Hortas Urbanas: Uma aposta tornar as cidades portuguesas mais verdes
A promoção de espaços verdes são cada vez mais uma realidade nos territórios portugueses. A preocupação em garantir o bem-estar dos cidadãos nos seus espaços é uma prioridade para quem lidera e uma vontade maior para quem usufrui. Neste trabalho, centramo-nos nas hortas urbanas como aliadas na promoção de espaços verdes, além terem outras vantagens como a criação de um ecossistema saudável ou o combate à solidão.
Enquanto espaços verdes, as hortas urbanas devem ser integradas em modelos de desenvolvimento das cidades. Quem o defende é Joana Baptista, vereadora do Ambiente na Câmara Municipal de Oeiras, destacando os múltiplos benefícios: “Possibilitam uma zona de lazer e recreio, momentos de descontração e de realização de atividades ao ar livre e bem-estar, alem de descongestionar o ambiente da cidade, obter alimentos saudáveis, potenciar a biodiversidade e a estrutura ecológica do concelho”. Em 2012, o município iniciou o Programa Hortas Urbanas: “Estes espaços de lazer têm um enorme potencial sociocultural, permitindo um incremento da qualidade de vida dos seus utilizadores”. Atualmente, o Parque Hortícola é constituído por quatro hortas urbanas, disponibilizando 178 talhões com áreas que variam entre os 23 m2 e os 100 m2, totalizando uma área de cultivo de 6.680 m2.
Já há muito que as hortas comunitárias são a solução para problemas sérios das sociedades modernas: “As cidades estão cada vez maiores e mais densas e torna-se necessário repensar o modelo de abastecimento de alimentos, hábitos de consumo dos seus habitantes e aos espaços públicos e exteriores que estes, agora mais do que nunca, querem ocupar e usufruir”, afirma Leonor Babo, CBO Brand & Communication da Noocity. Esta startup promove a agricultura biológica em espaços urbanos e considera que, em cenários de crise climática, os centros urbanos têm de agir rapidamente para se tornarem mais resilientes. E algo que a pandemia veio tornar muito claro é que as cidades correm o risco de se tornar “grandes espaços de isolamento social e solidão. As hortas urbanas ajudam a criar laços”, frisa.
À medida em que as cidades crescem com o cidadão urbano a viver num sistema de alta taxa de consumo, o debate sobre a resiliência urbana, o metabolismo e a pegada ecológica é cada vez mais importante, afirma José Manuel Ribeiro, presidente do Conselho de Administração da Lipor. Com base na mudança de paradigma dos modelos de produção e abastecimento alimentar, a Lipor e os Municípios Associados têm procurado promover um estilo de vida mais adequado para o cidadão e comunidades. Em 2003, foi criada uma rede de produção alimentar local que liga agentes da sociedade e diferentes conceitos de horta urbana, “promovendo a conversão de áreas abandonadas e as boas práticas agrícolas”. Nos oito, existem 54 hortas ativas.
Para a Associação Famalicão em Transição, as hortas urbanas são fantásticos “oásis de biodiversidade” por entre as “florestas de betão” das cidades: “Estes espaços são o garante da manutenção de uma vitalidade ecológica (ainda que mínima) nos contextos urbanos, nos quais a existência de um ecossistema saudável para qualquer forma de vida (incluindo os seres humanos) é frequentemente posta em causa ou mesmo inexistente”. Nos últimos 15 anos, as hortas comunitárias tendem a ser espaços onde se pratica unicamente a agricultura em modo biológico. Para além de serem um “espaço de promoção do contacto direto com a natureza”, as hortas urbanas possibilitam a “ligação real a todo o ciclo de produção alimentar”, algo muito importante em contextos citadinos, até porque se cimentou uma “ideia de separação entre a esmagadora maioria das pessoas, a natureza e a proveniência dos alimentos que consomem”.
Em Cascais, as hortas urbanas são uma parte da estratégia Terras de Cascais que tem por objetivo criar um ecossistema agrícola local, biológico, sazonal e de qualidade: “Estamos a promover um sistema de produção agrícola sustentável, nos terrenos do nosso território, sejam públicos ou privados, que proporcione alimentos de alto valor nutritivo e deliciosos, acessíveis a todas as pessoas”, refere Luís Capão, presidente do Conselho de Administração da Cascais Ambiente. Integradas na Terras de Cascais, há “31 hortas comunitárias, duas hortas associativas, três vinhas e dois pomares comunitários. Temos 637 famílias que cultivam o seu pedaço de terra de forma sustentável”, sublinha o responsável, que vê várias vantagens das hortas citadinas: “Um sistema alimentar baseado na produção e consumo locais melhora a paisagem alimentar e a independência do território em relação a fatores externos”, precisa.
Olhando às vantagens ambientais, Maria Gonçalves, colaboradora na EcoCenter, afirma que as hortas urbanas oferecem facilmente alimentos aos consumidores, poupando-se em transporte e refrigeração. Havendo, nas hortas urbanas, plantas que atraem insetos ou pássaros, estas podem ser verdadeiros santuários para a biodiversidade nas cidades. No pilar social, as hortas urbanas promovem a partilha de conhecimento e acabam por aproximar a comunidade, resultando na melhoria da sua saúde mental e numa eficaz medida de combate à solidão. No que toca à saúde, promovem uma “alimentação mais saudável, rica em verduras, com vantagens a longo prazo para a longevidade das famílias”.
[blockquote style=”1″]Cidades portuguesas estão preparadas para adotar a prática?[/blockquote]
A adesão das cidades a práticas de agrícola sustentável é cada vez mais uma realidade: “É objetivo de Oeiras alargar o Parque Hortícola Municipal, dotando de mais espaços passíveis para cultivo e continuar a dinamizar ações de formação na área da agricultura biológica urbana, direcionada aos hortelões, utilizadores das hortas do município, comunidade escolar e população em geral”, assegura Joana Baptista.
Para a responsável da Noocity, é através do envolvimento de todos aqueles que acreditam que a sua cidade deve ser mais verde que as cidades portuguesas se vão preparando para adotar esta prática: “Hoje em dia, existem diversas soluções para que os agentes públicos ou privados possam facilmente contribuir para a transformação da sua cidade, reabilitando espaços exteriores e comuns, trazendo a Natureza para dentro da cidade”, afinca Leonor Babo.
Olhando para a realidade dos Municípios Associados da Lipor, as cidades, com grande pressão urbanística e com maior incidência de edificado em altura, são também as que têm mais procura por espaços para cultivo: “Nos últimos anos, as cidades têm vindo a criar respostas nesta matéria, respondendo à necessidade da sua comunidade”, destaca José Manuel Ribeiro. “É importante ter-se espaços para cultivo, mas que estes também garantam a segurança alimentar, pelo que a qualidade do solo e água são fundamentais”, acrescenta.
Apesar de as hortas urbanas serem já uma realidade, a Associação Famalicão em Transição lamenta que existe um enorme desafio relacionado com a “pressão urbanística” nas cidades, que frequentemente continua a seguir a lógica da “construção desenfreada, sendo muito difícil a preservação de terrenos livres onde a prática das hortas urbanas possa coexistir”.
Para Luís Capão, há cada vez mais municípios a aderirem a esta ideia de proporcionarem um espaço organizado para a prática hortícola: “As hortas servem para concretizar uma ideia de espaço urbano com ocupações completares”. Ainda assim, acarretam custos “que têm de ser considerados”. Mas, no caso de Cascais, “há ainda espaço para crescer, porque os cidadãos acarinham estes projetos”, refere.
Da experiência da EcoCenter, há muito interesse por parte dos habitantes em tornarem-se hortelões, havendo, em muitos casos, listas de espera para atribuição de talhões de terra. Aquilo que é mesmo necessário é o município ter “um pequeno espaço e meia dúzia de fregueses motivados”, remata.
📸 Associação Famalicão em Transição: Hortas Urbanas Parque da Devesa
Este artigo foi incluído na edição 92 da Ambiente Magazine.