Até à data de 17 de agosto, os incêndios em Portugal já consumiram 92 mil hectares, 52% dos quais de florestas. Particularmente preocupante é também o facto de ter já ardido uma grande extensão de “Áreas Protegidas”, com destaque para o Parque Natural da Serra da Estrela e as áreas consumidas no Parque Nacional da Peneda-Gerês. Este balanço é feito por Eduardo Santos, coordenador de Florestas da ANP|WWF, e confirma-se que, o ano 2022, está a revelar-se “muito grave” ao nível da área ardida em Portugal.
Em declarações à Ambiente Magazine, o responsável considera que as condições climatéricas deste ano, particularmente seco e quente, estão certamente a contribuir para a ocorrência de grandes incêndios e para uma área ardida total muito elevada: “Este cenário está a sentir-se não apenas em Portugal, mas também em outros países do sul da Europa, como Espanha e França”. No entanto, o “ordenamento florestal português”, em particular do “Centro e Norte”, deixa o território, particularmente, vulnerável à ocorrência de “incêndios rurais”, incluindo de “grandes dimensões”, que acabam por “assolar o país sempre que se conjugam condições de temperatura elevada, humidade atmosférica baixa e vento forte”, refere. Nesta ótica, o coordenador de Florestas da ANP|WWF aponta diversos aspetos que continuam bastante “aquém” do necessário, como por exemplo: “conhecer, ordenar e limitar o uso de eucalipto não gerido”; “ordenar e repensar a paisagem também ao nível da pastorícia, que pode reduzir a carga combustível na floresta”; “reorganizar as populações dispersas acautelando a função económica de cada território”; “integrar as funções de produção e conservação nos ecossistemas florestais”; e “avançar com maior escala na certificação florestal, processo através do qual proprietários e gestores florestais se comprometem com práticas de gestão respeitadoras de critérios socio-económicos e ambientais”.
Apesar das respostas que têm sido dadas para minimizar este flagelo, Eduardo Santos considera que falta consumar o Programa de Transformação da Paisagem: “Falta conseguir colocar em prática a tão necessária mudança da paisagem florestal/rural de vastas áreas do território português, promover a gestão e valorização da nossa floresta (integrando as funções de produção e conservação nos ecossistemas florestais), e assegurar o seu adequado reordenamento, que conduza à recuperação do mosaico e multifuncionalidade da paisagem, essenciais para a aumentar a resiliência aos incêndios e às alterações climáticas”. Para tal, será necessário “reforçar e assegurar o financiamento a médio-longo prazo do Programa de Transformação da Paisagem”, nomeadamente através da “reformulação do PEPAC (Plano Estratégico para a Política Agrícola Comum)”, mas também “aplicando a muito maior escala a remuneração por serviços de ecossistema (ou seja, o pagamento a produtores e proprietários pelos serviços ambientais que prestam)”, defende.
Relativamente à organização da floresta portuguesa, o coordenador da ANP WWF não tem dúvidas de que a paisagem rural e ordenamento florestal em Portugal estão na origem da “vulnerabilidade do território aos incêndios florestais”, mais ainda num “contexto de alterações climáticas”, que irão expor a “eventos extremos cada vez mais severos e prolongados”. Desta forma, “mm melhor conhecimento do território e de quem tem a propriedade e/ou gestão de cada parcela é uma importante ferramenta para proceder ao reordenamento que urge fazer”, defende o responsável, alertando, contudo, que “apenas será útil se os restantes passos forem efetivamente dados na direção certa”.
Embora, seja importante alertar para os fenómenos decorrentes das alterações climáticas, com o aumento da frequência de eventos extremos como secas graves e incêndios severos que implicam medidas de adaptação e mitigação, a ANP|WWF não deixa de acentuar a urgência em “enfrentar e dar resposta ao problema do despovoamento dos espaços rurais e à necessidade de soluções inovadoras que conduzam à sustentabilidade ambiental e viabilidade económica destas áreas”.