As autarquias têm cada vez mais um papel preponderante na caminhada conjunta que se tem feito para a transição ambiental. A Ambiente Magazine foi reconhecer perto de alguns municípios portugueses como estes se transformam em agentes fundamentais da sociedade para esta mudança tão urgente.
As alterações climáticas já não só moda ou estão só de passagem, como se costumava ouvir. Este tema está cada vez mais na ordem do dia até porque as suas implicações são reais e percetíveis nos seres humanos, nos animais e nos ecossistemas.
Cabe então aos principais agentes da sociedade fazer parte da mudança urgente que tem vindo a ser pedida, dia sim, dia não, por vários meios, sejam eles noticiários ou redes sociais. E entre estes agentes potenciadores de mudança estão os municípios/autarquias, que têm, ao longo dos últimos anos, trabalhado e adotado várias medidas para desenvolverem um território mais sustentável.
Como é o caso da Câmara Municipal do Barreiro que tem procurado intervir em áreas distintas, desde a Qualidade de Vida, à Responsabilidade Ambiental, à Mobilidade e à Oportunidade e Investimento – os quatro pilares da estratégia do Plano Diretor Municipal.
“No que diz respeito à eficiência energética, toda a iluminação pública do município é feita com recurso a luminárias LED, tendo sido eliminadas por completo as lâmpadas a vapor de sódio e mercúrio. Todas as salas de aula, das escolas do Ensino Básico, estão dotadas de luminárias LED e, até ao final do ano, prevê-se que também as escolas do 2º, 3º ciclo e secundárias, serão alvo de substituição integral por sistemas LED. Foram também implementados diversos sistemas de produção e autoconsumo de energia renovável nos equipamentos municipais”, começa por exemplificar a autarquia.
Mas a aposta na mobilidade elétrica foi uma das principais prioridades, sendo o Barreiro, atualmente, o município com o maior número de Postos de Carregamento de Veículos Elétricos por cada 10 mil habitantes. No total, contam-se 91 postos de carregamento rápido e 17 em espaço de domínio privado, mas com acesso público. “Temos realizado ações de promoção do uso dos modos de mobilidade suaves, através da concretização da Rede de Percursos Cicláveis do Barreiro e dos transportes públicos”.
Em outras áreas, o Barreiro tem dotado a cidade com mais espaços verdes e com a plantação de espécies autóctones, além do desenvolvimento de políticas municipais que permitam poupar água, energia e resíduos. “Em 2022 o município iniciou a recolha seletiva de biorresíduos, junto de áreas residenciais compostas por moradias, assim como a recolha porta-a-porta em estabelecimentos do setor HORECA (estabelecimentos de restauração e similares), estabelecimentos de ensino e instituições, dando um novo destino de valorização a restos alimentares e de jardim. Atualmente, o município encontra-se a alargar a recolha seletiva de biorresíduos a áreas residenciais compostas por prédios. Em 2023, o município iniciou conversações com diversas entidades de recolha de têxteis com o objetivo de aumentar a disponibilidade de equipamentos existentes. Prevê-se a conclusão do processo em 2024”.
Já no caso de Leiria, o vereador da Câmara, Luís Lopes, diz estar a “realizar investimentos significativos em infraestruturas ecológicas, como a criação de parques urbanos, ciclovias, melhoria de transportes públicos, restauro ecológico de áreas ardidas, assim como promover investimento em centrais de valorização energética usando efluentes agropecuários, visando não só melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, mas também promover a mobilidade sustentável. Além disso, estamos a planear investimentos em programas de educação ambiental e em projetos de adaptação às alterações climáticas”.
Para acelerar este caminho, o responsável afirma que “é crucial continuar a investir em projetos e tecnologias verdes e em medidas de incentivo à sustentabilidade, bem como reforçar parcerias com instituições e empresas que partilhem os mesmos objetivos ambientais. É absolutamente crucial garantir o envolvimento da comunidade em todas as etapas, transmitindo confiança e responsabilização de todos os atores”. Mesmo assim, até ao momento, o trajeto feito pelo município de Leiria “é extremamente positivo”, apesar de existir espaço para melhorias.
Rumando mais a Norte, no município do Porto, Filipe Araújo, vice-presidente da Câmara, ressalta, desde já, que “não há nenhuma área no espectro de desafios ambientais que encontrámos há 11 anos, que não tenha sido abordada e onde não tenhamos agitadas as águas, com resultados positivos visíveis e sempre respaldada por rigor técnico-científico das equipas municipais e por parte da Academia que tem sido parceiro constante neste percurso”.
” A nossa atuação vai desde a aposta nas energias limpas ao incentivo a uma mobilidade mais sustentável, da promoção de uma cidade cada vez mais circular à otimização e valorização de resíduos, passando pela aposta na educação para a sustentabilidade, pela boa gestão do ciclo urbano da água, pela expansão da estrutura verde, pela promoção das florestas urbanas e das soluções baseadas na natureza, pela proteção da população ao ruído, ou mesmo pela promoção do bem-estar animal”, explica o responsável, acrescentando que “o conhecimento profundo dos riscos e o progressivo aumento das nossas ambições como cidade que quer liderar pelo exemplo, têm colocado a transição climática como um dos temas prioritários da atuação deste Executivo, que se desdobra em dois eixos absolutamente interligados e complementares”, que são a descarbonização da cidade até 2030, com o desígnio do Pacto do Porto para o Clima, e a adaptação do território às alterações climáticas.
Sobre medidas mais concretas, Filipe Araújo fala sobre o aumento da eficiência energética dos edifícios, com a dotação dos edifícios municipais com painéis fotovoltaicos, e na expansão da rede pública de transportes através de novas linhas de metro, a ser construídas neste momento, e da redução de preços para os cidadãos se deslocarem, com a opção de gratuitidade para estudantes até aos 23 anos e 22 viagens grátis por ano para utilizadores do Cartão Porto. Noutras áreas, a melhoria da resiliência da cidade com a expansão de floresta nativa e da rede de hortas municipais, e a construção de parques-esponja com capacidade para reter, armazenar e infiltrar 100% das águas.
“O Porto tem apresentado ótimos resultados, tendo sido inserido na Lista A do CDP, entre as cidades com melhor desempenho ambiental nos anos de 2020, 2021 e 2022. Globalmente, temos submetido os nossos desenvolvimentos e ações a avaliações externas que nos têm ajudado a validar que o nosso trabalho está a ir na direção certa”, congratula-se o vice-presidente do município.
Investimento e adaptação são dificuldades apontadas pelas autarquias
Apesar dos progressos que os municípios têm feito, ainda há dificuldades a serem enfrentadas na implementação de novas soluções ambientais: “não podemos descurar não só a parte socio económica, mas também a dificuldade de adaptação do território à uma nova realidade. Um bom exemplo disso é a utilização de transportes públicos. Não basta apenas criar gratuitidade ou melhorar os equipamentos. Sem que haja uma conjugação com o estilo de vida e necessidades do utilizador, não terá o sucesso desejado”, começa por apontar Luís Lopes, vereador da Câmara de Leiria. “Tendo em vista a construção de uma cidade mais sustentável, estabelecemos metas ambiciosas para redução de emissões de carbono, aumento da eficiência energética e melhoria da qualidade do ar e da água. Estas metas são acompanhadas por uma calendarização clara e transparente, que nos guia na implementação de medidas concretas”.
Por sua vez, no Barreiro, as projeções climáticas apontam para “uma potencial diminuição da precipitação total anual e para um previsível aumento das temperaturas, em particular das máximas no outono. É projetado, ainda, um aumento da frequência de ondas de calor e de eventos de precipitação intensa ou muito intensa. Estas alterações poderão implicar um conjunto de impactos sobre o território concelhio bem como sobre os sistemas naturais e humanos que o compõem. Mesmo na presença de respostas fundamentadas em função dos cenários climáticos futuros, existirão sempre riscos que irão afetar o território em diversos aspetos ambientais, sociais e económicos”.
Mas para combater isto, o município propõe “Devemos encorajar o envolvimento de todos, ouvir as preocupações e sugestões dos cidadãos e promover espaços de diálogo e colaboração”, sendo até “interessante estabelecer parcerias com organizações ambientais, empresas sustentáveis e instituições de pesquisa para desenvolver e implementar estratégias inovadoras de preservação e uso responsável dos recursos naturais”.
Um dos outros grandes desafios que o Barreiro também enfrentará nos próximos anos prende-se com a redução de emissões de CO2eq no território. “O Barreiro tem metas de redução de, pelo menos, 55% em 2023, 60-75% em 2040 e a neutralidade carbónica até 2050. Só será possível alcançar estas metas através da melhoria da eficiência energética e da promoção da produção e utilização de energia mais limpa, tal como formulado no Pacote de Medidas da União Europeia sobre o Clima e as Energias Renováveis”.
Para a Câmara Municipal do Porto, “para lá dos bloqueios e do atraso de algumas das instituições da Administração central, há também dificuldade ao nível do financiamento de um conjunto tão vasto e pesado de investimentos. Os municípios e as entidades públicas têm de tomar a dianteira dos investimentos climáticos, liderando pelo exemplo, mas é crucial a mobilização do capital das organizações privadas para que seja efetiva esta transição e atingidos os objetivos, dado o volume de investimento necessário”.
E sendo o grande objetivo a neutralidade carbónica da cidade até 2030, o que implica a redução da emissão de gases com efeito de estufa em 85% (face a 2019), este apenas será possível “se todas as entidades, Município, Governo central, instituições europeias, organizações privadas e cidadãos estiverem juntos a trabalhar na mesma direção”, ressalva Filipe Araújo.
Por exemplo, “o Porto tem uma autoestrada [a VCI] que atravessa a cidade e que é, sem sombra de dúvida, o maior problema ambiental do Porto. Ora, esta estrada é gerida pelo Estado Central através da Infraestruturas de Portugal que põe e dispõe, mas que não resolve o problema fundamental de trânsito absurdo existente nesta via. Isto põe em causa a nossa ambição climática. A somar a isto, veja-se, por exemplo, o caso dos painéis fotovoltaicos do bairro Agra do Amial instalados em 2022 que, aos dias de hoje, ainda não produzem energia que possa ser entregue às famílias que lá vivem porque o processo não avança do lado da DGEG. Tudo isto me preocupa muito porque o município tem estratégias, mais ambiciosas ou até alinhadas com estratégias nacionais, mas depois há uma inoperância gritante das instituições centralizadas”, acusa ainda o vice-presidente.
Estruturas ecológicas urbanas são “novo paradigma de gestão sustentável”
“As estruturas ecológicas urbanas são, neste momento, fundamentais e estão no nosso dia-a-dia de trabalho. O continuum naturale, constituído por arruamentos arborizados, pequenos espaços verdes, médios e grandes. Tudo interligado, desde a extrema do concelho, da zona de Coina, passando pelo Mata da Machada, seguindo em corredor até à frente ribeirinha do Tejo, sempre com estrutura verde. O nosso objetivo é claro, trazer a natureza, manter a mesma e oferecer espaços agradáveis, quer para contemplação, fruição, e também em termos ecológicos, com todas as importantes funções que estes ecossistemas, mesmo que ecossistemas mais artificializados, mas que cada vez mais se pretendem resilientes com uma gradual mudança de paradigma e que comecem, por isso, a surgir espaços verdes mais autóctones e mais adaptados ao nosso clima, resistentes a alterações climáticas extremas e, claro, que necessitem de menos rega e manutenção”, afirma a Câmara Municipal do Barreiro.
Pelo seu lado, Leiria reconhece “a importância de preservar e valorizar os espaços verdes dentro da cidade, não só como refúgios naturais para a biodiversidade, mas também como elementos essenciais na regulação do clima e na promoção do bem-estar dos cidadãos”.
Por fim, o município do Porto considera que “a Estrutura Ecológica Urbana representa um novo paradigma de gestão sustentável do território”, proporcionando “novas oportunidades de permeabilizar o solo e aumentar a estrutura verde da cidade, sem deixar de fora as massas de águas. Queremos continuar a arborizar e expandir os espaços verdes, transformando-os em instrumentos ativos para tornar o território do Porto mais resiliente através das soluções de base natural e diminuindo a distâncias da população aos espaços verdes, através de novos jardins de proximidade”.