Um grupo de cientistas descobriu níveis “extraordinários” de poluição em duas das zonas mais profundas dos oceanos, onde se pensava que as substâncias tóxicas criadas pelo homem não chegavam em quantidades preocupantes. Uma investigação publicada ontem por cientistas da Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália, demonstra o contrário, afirma esta terça-feira o Jornal i.
Os dados indicam que as raras criaturas que vivem na fossa das Marianas e na fossa de Kermadec estão mais intoxicadas por substâncias proibidas há décadas do que alguns dos animais que vivem nas zonas mais poluídas da superfície: os crustáceos investigados nos dois locais, aliás, apresentam 50 vezes mais substâncias tóxicas do que os caranguejos dos rios mais poluídos da China.
“Ainda pensamos nas profundezas dos oceanos como um reino remoto e intato, a salvo do impacto humano, mas a nossa pesquisa demonstra que, lamentavelmente, isso não podia estar mais distante da realidade”, explicava ontem ao diário britânico “The Guardian” o homem que chefiou a investigação, Alan Jamienson, e cuja equipa identificou dois tipos-chave de químicos industriais tóxicos que foram proibidos na década de 1970, que não se degradam no ambiente e se designam como poluentes orgânicos persistentes ou POP. “Mesmo no fundo das trincheiras profundas como a das Marianas vivem animais que procuram alimento de uma forma surpreendentemente eficaz, como os anfípodas (pequenos crustáceos) de dois centímetros que analisámos. Por isso, sempre que algum material orgânico chega lá abaixo, estes animais surgem em grandes números para o devorar”.
Os investigadores estavam já à espera de encontrar alguma poluição nas duas trincheiras do Pacífico, uma vez que caem lá os corpos decompostos de animais que vivem mais à superfície e o mesmo acontece com alguns materiais poluentes. O que surpreendeu foi o nível “altíssimo” de poluição que encontraram nos animais que lá vivem. De acordo com o artigo que publicaram no “Nature Ecology and Evolution”, uma publicação de investigação científica, surpreende-os também o alcance da poluição, encontrada em grandes níveis “em todas as amostras de todos os animais em todas as profundidades das duas trincheiras”.
A descoberta, publicada um ano depois de uma expedição norte-americana ter encontrado vários detritos humanos numa das encostas da fossa das Marianas – que chega a ter dez quilómetros de profundidade -, demonstra o alcance do material tóxico humano. “As trincheiras estão a vários quilómetros de distância de qualquer fonte industrial e isto sugere que o efeito dos poluentes tem um grande alcance, apesar das regulações dos anos 70”, comentava ao “Guardian” Kaherine Dafforn, da mesma universidade que conduziu a investigação.