Com a época de elevado risco de incêndios a aproximar-se a passos largos, Portugal volta a estar alerta para os perigos nas zonas rurais e florestais. A Ambiente Magazine falou com especialistas na área para perceber o que está a ser feito neste âmbito.
Paulo Lucas, membro da Direção da Associação ZERO critica o “pensamento positivo da tutela” de que “estar preparado se mede em milhões de gastos na componente de combate”. Defende que “mais meios de combate, como infelizmente temos verificado, nem sempre é sinónimo de mais eficácia”.
Para o dirigente da ZERO, “há ainda muito a fazer no trabalho de base para uma boa prevenção dos fogos rurais”. E essa prevenção não passa apenas pela limpeza dos terrenos. Paulo Lucas considera que “pensar nesta como a única intervenção que temos de efetuar numa lógica de prevenção não passa de uma ilusão”.
Assim, questionado sobre se Portugal está preparado para dar resposta à época de incêndios que se avizinha, o responsável da Associação ZERO afirma ser fundamental começar pelo princípio, isto é, pela ignição, “sem a qual não existe incêndio”. “É fundamental reduzirmos drasticamente as ignições”, reitera.
A par disto, Paulo Lucas nota, no incendiarismo, “que continua muito presente”, outro fator que deve ser relevado. “Sem grande resposta ao nível da prevenção destes crimes”, o representante da ZERO mostra que este fenómeno representa 28% do total de ocorrências investigadas em relação aos incêndios.
No início do passado mês de abril, ocorreu o primeiro incêndio significativo a nível nacional. Sobre o episódio, Paulo Lucas encontra a resposta nas alterações climáticas, “cujos efeitos resultam em períodos de seca mais prolongados”. Isso ajuda inclusive “a compreender o que se está a passar em meses em que não seria suposto ocorrerem fogos rurais”, sugere.
Todavia, enfatizando que “não há incêndios sem ignições e essas dependem do comportamento das pessoas”, Paulo Lucas considera “cada vez mais” ser preciso promover “um outro olhar” sobre a prevenção dos incêndios, nomeadamente quanto aos “sobrantes agrícolas e florestais, cuja má gestão dá origem à maior parte dos fogos rurais”.
Uma solução para “ir eliminando uma cultura que usa o fogo de forma incorreta e por vezes criminosa”, sugere o dirigente da ZERO, é, por exemplo, “fomentar a compostagem dos sobrantes, para que possamos devolver aos solos os nutrientes e a matéria orgânica de que necessitam”.
“Isso também evitaria a existência de uma poluição atmosférica nas áreas rurais, com efeitos sobre a saúde pública que têm vindo a ser negligenciados”, acrescenta.
O que esperar das medidas de prevenção e combate aos incêndios?
A Carta de Perigosidade de Incêndio Rural é uma das principais estratégias nacionais de apoio ao planeamento na prevenção e no combate aos incêndios rurais. Para Paulo Lucas, no entanto, apesar de esta ser “uma medida importante, que permite planear as ações de vigilância e o posicionamento dos meios de combate em alturas de maior risco de incêndio”, “não resolve o principal problema, que é o número elevado de ignições”.
Assim, à proposta de mencionar algumas ideias que possam ser implementadas para atribuir mais eficácia na prevenção e no combate aos incêndios, Paulo Lucas diz que, “para além de um controle muito incisivo sobre as ignições, há um conjunto de medidas que são conhecidas e aceites, mas que precisam de ser concretizadas”.
Uma delas é a “gestão colaborativa da floresta”, a qual pode ser melhorada “principalmente em áreas de minifúndio”. O representante da ZERO acredita que, através “da remuneração de pequenos proprietários”, podem ser criado “mecanismos nos quais o investimento privado pode ter um papel relevante”.
Essencial é, também, um maior investimento na plantação de espécies vegetais autóctones, como o “carvalho e outras espécies”, refere Paulo Lucas. A esta medida está associada uma “operacionalização urgente de mecanismos de pagamento” para respeitar os serviços do ecossistema”. Importa, aqui, que os benefícios que as florestas provêm sejam respeitados e tratados, de forma a evitar que os ambientes fiquem mais suscetíveis ao desencadeamento ou proliferação de incêndios.
Por fim, o dirigente da ZERO sugere o recurso “a algo que pode parecer paradoxal, mas que pode ser relevante”. A utilização de mais fogo controlado, para impedir o desenvolvimento de episódios descontrolados e mais severos no futuro, é uma medida que permite “criar descontinuidade de combustível na paisagem” com “baixos custos”.
Por: Redação da Ambiente Magazine.
Leia mais aqui:
#Incêndios: ocorrências fora da época “normal” não devem ser todas encaradas como um problema