“Excessivamente extensa, complexa e frequentemente pouco ajustada à realidade Portuguesa”. É assim que Tiago Fiúza, sócio da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados, e Filipe da Veiga Malta, associado sénior da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados, se pronunciam em relação à legislação ambiental em Portugal.
Apesar dos últimos anos terem sido “particularmente pródigos em produção legislativa ambiental”, com a “introdução de novas leis, de caráter inovador”, como é o caso da “Lei de Bases do Clima”, os especialistas dão nota que, por força da “urgência climática”, definem-se “metas utópicas, criam-se encargos excessivos e forçam-se transições em regime de desigualdade concorrencial”, ou seja, “os grandes poluidores mundiais continuam a produzir como sempre e introduzem os seus produtos na Europa em posição desigual com os produtores europeus”.
No entender de Tiago Fiúza e de Filipe da Veiga Malta, a legislação portuguesa em matéria ambiental assume a função de “farol”, sendo exemplo disso, o Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030 ou a Lei Bases do Clima, pelo que “a fiscalidade terá uma palavra decisiva no cumprimento das metas propostas”, designadamente por via de “incentivos fiscais”. Contudo, a “guerra”, a “atuação da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP)”, a “recessão mundial”, o “crescente interesse dos investidores privados” e o “desenvolvimento de novas tecnologias” constituirão o “verdadeiro motor” da transição energética. No campo da mobilidade elétrica e energias renováveis, “o legislador tem procurado acompanhar o rápido desenvolvimento da iniciativa privada, ainda que com evidentes dificuldades”, por exemplo, “em Lisboa, não temos ainda uma regulação da chamada mobilidade suave”, situação que deverá ser melhorada através de “maior colaboração entre público e privado”, indicam.
Ao nível de entraves, os especialistas apontam a “complexidade e a extensão” da legislação, que dificultam o seu conhecimento pela população em geral (e pelas próprias entidades públicas): “Os investidores privados têm feito o seu caminho e prova disso é que, só agora, começamos a discutir, legislar e implementar as primeiras “Comunidades de Energia Renovável”, que acreditamos serem um dos pilares de sustentabilidade ambiental e autonomia energética a médio e longo prazo, mas esta novidade legislativa já vinha sendo “pedida” pelos privados faz tempo”.
“Uma interação mais próxima com os privados contribuirá para a evolução da legislação e dos respetivos processos”
No que se refere ao “excesso de burocracia”, Tiago Fiúza e de Filipe da Veiga Malta dão nota que a implementação de projetos de energia, como as “Unidades de Pequena Produção (UPP)” ou as “Unidades de Produção para Autoconsumo (UPAC)”, não é em regra um processo especialmente burocrático: “Outras soluções (eólica ou hidrogénio) já exigem processos mais exigentes”. Mas, existem vários exemplos de “simplificação de processos”, como é o caso da “instalação de postos de carregamento em condomínios, a instalação de UPACs, ou o Autoconsumo Coletivo em condomínios” apesar de exigirem sempre a “intervenção ou contratação” de profissionais especializados: “A verdade é que os problemas surgem mais associados às redes físicas de transporte e de fornecimento de energia”. Ainda assim, o excesso de burocracia pode “atrasar a implementação de projetos”, tendo como consequência o “incumprimento das metas definidas” nos vários acordos internacionais: “Uma interação mais próxima com os privados contribuirá para a evolução da legislação e dos respetivos processos. O poder político deve atuar cada vez mais como potenciador de iniciativas, simplificando processos, melhorando a comunicação direta entre agentes”, precisam.
Avançar com projetos de energia limpa implica “encontrar um bom parceiro” que garanta, do ponto de vista “técnico e financeiro”, a correta “implementação, manutenção e exploração” das unidades de produção de energia instaladas e, inclusivamente, que “assegure as funções de gestão do sistema”. Depois, todas as soluções de produção de energia renovável exigem uma “localização ideal” de proximidade entre o “ponto de consumo e a instalação produtora de energia renovável” de modo a evitarem-se “perdas na rede”, um “correto dimensionamento das próprias instalações produtoras (dado que o armazenamento ainda não é uma verdadeira solução)” e a “robustez financeira dado o extenso período de amortização deste tipo de investimentos”.
Como notas finais, Tiago Fiúza e de Filipe da Veiga Malta consideram que “num mundo a várias velocidades”, em que o impacto da Europa é praticamente “uma gota no oceano”, a legislação nacional e europeia afigura-se frequentemente “excessiva e desajustada” da realidade efetiva: “É essencial discutirmos abertamente uma melhor conjugação de várias fontes de energia e dos vários tipos de mobilidade (elétrica e não elétrica), e apostarmos finalmente em transportes coletivos de qualidade e de cobertura nacional e europeia”. Em paralelo, “devemos garantir que produtos e serviços comercializados na Europa respeitam os mesmos pressupostos de produção, salvaguardando uma efetiva concorrência”, afincam. Tão importante é que o Estado e os Bancos tenham um papel essencial na “formação e apoio à conversão da indústria para processos ambientalmente mais adequados”, sendo necessária uma “progressiva simplificação de processos e maior colaboração entre os agentes envolvidos”, remata.