O Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato, popularmente conhecido como Barragem do Pisão, remonta a um “projeto original dos anos 40” que, até à data, “não foi alvo de estudo de impacte ambiental, nem de um processo de consulta pública”. Ainda assim, “o Governo afirma convictamente que a barragem vai ser construída, através de um investimento de 120 milhões de euros de fundos europeus, no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência”. O GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente) condena a “falta de transparência” deste processo e “não compreende que se ignore a legislação existente”, lê-se num comunicado.
De acordo com o GEOTA, o projeto da Barragem do Pisão, cuja documentação continua a “não estar disponível para consulta pública”, prevê a “inundação de 724 hectares onde está instalada a aldeia do Pisão”, o que obrigará à “relocalização da sua população”. Como forma de compensação, foram feitas promessas de que a população da região beneficiará com o desenvolvimento das atividades agrícola, agroalimentar e turística, lamenta o GEOTA, no mesmo comunicado.
“As promessas de compensação feitas pelo Governo são uma nuvem de fumo que vão seguir o exemplo do Alqueva, onde, quase duas décadas depois, a população já não tem o dinheiro das indemnizações, continua sem terras, sem emprego e muitos já partiram da região, tal como mostram os Censos de 2021, que revelam uma diminuição de 10% da população do concelho de Portel. É verdadeiramente triste ver que estes investimentos beneficiam grandesexplorações agrícolas, deixando de parte os produtores locais”, declara Catarina Miranda, coordenadora do projeto Rios Livres, do GEOTA.
Segundo o GEOTA, a região do Alentejo e a bacia do Tejo são, atualmente, “alvo de exploração agrícola intensiva” que é responsável pelo “consumo de 75% da água, provocando impactos profundos no solo, na diminuição da qualidade da água e na perda de biodiversidade”. Por isso, ao apostar no regadio e na agricultura em modo intensivo, o Governo português vai “contra estratégias europeias” como o Green Deal, a estratégia Farm to Fork (do Prado ao Prato), a Diretiva Quadro da Água e a Estratégia Europeia para a Biodiversidade, que apelam à preservação dos ecossistemas e à biodiversidade, alertando para a necessidade de desenvolver sistemas agroalimentares sustentáveis, alerta.
“O modelo de desenvolvimento agrícola está longe de assegurar a sustentabilidade dos recursos e a preservação da biodiversidade. Existem alternativas à captação e armazenamento de água e à agricultura intensiva, sendo prioritário repensar os modelos de uso e distribuição, o investimento na agricultura intensiva e as políticas de fixação de pessoas em territórios de baixa densidade. A construção de novas barragens, sem serem corretamente avaliados os seus impactos e todas as alternativas possíveis, é inaceitável”, sublinha Ana Catarina Miranda.
Desta forma, o GEOTA apela à divulgação pública do projeto atual do Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato e à condução de uma Avaliação Ambiental Estratégica a este projeto e a todo o Programa Nacional de Regadios, cumprindo as estratégias europeias. “Só uma vez estudadas todas as alternativas e consequências, pode então tomar-se uma decisão definitiva sobre a Barragem do Pisão”, remata.