte do défice hídrico que se observa na bacia do Tejo, intensificando o uso do transvase Sabugal (rio Côa, na bacia do Douro) – Meimoa (ribeira da Meimoa, na bacia do  Tejo)”. 

A margem esquerda do Guadiana é “território agrícola em que o investimento público no regadio tem sido sistematicamente negligenciado”. São exemplo disso os produtos DOP como o queijo de Serpa, o azeite de Moura e o presunto de Barrancos, cujos sistemas de produção que sem um complemento de modernidade não serão viáveis, afirma Pedro Serra Cunha.

Face a isto, o próprio enumera situações em que o regadio no Alentejo deve continuar a ser aposta: a barragem do Enxoé, cujo alteamento estava previsto em vista a permitir o regadio, mas que não aconteceu; o AHA do Abrilongo, no Xévora antes deste entrar em Espanha, pois na desatenção dos portugueses são os espanhóis que estão a aproveitar as águas da albufeira desta barragem construída por Portugal para regarem as suas parcelas; o enorme volume de armazenamento  da albufeira do Caia que se encontra por aproveitar, sendo mais de 190 milhões de metros cúbicos de volume útil da albufeira para a rega de apenas 7.300 hectares.

Assim, o PNR diz ser “possível potenciar e valorizar os investimentos realizados a seu tempo, procedendo à ampliação dos regadios, à semelhança do que está a ser feito agora com Alqueva”. 

 

*Este artigo teve como fonte o documento estratégico “Água e Agricultura” e centra-se na zona alentejana.