NEC: Uma empresa de inovação social
Foi com o intuito de percebermos de que forma o know-how de uma gigante japonesa, presente em Portugal há 21 anos, pode ajudar as cidades portuguesas a melhorar a eficiência no uso dos seus recursos que a Ambiente Magazine esteve à conversa com João Paulo Fernandes, diretor-geral de Vendas e Marketing da NEC, que nos falou de alguns dos projetos desenvolvidos a nível nacional.
Como entrou a NEC em Portugal?
A NEC iniciou a atividade em Portugal há 21 anos, por aquisição de uma empresa que já existia, a Systel – Sistemas de Telecomunicações, que fazia parte da Centrel. Na altura esta tinha três grandes clientes em Portugal: a PT, fornecimento de variados tipos de equipamentos, Forças Armadas Portuguesas, para a qual desenvolvia rádios, e CP, para a qual desenvolveram o sistema rádio que está ainda hoje a bordo dos comboios. Quando a PT faz a digitalização de toda a sua rede, a Systel encontrou algumas dificuldades e é nessa altura que a NEC entra em Portugal, pelo perfil fabril que tinha. Tendo em conta que a Systel fabrica equipamento de telecomunicações aproveitou a empresa japonesa para trazer para Portugal o fabrico de alguns produtos que vendia para a Europa (feixes hertzianos). O que existe atualmente em Portugal, ao nível da presença da NEC, é uma atividade comercial de todas as soluções do grupo.
Que projetos desenvolveram a nível nacional?
Na zona do Ribatejo estamos envolvidos com uma empresa da indústria do tomate. É o segundo ano de uma fase piloto, a amadurecer a tecnologia. No setor agrícola existem outros desafios, pois temos um calendário próprio que nos é imposto pelo clima e pelo desenvolvimento da cultura em si.
Estamos ainda, utilizando um conjunto de ferramentas tecnológicas, a dar recomendações ao produtor que permitam aumentar a produção com um menor consumo de fertilizantes e água. Isto implica a aplicação de sensores para medir virtualmente tudo o que possamos fazer. Existem, por exemplo, sensores para medir a humidade do solo, no ar, radiação solar, pluviosidade, entre outros. A microeletrónica permitiu desenvolver sensores que podem ser usados para tudo o que queiramos, sendo cada vez mais pequenos e baratos, através de comunicações móveis, sem fios, para um ponto central, onde os dados são analisados e se transformam em informação de gestão.
Isto é possível pela junção de duas vagas tecnológicas: a medição daquilo que até hoje não era possível e o processamento dessa quantidade de dados em tempo útil e com informação possível de ser dada aos interessados.
Pode especificar um pouco mais o que têm feito?
Em concreto, no campo da agricultura, estamos a medir uma série de parâmetros ao nível de solo e ar, localizados no campo, onde o produtor está a trabalhar. Recolhemos informação, como saber as características do nível do solo, quais as culturas que o produtor ali quer fazer crescer, sendo que neste caso estamos a falar da produção de tomate de indústria. Esta informação, recolhida hora a hora, é colocada sobre um modelo biológico de crescimento do tomate, que está em computador.
Fizemos aqui uma coisa muito interessante, e que começa a ser cada vez mais vista nesta áreas das soluções sociais, ou seja, vários parceiros juntarem-se para construir cenários a nível tecnológico. Neste caso estamos em parceria com institutos de agronomia. Os profissionais da tecnologia têm que se juntar a outras áreas de conhecimento científico para, cruzando as áreas, poder chegar a uma solução que traz benefícios ao gestor do serviço e aos cidadãos. Neste caso, para o produtor agrícola e para o consumidor de tomate, que pretende uma maior produção a um preço mais reduzido.
Temos então um campo de produção de tomate industrial simulado em computador, assim como o crescimento do próprio tomate simulado. O que é que conseguimos em computador que não é possível em campo real? O que fazemos é manter certas variáveis do modelo biológico de crescimento mas variando determinadas componentes, como por exemplo, a capacidade de água no solo ou raízes, e verificamos que efeitos tem na planta. Assim como outras componentes como o azoto. Conseguimos construir cenários para várias situações até chegar ao conjunto de variáveis de entrada que dão dia-a-dia o crescimento otimizado do tomate, gerando recomendações diárias ao produtor, que visam a produção otimizada.
Em que fase do projeto estão?
Estamos na fase piloto, no segundo ano. O ano passado já obtivemos resultados bastante interessantes. Estamos agora a afinar os modelos em computador para refletirem o mais possível a realidade do terreno.
O ano passado recebíamos os dados de uma amostra dos campos em questão, e enviávamos um relatório sobre o que deveriam os produtores fazer. Aquilo que entendemos no final da época que deveria ser melhorado, este ano estamos a aplicar, ou seja, geramos os relatórios, mas também desenvolvemos uma aplicação que lhes permite ter os dados na hora. O fecho do ciclo é quando através dos dados recolhidos as ordens sejam dadas aos sistemas para atuarem, seja de rega, como a outros níveis.
E relativamente às smart cities, o que tem a NEC feito?
Nas cidades temos vários serviços, desde abastecimento de água, recolha de resíduos, entre outros. Todos estes serviços são sistemas, processos que os municípios implementam e põem ao dispor dos cidadãos. O que acontece é que não são dados que permitam com frequência entender ou medir se o desempenho do serviço é aquele que tinha sido originalmente planeado, e se está a ser desempenhado com os recursos necessários ou se poderia ser feito com menos recursos. É aqui que as tecnologias de sensorização e de Big Data podem dar uma ajuda. Os processos na maior parte das cidades funcionam por cadeia aberta. Sendo que um sistema em cadeia fechada é aquele em que realimentamos informação relativamente ao seu desempenho para o planeamento do processo que está ser implementado, quando fazemos essa realimentação permitimos que o sistema seja corrigido. Estamos a informar quem o planeou como foi o seu desempenho para se entender se é ou não aquilo que se tinha pensado, de modo a saber-se o que é necessário e onde corrigir-se. Os serviços que temos nas cidades tipicamente não têm esta informação de saída, o que leva a que os sistemas sejam ou menos eficientes, ou, no limite, possam não estar a fazer aquilo que se pretendia. Ou seja, funcionam por aquilo que designamos de cadeia aberta; a saída não é alimentada à entrada do sistema. Isto indica que os sistemas são instáveis e que no limite possam colapsar.
Hoje é possível colocar sensores em praticamente todos os serviços, sejas nos resíduos ou nas águas, iluminação, semáforos, para perceber o que realmente está a acontecer e qual o desempenho do serviço que estamos a proporcionar aos cidadãos. É isso que os sensores permitem medir. Estamos a fazê-lo em Santander, a medir cada caixote de lixo e perceber se ele está cheio ou vazio. Existem também sensores para se detetar perdas de água. O objetivo final é maior eficiência na utilização do recurso água. Da mesma forma ter sensores ao nível da iluminação na cidade, para aumentar ou diminuir a iluminação de acordo com as pessoas ou automóveis que transitem. No caso dos resíduos, por exemplo, podemos só mandar as viaturas quando os contentores estiverem cheios. Necessitamos de saber se o desempenho dos serviços estão de acordo com o que pretendemos deles e se estão a ser feitos com o consumo de recursos que são necessários, e não mais do que isso.
Temos um conjunto de serviços montados para estas diferentes áreas: mobilidade, segurança, águas, resíduos, iluminação e inclusivamente uma plataforma central que agrega num painel de instrumentos central da cidade informação que vem de todas estas áreas permitindo ter uma visão agregada, centralizada, coordenada de todos os diferentes serviços da cidade, à medida que todas estas novas medidas vão ser implementadas. São essas as nossas soluções no âmbito das cidades inteligentes.
Em Portugal temos projetos-pilotos nestas áreas, estamos a discutir esta plataforma agregadora com um ou dois municípios para que percebam os benefícios disto.
Como esperam que seja a evolução do negócio em Portugal?
Existem naturalmente expectativas interessantes, porque estamos a falar de uma área que abrange as soluções sociais para a cidade, agricultura, energia, entre outros, que se prevê que tenham um crescimento bastante significativo. A expectativa é que, à medida que os decisores vão conhecendo melhor as capacidades/ benefícios das novas soluções e entendam as suas mais-valias, que a NEC estando na linha da frente da promoção destas soluções tenha um papel relevante na sua concretização.
(Este texto pode ser lido na íntegra na Edição 72 da Ambiente Magazine)