A falta de água obrigou Israel a mudar hábitos de consumo e a sentar-se à mesa com outros países para encontrar novas soluções para a sobrevivência do setor. O país, em que mais de 60% da sua superfície é deserto, sofre com baixa precipitação e com escassas fontes de água potável. Em entrevista ao Ambientemagazine.com, Einat Magal, especialista do Ministério de Energia e Recursos Hídricos de Israel, contou como a situação de seca extrema em Israel pode ensinar Portugal e outros países a utilizarem de uma forma mais consciente uma matéria-prima que deixou de ser garantida.
“Há muito a aprender connosco porque enfrentamos um problema sério. Termos uma grande falta de água num país tão pequeno e não termos empréstimos, nem ajudas comunitárias suficientes, torna tudo mais difícil. Os outros países podem aprender como enfrentamos, em poucos anos, tantos problemas relativos à escassez da água, fazendo face ao aquecimento global e à crise no setor, que se deve, também, a termos usado em excesso os nossos recursos naturais, o que piorou a qualidade da água”, salientou Einat Magal. “Por exemplo, em Lisboa, durante muitos anos houve secas e não havia água suficiente para a agricultura e nós, por outro lado, usamos em excesso os nossos recursos”, acrescentou.
Israel tem, de facto, sofrido, desde sempre com a falta de água, mas o problema só foi encarado seriamente na última década quando foi assolado por uma seca de sete anos. “Apenas em 2007, depois de anos rigorosos de seca, conseguimos colocar todos os stakeholders na mesma mesa e encontrar um caminho para fazermos coisas juntos e esta é a grande mudança que está a acontecer em Israel”, frisou. Uma tarefa que não foi fácil, devido a conflitos de interesses entre as diferentes partes interessadas. Só a criação da Water Authority, em 2007, marcou um ponto de viragem no setor. A partir de então, todas as tutelas com responsabilidades na água – ministérios da Economia e das Finanças, da Saúde e da Agricultura – passaram a reunir-se para tomarem decisões relevantes no setor.
Com uma parte considerável de alguns países em situação de seca extrema, como é o caso de Portugal, e com a água a tornar-se, cada vez mais, um bem mais escasso, Einat Magal acredita que Israel tem um papel importante em encontrar uma solução para este problema. “Nós temos, de facto, de encontrar a solução porque, depois de investirmos tanto no sector da água, seria ingrato não encontrarmos a grande resposta do problema”.
Reutilização das águas residuais: uma solução
Uma das respostas à escassez de água tem sido uma forte aposta de Israel na reutilização das águas residuais, assim como na poupança da água, incentivando gestos como a instalação de dispositivos de poupança deste recurso nas torneiras e aumentando a tarifa da água em 40%. Atualmente a tarifa da água em Israel cobre todos os custos, incluindo os de dessalinização, garantindo ainda o capital necessário para fazer face a investimentos em infraestruturas para tornar as redes de transporte mais eficientes e reduzir as perdas de água. Esta subida das tarifas não só consciencializou os consumidores domésticos de que a água é um bem finito, como permitiu eliminar o défice tarifário. Para diminuir o consumo foram também introduzidas quotas de utilização.
O país já é considerado líder mundial em reciclagem de águas residuais e fica muito acima de países que já dão cartas nesta área, como é o caso de Espanha, com 17% de água reutilizada, e Austrália, com 10%. O tratamento das águas residuais domésticas permite utilizar mais de 80% destas na agricultura, um valor que deverá subir para 90% no futuro.
A mais recente medida adotada pelo Ministério da Energia e de Recursos Hídricos de Israel foi a dessalinização da água salgada e água salobra. Para fazer chegar a água aos consumidores investiram em centrais de dessalinização (centrais que transformam a água do mar em água passível de ser usada na agricultura ou na indústria).“A dessalinização alterou verdadeiramente o paradigma porque deixamos de estar dependentes dos nossos recursos aquíferos”, explicou Einat Magal. No espaço de dez anos, abriram quatro centrais para remover o sal da água. Uma quinta central deverá entrar em funcionamento até ao final deste ano.
Para além disso, Israel também está interessada no impacto ambiental das plantas de dessalinização. “As plantas tiram água marinha mas, depois, devolvem-na com alguns processos químicos e temperaturas diferentes. O mesmo acontece quando temos um grupo de grandes plantas de dessalinização, localizadas no mar. Nós preocupamo-nos com este assunto e queremos mudar os químicos nas plantas de dessalinização para que haja menos consequências negativas no ambiente depois de serem libertados ou reciclando os químicos”.
Novos desafios
Outras grandes questões têm estado na agenda pública da república parlamentar localizada no Médio Oriente. Neste momento, há um grande debate em torno de uma decisão do Ministério do Ambiente. Esta tutela do Governo exigiu que o magnésio, que estava a ser retirado da água por ter efeitos benéficos para a saúde, voltasse a ser colocado na água dessalinizada, um tema controverso, na opinião de Einat Magal. Outro assunto em cima da mesa é o dinheiro gasto na energia para extrair água dessalinizada. “A energia relacionada com a água também levanta problemas. Hoje em dia, a energia e a água são o mesmo lado da moeda. Quando desperdiçamos água, desperdiçamos energia também”, explicou.
Ao mesmo tempo, as ideias não param de chegar. “Há ótimas ideias, como uma proposta pelos parceiros israelitas, que consiste em combinar o tratamento do fluxo da água da chuva com as águas residuais. Podemos começar a pensar em gerir zonas verdes com esta água e em criar cidades inteligentes. No inverno, podíamos usar principalmente água proveniente das inundações e da chuva e, no verão, usarmos a designada ‘água cinzenta’ ou águas residuais (das máquinas de lavar a roupa, por exemplo). Há muitas ideias a surgirem para estas smart cities e para melhorar a água dos esgotos e muitos outros diferentes tipos de água que temos, como a água marinha. O que é realmente muito necessário é um sistema forte de gestão do sistema de água”, garante Einat Magal.
No que diz respeito ao sector agrícola, que tem vindo a registar melhorias, as soluções tiveram de aparecer.”Durante anos o setor agrícola aprendeu mais usando menos água para os mesmos fins. Começou com a irrigação e, agora, há muitas companhias que apenas ensinam a manusear os seus próprios recursos, ensinam a pôr menos, não só água, como também menos pesticidas e menos energia”, explicou.
No futuro, Einat Magal espera que Israel possa caminhar no sentido de adotar estilos de vida mais modernos, com “piscinas, máquinas de lavar a loiça e comida fresca”. Os projetos para os próximos anos passarão. ainda, por evitar o desperdício de recursos, ter padrões para a qualidade da água e melhorar a qualidade do tratamento dos esgotos.
As boas relações com os países vizinhos também é uma das prioridades de Israel. “Temos de trabalhar e encontrar soluções juntos, fomentar relações diplomáticas, dar aos nossos vizinhos água. Por exemplo, o esgoto da Palestina podia vir para o nosso lado e ser tratado, queremos ligar o mar vermelho ao mar morto, enfim, há uma grande variedade de coisas que ainda devem ser feitas”, revelou.
“Desde que o nosso país encontrou formas de fazer as coisas melhor nós tentamos evoluir, encontramos formas de aprender mais com menos, descobrimos soluções para muitas coisas e continuamos num processo de mudança, estando, neste momento, a introduzir nova tecnologia e novas matérias. Nós queremos aprender e fazer mais mas nós já temos três décadas da história investidas a ensinar como melhorar o uso da água, por isso, só temos de estar otimistas”, concluiu.