Galp: O potencial do hidrogénio verde na transição energética

A Galp está a desenvolver um dos maiores projetos de hidrogénio verde da Europa. Beneficia da energia solar mais competitiva do continente, de uma longa história de inovação e de uma forte cultura de parceria. O potencial do hidrogénio verde na transição energética esteve em destaque na conversa que a Ambiente Magazine teve com Sérgio Machado, diretor-global Business Development Galp.

Porque é que o hidrogénio é tão importante para Galp?

Não há forma de conseguirmos uma transição energética bem-sucedida a tempo de travar as alterações climáticas sem uma utilização em grande escala do Hidrogénio (H2). Nas próximas décadas, teremos de utilizar tudo o que temos na nossa caixa de ferramentas – energias renováveis, captura e armazenamento de carbono, eficiência energética… O H2 não é, em si, uma fonte de energia, mas oferece uma forma de lidar com muitas das lacunas das atuais fontes de energia primária limpa. Também permite conjugar as restantes soluções de forma a que possam alcançar setores e indústrias para as quais a eletrificação não será uma solução praticável dentro do nosso horizonte de visibilidade.

Através do H2 verde, podemos trazer energia renovável para o transporte de longo curso, para a aviação e a navegação; o H2 desempenhará também um papel crescente na climatização dos edifícios; é também uma forma de armazenar eletricidade renovável, através da hidrólise.

E embora outras tecnologias possam também oferecer alternativas competitivas para descarbonizar estes sectores – tais como biocombustíveis ou baterias – há áreas para as quais não existe outra solução, tais como trazer calor industrial a setores como o aço ou o cimento, descarbonizar matérias-primas industriais e produzir amoníaco para fertilizantes.

A Galp é já um dos maiores consumidores ibéricos de H2 industrial, na sua refinaria de Sines e está a desenvolver uma produção de H2 verde em grande escala, alimentada pela melhor exposição solar da Europa.

O que é que Galp tem para oferecer?

Somos uma empresa líder em energia com vasta experiência em projetos de engenharia em muito grande escala – gerimos um dos maiores complexos industriais da Península Ibérica – mas também os gigantescos projetos de upstream, que partilhamos com as maiores empresas mundiais de energia. Sabemos o que é preciso para desenvolver com sucesso projetos complexos cujo horizonte temporal se estende por décadas.

Também temos um historial de inovação – operamos a maior rede de carregamento de carros elétricos em Portugal; estamos a aplicar ferramentas de IA à energia solar fotovoltaica descentralizada para autoconsumo, através de uma unidade recentemente criada, a Energia Independente; também lançámos um sistema inovador de gestão integrada de frotas partilhadas através do GoWithFlow, que inclui a gestão da infraestrutura de carregamento – e tudo isto antes mesmo de abrirmos a UP-Upcoming Energies, que é o nosso novíssimo laboratório de inovação.

Sines oferece a melhor localização possível para a produção de H2 verde, beneficiando de uma excelente exposição solar, espaços abertos para a instalação de indústrias, instalações solares, ou infraestruturas, tudo isto junto a um porto marítimo de águas profundas com muita capacidade de expansão.

Como um dos maiores produtores de energia solar fotovoltaica da Península Ibérica, temos também uma presença em larga escala que pode ser fundamental para o desenvolvimento de projetos competitivos de H2 verde.

Então, como vê a contribuição do hidrogénio?

Em termos simples, o desafio da transição energética é fornecer a energia que o mundo exige, e que está a aumentar, de uma forma mais limpa, segura e barata. Para isso temos de agir sobre quatro grandes pilares: mais eficiência; mais energias renováveis; portadores de energia mais limpa; e captura e armazenamento de carbono.

O H2 pode ter um papel inigualável como veículo de transporte de energia limpa. Não será o único, porque a eletrificação está aqui para ficar. Mas pode complementar a eletricidade onde a eletrificação é mais desafiante. Em alguns cenários, dentro de 30 anos, o H2 poderá responder por uma parte semelhante do consumo mundial de energia ao que hoje corresponde ao consumo de eletricidade.

Como empresa de energia, precisamos de ser capazes de fornecer a energia de que os nossos clientes precisam da forma mais competitiva e flexível possível, qualquer que seja o seu tipo, forma ou feitio.

Que papel pode desempenhar o hidrogénio nessa combinação?

Para começar, permite-nos integrar os nossos ativos renováveis com as outras unidades de negócio. Funciona como um elo entre sectores, entre cadeias de valor energético e mesmo entre regiões. Funciona para o armazenamento a curto prazo, o que é importante para equilibrar o sistema energético, mas também nos pode ajudar a aplanar a curva de sazonalidade, porque podemos acumular reservas verdes de H2 no Verão, quando a luz solar é mais abundante, para o utilizar no Inverno.

Se queremos realmente ajudar a descarbonizar a economia e os negócios dos nossos clientes, então precisamos do H2… a eletricidade não é uma solução para todos. Não o é para o transporte pesado e de longo curso, certamente não o é para a aviação e o transporte marítimo. Na indústria, temos calor de alto calibre, e temos o H2 como matéria-prima que precisa de ser descarbonizada. E temos os edifícios. E para tudo isto, o H2 é incrivelmente flexível.

E estes são apenas alguns dos casos já conhecidos em que o H2 é claramente a solução mais promissora. Se acrescentarmos a este quadro a produção descentralizada de H2 verde, produzido localmente com eletrolisadores de menor escala alimentados por painéis solares, estamos a abrir toda uma nova fronteira de soluções limpas para as quais – uma vez que a curva de custos desce – o único limite é a nossa imaginação.

Estamos a olhar para todas estas novas áreas porque as oportunidades disruptivas são infinitas e acreditamos que podemos desempenhar um papel importante, como empresa de energia integrada, ao trazer estas soluções para o mercado a uma larga escala.

Quais são, na sua opinião, os principais obstáculos ao sucesso do hidrogénio?

Acreditamos firmemente que a tecnologia – combinada com escala e massificação – contribuirá para tornar a curva de redução de custos do H2 mais acentuada. Mas precisamos que estejam reunidas todas as condições necessárias, incluindo uma regulamentação que fomente a procura, garantias de origem, isenção de tarifas da rede elétrica, ou taxas de carbono, só para mencionar algumas.

Do nosso lado, precisamos de assegurar que os projetos que concebemos tenham acesso ao custo de eletricidade mais baixo possível, em grande escala, a fatores de carga elevados, e sem sobre investimento na infraestrutura inicial.

Temos certamente melhores condições de partida em Portugal do que em qualquer outro lugar da Europa para fazer tudo isto acontecer, só precisamos de agarrar a oportunidade.

Tem havido ondas anteriores de excitação sobre o hidrogénio que nunca se materializaram. O que o faz acreditar que desta vez as coisas vão ser diferentes?

Estamos a assistir a muitas tendências convergentes que são fundamentais para que isto aconteça e que não existiam antes:

  • Temos uma necessidade urgente de agir sobre as alterações climáticas, e temos um amplo consenso entre governos, empresas, e as pessoas em geral. Todos estão empenhados e conscientes dos custos, tanto da mudança, como da continuação do modelo atual de business as usual.
  • Temos eletricidade barata devido à queda dramática no custo dos painéis solares e turbinas eólicas, e isso, combinado com a queda nos custos da hidrólise – que diminuiu 60% nos últimos 10 anos e espera-se que diminua outros 50% na próxima década – permite-nos antecipar que o H2 verde poderá em breve estar a competir frente a frente em termos de custos com o H2 cinzento e castanho.
  • Com país após país a pôr em prática as suas próprias estratégias nacionais de H2 – e com um forte apoio político e financeiro da União Europeia, mas também de outras partes do mundo – estamos perante um impulso estratégico demasiado forte para ser descarrilado.
  • Esse empurrão é também replicado a nível empresarial, não apenas na indústria energética, mas em todos os sectores imagináveis que simplesmente não querem ser deixados para trás.

As estrelas estão alinhadas para o H2 e a Galp está na rampa de lançamento, pronta para partir.

*Este artigo foi publicado na edição 87 da Ambiente Magazine.